Unificação das Linhas Leste e Oeste do Metrofor prevê ligação entre Caucaia e Centro de Eventos

Conexão pode criar maior linha de metrô do Norte-Nordeste do Brasil, com 32 km de extensão

Escrito por
Luciano Rodrigues luciano.rodrigues@svm.com.br
Foto que contém passageiros entrando em linha de metrô em Fortaleza
Legenda: Unificação das linhas Oeste e Leste do Metrofor poderia aumentar em quase quatro vezes o número de beneficiados pelo sistema
Foto: Thiago Gadelha

Ir do Centro de Caucaia, na Região Metropolitana, até o Centro de Eventos do Ceará (CEC), passando pelo Centro de Fortaleza, Aldeota e Papicu pode se tornar uma realidade para os moradores das duas maiores cidades do Estado. Um estudo prevê que as Linhas Oeste e Leste do Metrô de Fortaleza sejam conectadas, transformando-se em uma só, chamada de ramal Oeste-Leste.

Caso isso se concretize, seria criado um ramal metroferroviário de 32 quilômetros (km) de extensão, virando a maior linha de metrô do Norte-Nordeste do Brasil. Para efeitos comparativos, a Linha Sul tem 24,1 km entre o Centro de Fortaleza e a Vila das Flores, em Pacatuba.

As informações constam no Relatório de Redes Estruturais Planejadas da Região Metropolitana de Fortaleza (RMF). Esse levantamento é parte do "Estudo Nacional de Mobilidade Urbana: Desenvolvimento do Transporte Público de Média e Alta Capacidades nas principais Regiões Metropolitanas do país" (ENMU).

O estudo foi conduzido pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e o Ministério das Cidades. Na divulgação do primeiro relatório, ocorrida em maio de 2024, consta uma série de melhorias a serem feitas na mobilidade urbana na rede administrada pela Companhia Cearense de Transportes Metropolitanos (Metrofor). 

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Uma das principais mudanças engloba as Linhas Leste e Oeste. Enquanto a primeira ainda está em construção e só deve ficar pronta em 2028, a segunda é chamada de 'trem de subúrbio' pelo estudo, atuando como Veículo Leve Sobre Trilhos (VLT) entre o Centro de Fortaleza e o Centro de Caucaia, em pleno funcionamento no sistema metroferroviário da RMF.

Além disso, as outras duas linhas em operação na Grande Fortaleza entraram na análise do estudo: a Nordeste (VLT Parangaba-Mucuripe) e a Sul. Em ambas, foram sugeridas melhorias de infraestrutura, e assim como a Oeste e a Leste, não existe prazo para implementação, nem detalhes se de fato os projetos devem sair do papel.

Vale lembrar que, para a realização do estudo, não foram considerados os ramais Expedicionários-Aeroporto e Aeroporto-Castelão, ambos em construção. O primeiro deverá ser entregue entre o fim deste ano e o começo de 2026, enquanto o outro deve ficar pronto no segundo semestre de 2027.

Estudo sugere que Linha Oeste vire metrô

Na configuração atual, a Linha Oeste tem o percurso feito por superfície. São 10 estações em um trajeto de cerca de 20 quilômetros (km) que vai do Centro da Capital até o Centro de Caucaia, entrecortando, principalmente, regiões periféricas de ambos os municípios. 

Ela é em formato de VLT substituindo o antigo trem de passageiros que interligava as duas cidades. No estudo conduzido pelo BNDES, a intenção é adaptar a linha para metrô, mas não há o detalhamento se o ramal será mantido em superfície, como acontece com a maior parte da Linha Sul, nem se será subterrânea, como quase toda a Linha Leste.

"A linha opera com veículos leves a diesel, com 2 unidades e capacidade para transportar até 766 passageiros por viagem", considera o estudo, acrescentando que, apesar de o ramal ter uma passagem mais barata do que os demais, tem baixa demanda de passageiros. 

A Secretaria de Infraestrutura do Ceará (Seinfra), em resposta aos questionamentos da reportagem, explica que, no presente momento, não há "nenhuma previsão para alterar o funcionamento da Linha Oeste de VLT para metrô", como sugere o estudo.

