Julgamento de Bolsonaro no STF: saiba quem é quem entre ministros e réus
O "núcleo 1" da tentativa de golpe de Estado no Brasil será julgado a partir desta terça-feira (2)
O Supremo Tribunal Federal (STF) começa, nesta terça-feira (2), a julgar os primeiros suspeitos de tramar um golpe de Estado no Brasil após as eleições de 2022. O chamado "núcleo 1" da tentativa de golpe é composto pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), o ex-ministro Walter Braga Netto (PL) e outros seis também vinculados ao antigo governo.
Os réus serão julgados pela Primeira Turma do STF, formada pelos ministros Cristiano Zanin (presidente), Cármen Lúcia, Luiz Fux, Alexandre de Moraes e Flávio Dino.
Serão oito sessões, ao todo, distribuídas entre esta terça e o próximo dia 12. A data para início do julgamento foi definida logo após as alegações finais das defesas.
Antes, houve a instrução processual, com oitiva de testemunhas de acusação e defesa, interrogatórios dos réus e realização das diligências requeridas pelas partes e autorizadas pelo relator do processo, o ministro Alexandre de Moraes.
Para prepará-lo para acompanhar o julgamento, o Diário do Nordeste reuniu todos os envolvidos — entre julgados e julgadores — nesta fase e explica quem é cada um.
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Quem são os réus do 'núcleo 1' da trama golpista que serão julgados nesta semana?
Jair Messias Bolsonaro
Ex-presidente da República, Jair Bolsonaro é o principal nome deste grupo. Ele é acusado de liderar a organização criminosa que articulou a tentativa de golpe.
Conforme o inquérito, um dos pontos de partida da trama golpista teria sido uma reunião realizada em julho de 2022, véspera da campanha para as eleições gerais, em que Bolsonaro teria dito aos seus ministros — e a outros comandantes das Forças Armadas — para disseminar ataques ao sistema eleitoral.
Além disso, meses depois, conforme a denúncia apresentada ao STF pela Procuradoria-Geral da República (PGR), o presidente teria tido conhecimento de um plano chamado "Punhal Verde e Amarelo" e editado a versão final de um decreto golpista organizado pelo mesmo grupo.
Em depoimento ao STF, no último mês de junho, Bolsonaro afirmou que discutiu "possibilidades" de reverter o resultado eleitoral que culminou na eleição de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para o terceiro mandato, mas que teria descartado os planos por desrespeitarem a Constituição Federal.
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Alexandre Ramagem
O deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ) foi diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) no governo Bolsonaro. Segundo a PGR, ele teria utilizado a estrutura do órgão para facilitar a trama golpista — comandando uma espécie de "Abin paralela", que monitoraria autoridades públicas e críticos do ex-presidente.
Além disso, Ramagem também teria fornecido a Bolsonaro material para apoiar o ataque às urnas eletrônicas e a intervenção das Forças Armadas.
A defesa do deputado, no entanto, alega que ele não pode ser responsabilizado por cada ato praticado na Abin durante sua gestão, "com base no simples fato de que era o diretor-geral do órgão, salvo se admitisse eventual responsabilização por culpa".
Almir Garnier Santos
Garnier é almirante de esquadra e ex-comandante da Marinha no governo Bolsonaro. Conforme o inquérito da trama golpista, ele teria sido o único comandante das Forças Armadas a concordar com o plano e colocar sua tropa à disposição — isso foi afirmado em delação premiada pelo ex-ajudante de ordens do ex-presidente, Mauro Cid.
A defesa do ex-comandante, contudo, nega que ele tenha colocado as tropas à disposição de Bolsonaro e afirma que isso está apenas no depoimento do tenente-brigadeiro Carlos de Almeida Baptista Junior, da Aeronáutica. "Freire Gomes [ex-comandante do Exército], que estava presente nas reuniões, afirmou apenas que ele [Garnier] teria se colocado 'com o presidente, porém, no sentido de respeito hierárquico", alegaram.
Anderson Torres
Torres foi ministro da Justiça no governo de Bolsonaro e estava como secretário de Segurança Pública do Distrito Federal durante os ataques de 8 de janeiro de 2023. Ele chegou a ser preso preventivamente por supostas omissões intencionais que teriam colaborado com a depredação da Praça dos Três Poderes, em Brasília, àquela época.