Apesar disso, a pasta destaca que "a eletrificação da linha é avaliada para o futuro, em especial para quando a Linha Leste do Metrô de Fortaleza entrar em operação".

Foto que contém segurança em uma das portas da linha Oeste do Metrofor
Legenda: Linha Oeste do Metrofor é a mais antiga em operação no Ceará
Foto: Alex Costa/Arquivo DN

Na prática, significa que uma eventual eletrificação, isto é, conversão de VLT a diesel para metrô, da Linha Oeste do Metrofor deve ocorrer apenas a partir de 2029. Isso porque o prazo de conclusão atual da Linha Leste é dezembro de 2028, após aditivo firmado em março deste ano entre a Seinfra e o Consórcio FTS, responsável pela obra. Em valores atualizados, a construção da primeira fase deste ramal está fixada em R$ 2,68 bilhões

imagem mostra mapa de todas as linhas de metrô em fortaleza
Legenda: Linhas do Metrofor
Foto: Divulgação/Governo do Estado

Linhas Oeste e Leste serão conectadas em estação de superfície

Ainda conforme a Seinfra, o sistema do Metrofor pouco a pouco começa a se interligar. No caso da Linha Leste, ela será a única interligada com todos os ramais existentes e os que futuramente serão entregues.

Na estação Tirol-Moura Brasil - a única em superfície da linha Leste - haverá a integração com a Linha Oeste. Segundo a Seinfra, esse ponto de parada "será construído ao fim das escavações dos túneis, próximo à fábrica de aduelas (anéis estruturais que revestem e dão estabilidade aos túneis do metrô), ao lado da estação Chico da Silva".

Já a interligação com a Linha Sul será na estação Chico da Silva, a primeira subterrânea do ramal Leste e que, neste trecho, receberá o nome de Chico da Silva Leste

A última estação da fase 1 da Linha Leste, a Papicu, será interligada com a Linha Nordeste. Vale lembrar que, a partir desse ramal, na estação Expedicionários, partirá o futuro ramal em direção à Arena Castelão

No último relatório de demanda divulgado pelo Metrofor, em 2023, a Linha Sul era a maior do sistema. A Nordeste se consolidou de forma isolada na segunda posição, enquanto a Oeste foi a única, incluindo as três linhas do interior (duas em Sobral e uma no Cariri) a perder passageiros na comparação com 2022.

Pedido de conexão das linhas Oeste e Leste partiu dos entes locais, diz BNDES

A análise do estudo é complexa e depende de uma série de fatores e eixos estruturantes, principalmente os que se correlacionam com as integrações física dos modais de transporte coletivo (ônibus e metrô, principalmente) e tarifária.

"Olhamos para a RMF e entendemos quais são os principais eixos de movimentação de pessoas. Outro elemento é entender qual é a rede existente para a gente entender quais são as lacunas, onde está a demanda, onde está sendo atendida, se é compatível com o modal que está servindo", explica Luciene Machado, superintendente da área de soluções para as Cidades do BNDES.

Segundo ela, foi feito um mapeamento do que seriam esses sistemas adicionais a serem implantados.  

"Se a conexão entre as Linhas Oeste e Leste do metrô está colocada, é porque provavelmente alguém trouxe isso para gente como um elemento de vontade que essa conexão acontecesse, e que seria um passo para atender à demanda mapeada", afirma.

Somente a Linha Leste impactará, na rede base, mais de 116 mil pessoas, como diz o estudo: "Na rede planejada, com a extensão da Linha Leste até a Estação CEC, com a reformulação da Linha Oeste e com a unificação das duas linhas, esta população passará para 562,6 mil pessoas", 385% maior no comparativo com a atualidade.

O objetivo, ainda de acordo com Luciene, é enxergar as linhas do metrô como um transporte de alta capacidade, isto é, uma artéria estruturante do deslocamento de passageiros tanto na Capital quanto nos municípios da RMF.

Foto que contém vagão lotado em linha do Metrofor
Legenda: Horários de pico denunciam infraestrutura ainda deficitária nas linhas do Metrofor
Foto: Thiago Gadelha

Isso inclui criar uma infraestrutura capaz de fazer grandes deslocamentos de massa, uma vez que uma composição metroferroviária pode levar inúmeras vezes mais passageiros do que um ônibus - que deve passar a ser usado também como alimentador dos ramais de metrô.