Na casa de Torres foi encontrada pela Polícia Federal, ainda, uma minuta que sugeria a decretação de estado de Defesa após a derrota de Bolsonaro nas eleições de 2022.
O ex-ministro também é acusado de por em xeque a confiabilidade do sistema eleitoral em 2021 e de ter participado de reuniões cruciais para a trama golpista.
Augusto Heleno
Heleno foi ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) no governo Bolsonaro. Segundo a PGR, ele e Alexandre Ramagem teriam fornecido "auxílio direto" ao ex-presidente no ataque às urnas eletrônicas e no planejamento do golpe.
Conforme o inquérito, em julho de 2022, pouco antes das eleições, o general falou sobre utilizar a Abin para "acompanhar o que os dois lados estão fazendo" durante a campanha. "O problema todo é se vazar qualquer coisa em relação a isso", pontuou, à época.
As investigações apontam ainda que o ex-ministro ficaria responsável por comandar um gabinete de gestão de crise caso o golpe fosse concretizado. A defesa dele, porém, alega que a PGR extrapolou na interpretação do que seria somente um "apanhado de ideias".
Mauro Cid
Foi ajudante de ordens de Bolsonaro e, como o ex-presidente, é um dos principais nomes deste julgamento. Isso porque ele fez um acordo de delação premiada com os investigadores em troca de uma condenação menor.
Aliás, foi Cid quem, no último mês de junho, confirmou ao STF que Bolsonaro discutiu e revisou minutas de documentos para decretar estado de Defesa no País para impedir a posse do presidente Lula em 2023. No entanto, ele afirmou não saber se o ex-chefe se envolveu na preparação para os ataques de 8 de Janeiro.
Conforme o inquérito, Cid teria buscado pessoas e materiais que pudessem colocar em xeque a confiabilidade das urnas eletrônicas, teria estado no Palácio do Alvorada quando o ex-presidente recebeu o documento "Punhal Verde e Amarelo" e teria fraudado seu registro de vacinação contra a Covid-19.
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Paulo Sérgio Nogueira
O general da reserva foi ministro da Defesa no último ano do governo Bolsonaro. Em julho de 2022, ele, que é cearense, teria instigado "a ideia da intervenção das Forças Armadas no processo eleitoral" e, após as eleições, teria ainda assinado uma nota oficial do ministério em que não descartou a possibilidade de fraude no pleito.
Além disso, Nogueira também teria estado presente nas reuniões sobre a minuta do golpe e teria participado ativamente da elaboração do documento, conforme a PGR.
Walter Braga Netto
O general da reserva foi ministro da Casa Civil e da Defesa durante o governo Bolsonaro. Além disso, foi seu candidato a vice nas eleições de 2022.
Na denúncia apresentada ao STF, a PGR aponta que ele teria participado de reuniões e da produção de documentos que apontariam falhas no sistema eleitoral brasileiro. Ele também teria participado ativamente dos planos golpistas para anular a vitória de Lula.
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Outro destaque de Braga Netto no processo é que, em novembro de 2022, teria ocorrido uma reunião na casa dele em que os militares formados em Forças Especiais, os "kids pretos", teriam discutido o plano "Copa 2022" para "neutralizar" o ministro Alexandre de Moraes.
O ex-ministro teria, ainda, colaborado para financiar manifestações de bolsonaristas acampados em frente a quartéis — o que culminou nos atos de vandalismo de 8 de Janeiro.
Ele foi preso em dezembro do ano passado, por determinação de Moraes e a pedido da PF, que afirmou que ele estaria tentando intervir nas investigações e obter dados sigilosos da delação do tenente-coronel Mauro Cid.
Quem são os ministros da Primeira Turma do STF que julgarão Bolsonaro e aliados?
Cristiano Zanin
Ele é o presidente da Primeira Turma e deve ser o último a votar no julgamento. Zanin está no STF desde agosto de 2023, indicado por Lula, após advogar em defesa do presidente nos processo da Operação Lava Jato.
No entanto, embora tenha sido indicado pelo petista, o ministro tem mostrado posicionamentos contrários a ele, como quando votou contra a descriminalização do porte de maconha para uso pessoal e não reconheceu a equiparação de ofensas à comunidade LGBTQIAP+ com o crime de injúria racial.
Cármen Lúcia
Ela é a ministra mais antiga da Primeira Turma. Foi nomeada em 2006, no primeiro mandato de Lula, e, atualmente, é a única mulher da Corte.
Foi presidente do STF entre 2016 e 2018 e, hoje, preside o Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Luiz Fux
Foi indicado ao STF em 2011, no governo de Dilma Rousseff (PT), e já foi considerado um dos ministros mais punitivistas da Corte, especialmente nos casos do Mensalão e da Lava Jato.
Atualmente, e especialmente no inquérito da trama golpista, tem se posicionado contrário a Alexandre de Moraes e adotado decisões mais moderadas, como quando sugeriu que a competência para julgar os réus seria da primeira instância da Justiça.
Ele também foi o único que não aprovou as medidas cautelares impostas a Bolsonaro, como a prisão domiciliar e o uso da tornozeleira, argumentando que restringiam "desproporcionalmente direitos fundamentais, como a liberdade de ir e vir".
Alexandre de Moraes
Moraes é relator do processo que apura a trama golpista no STF. Ele foi indicado para a vaga de ministro em 2017, por Michel Temer (MDB), e tem se consolidado como um dos principais nomes na Corte em defesa da democracia, o que o torna popular entre progressistas.
O ministro também já foi relator dos inquéritos a respeito das fake news, das milícias digitais e dos atos de 8 de Janeiro. Por causa disso, ele concentrou dezenas de processos que miravam apoiadores do ex-presidente Bolsonaro ou ele próprio.
No ano passado, o magistrado também ganhou holofotes ao determinar multas milionárias e bloqueio de contas relacionadas ao bilionário Elon Musk, dono do X.
Além disso, Moraes se projetou internacionalmente ao ser penalizado pelo presidente norte-americano, Donald Trump, com a Lei Magnitsky, que congelou bens, proibiu viagens e restringiu o acesso do ministro a serviços financeiros e de tecnologia dos Estados Unidos.
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Flávio Dino
Dino se tornou ministro do STF em fevereiro do ano passado, indicado por Lula. Antes, ele comandava o Ministério da Justiça e Segurança Pública.
Enquanto ministro do terceiro mandato do petista, ele se destacou nas respostas aos atos golpistas de 8 de Janeiro. Já como ministro do Supremo, se mostra contrário a pautas progressistas, como legalização do aborto e descriminalização das drogas.
Em relação à trama golpista, ele afirma que é uma "desonra à memória nacional" minimizar uma tentativa de golpe por não ter tido mortos. "No dia 1º de abril de 1964 [data do golpe que iniciou a ditadura militar] também não morreu ninguém. Mas, centenas e milhares morreram depois. Golpe de Estado mata. Não importa se é no dia, no mês seguinte ou alguns anos depois", discursou o ministro em uma ocasião.
Entenda os núcleos da trama golpista
A ação penal (AP 2668) foi aberta após o STF aceitar a denúncia oferecida pela PGR. Com isso, 31 acusados de envolvimento na trama golpista tornaram-se réus.
Eles foram divididos em quatro núcleos:
- Núcleo 1: envolve oito réus, incluindo Bolsonaro, e é considerado o núcleo "central" ou "crucial" da articulação golpista.
- Núcleo 2: conta com seis réus que são acusados de disseminar informações falsas e ataques a instituições democráticas.
- Núcleo 3: é formado por dez réus associados a ataques ao sistema eleitoral e à preparação da ruptura institucional.
- Núcleo 4: sete réus serão julgados por propagação de desinformação e incitação de ataques às instituições.
Quais são os crimes imputados aos réus do 'núcleo 1'?
- Tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito;
- Tentativa de golpe de Estado;
- Participação em organização criminosa armada;
- Dano qualificado;
- Deterioração de patrimônio tombado.
Entenda o caso
Em novembro de 2024, o STF recebeu da Polícia Federal o relatório final sobre a investigação de uma tentativa de golpe de Estado no Brasil. Foram coletadas provas ao longo de dois anos, por meio de quebras de sigilos telemáticos, telefônicos, bancários e fiscais, além de colaboração premiada, buscas e apreensões, entre outras medidas.
Ao todo, 37 pessoas foram apontadas como integrantes do grupo. Os autos foram encaminhados à PGR, e 34 pessoas foram denunciadas em fevereiro deste ano.
Conforme a PGR, Bolsonaro era o chefe da organização criminosa que planejou, inclusive, o assassinato ou a prisão de autoridades, como o presidente Lula e o ministro Alexandre de Moraes. No entanto, o Supremo acatou a denúncia contra apenas 31 dos 34 acusados.