As duas linhas de metrô de Fortaleza precisam ser redimensionadas e ampliadas. Isso presume uma demanda de alta capacidade. Temos que pensar no resto do sistema como quem fornece a demanda. A gente precisa usá-lo, e isso só vai ser possível se a gente tiver investimentos adequados. Vamos precisar fazer toda uma outra lógica do sistema urbano e da RMF da ocupação dessas linhas.
Luciene Machado
Superintendente da área de soluções para as Cidades do BNDES

Na lógica do estudo, Luciene condiciona que as duas linhas precisam ser consideradas de forma unificada, sobretudo considerando que os investimentos em ramais ferroviários são de altíssimo custo. Isso também ajudaria a reduzir o tempo entre uma composição e outra, diminuindo o período de espera nas estações.

Integração tarifária é desafio imponente

Das três linhas do Metrofor que operam em Fortaleza, somente a Nordeste não tem cobrança de passagem, por funcionar ainda em "operação assistida". Os passageiros da linha Oeste pagam R$ 1 (inteira) e R$ 0,50 (meia), enquanto os da linha Sul desembolsam R$ 3,60 (inteira) e R$ 1,80 (meia).

Na Capital, funciona desde 2013 o Bilhete Único, que permite que os usuários peguem diversos ônibus e topiques pagando somente uma passagem. Em esquema similar, funciona o Bilhete Único Metropolitano, que abrange a maioria dos municípios da RMF.

Seja em Fortaleza, Caucaia, Maracanaú ou Pacatuba, por onde os vagões do metrô passam, não existe integração com outros modais (ônibus, topiques e vans) via Bilhete Único ou qualquer outro cartão eletrônico. O que existe, conforme o estudo, é uma integração física - e precária - em pouquíssimas estações.

"Toda vez que se diz ao usuário que foi construída uma linha de metrô, mas que a pessoa tem que caminhar mais de um quilômetro para chegar à estação, provavelmente o usuário vai tentar dar outro jeito. Quando a gente fala em alimentar o transporte de alta capacidade, é promover a integração física e também tarifária. Se tiver muito perto uma coisa da outra, mas paga uma tarifa no ônibus, entra no metrô e tem que pagar outra, não vai caber no bolso no fim do mês", considera Luciene Machado.

Essa questão também é apontada pela professora do departamento de Geografia da Universidade Federal do Ceará (UFC) e coordenadora do núcleo Fortaleza da rede de pesquisa do Observatório das Metrópoles, Clélia Lustosa.

"O projeto é muito interessante, e a preocupação deles que acho a mais séria é a integração tarifária. Se as pessoas tiverem que pagar três transportes, como vão ter recursos?", atenta.

"Esse deslocamento de casa-trabalho foi fundamental para mapear as áreas. Essa linha vai ser a grande integradora tanto em termos de mercado de trabalho quanto em termos de população. Tem vários equipamentos de trabalho e lazer que atrai a classe média dos bairros também", fundamenta a especialista.

Ônibus e infraestrutura viária precisam alimentar metrô em busca de efetividade

No estudo, um dos principais entraves para o efetivo desenvolvimento da malha metroferroviária da Grande Fortaleza é a subutilização dos sistemas. As estações ficam, em geral, em locais de difícil acesso por ônibus, vans e topiques.

Clélia Lustosa destaca o papel primordial dos terminais integrados de ônibus na Capital. Somente três (José de Alencar, Parangaba e Papicu) estão localizados próximos das estações, o que dificulta a locomoção do usuário.

A gente tem que consultar os usuários que sofrem o impacto desse transporte. O deslocamento na cidade depende muito de transporte individual. As empresas de ônibus estão perdendo passageiros por conta de transporte por aplicativo, que às vezes sai mais barato se juntar de três a quatro pessoas do que passar horas esperando e dentro do ônibus. A passagem gratuita, talvez, seja o interesse das próprias empresas de ônibus que estão perdendo os passageiros.
Clélia Lustosa
Professora da UFC e coordenadora do Núcleo Fortaleza do Observatório das Metrópoles
 

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