'O Agente Secreto' circula pelo Brasil antes da estreia e da corrida ao Oscar
Sessões especiais do representante brasileiro na disputa pelo Oscar ocorreram em cinco capitais do País e encerram nesta quarta (24) no Cine Ceará
Representante brasileiro na disputa do Oscar de 2026, o premiado longa pernambucano “O Agente Secreto” vem desembarcando em diferentes cidades brasileiras para exibições especiais de pré-estreia da obra, que chega oficialmente aos cinemas em 6 de novembro.
Após ganhar sessões em cidades como Recife, Brasília, São Luís e Manaus, o filme protagonizado por Wagner Moura passou por Belo Horizonte na terça (23), na programação da CineBH, e encerra a primeira parte da “turnê” no circuito de festivais na noite desta quarta (24) em Fortaleza, no Cine Ceará.
Na capital cearense, a sessão irá contar com a presença dos cearenses Geane Albuquerque e Robério Diógenes, que compõem o elenco, além das atrizes Laura Lufesi, Hermila Guedes e Alice Carvalho.
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Expectativa do público e sessões lotadas
Produção mais premiada no Festival de Cannes deste ano — onde recebeu os troféus oficiais de Melhor Direção, para Kleber, e Melhor Ator, para Wagner, além do troféu da crítica de Melhor Filme —, “O Agente Secreto” tem acumulado repercussão e expectativa dos novos públicos por onde passa.
Na apresentação do filme em Belo Horizonte, Leticia Friedrich, diretora da distribuidora Vitrine Filmes, ressaltou a acolhida dos espectadores nessas exibições especiais. “O filme chegou ao Brasil tem 10 dias. São sessões emocionantes, sessões lotadas”, destacou.
“A gente tá muito, muito emocionado com essa acolhida, não só a gente, mas todo mundo que trabalha com cinema e cultura brasileira. Quando vê filas e filas pra prestigiar a nossa arte, aí que vale a pena o que a gente está fazendo”
A profissional agradeceu ao público que chegou horas antes para garantir lugar na sala do Cine Theatro Brasil, na capital mineira, e também citou a procura por ingressos no Cine Ceará, disponibilizados virtualmente no dia 23.
“Queria dar um salve, agradecer, a quem chegou três da tarde, cinco da tarde, pra assistir ao filme. (...) O filme chega no Ceará e em um minuto se esgotaram os ingressos, então, que momento, gente. Viva o nosso cinema!”, celebrou.
A sessão na CineBH teve ainda com a presença de nomes do elenco do longa como Carlos Francisco, ator mineiro homenageado nesta edição do evento, Ítalo Martins e Laura Lufesi.
A distribuição nos cinemas de “O Agente Secreto” conta com patrocínio master da Petrobras, fortalecendo a chegada da aguardada obra às salas de todo o País. A partir de outubro, o filme passará por capitais como Rio de Janeiro e Porto Alegre.
"O Agente Secreto" pulsa Brasil, entre o horror e a festa
O que primeiro surge na tela quando “O Agente Secreto” começa é uma fotografia dos Trapalhões, que abre uma sequência de imagens representativas da cultura brasileira.
Além do célebre grupo de comédia formado por Renato Aragão, Mussum, Zacarias e Dedé Santana, há Chacrinha e Zezé Motta, Clara Nunes, Maria Bethânia e outros nomes que, de partida, apresentam uma espécie de síntese do filme em si.
Isso porque o longa pulsa Brasil. Situada em 1977, durante a ditadura militar do país, a narrativa se concentra, especialmente, no período de Carnaval daquele ano em Pernambuco.
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Ao aproximar o contexto político e social brasileiro com a vocação histórica e resistente do povo em festejar apesar de tudo, a produção se desenvolve entre a tensão e a leveza, o suspense e a graça.
A escolha, ressalte-se, não esvazia a seriedade da abordagem que o longa faz do período ditatorial, mas sim a complexifica, aproximando-a também de uma visão mais cotidiana e popular.
A trama acompanha Marcelo (Wagner Moura), um homem misterioso que conhecemos já na estrada rumo a Recife, fugindo de algo inicialmente não dito e que busca refúgio na capital pernambucana — apesar desse “algo” estar entranhado inclusive lá.
Na premiada atuação, o ator baiano apresenta um personagem, assim como o filme, ambivalente entre a esperança do futuro e o peso do passado.
A partir da primeira vez que o protagonista surge, detalhes do caminho dele até então e dos passos possíveis a partir dali vão, de forma mais ou menos fragmentada e não-linear, sendo dispostos ao espectador.
A construção ajuda a solidificar um contexto, mas o longa joga em outro lugar que não o da didática — o que não faz dele uma obra inacessível, pelo contrário.
“O Agente Secreto” abre, em especial, espaço para uma miríade de situações, contextos e personagens que ajudam a compor o caleidoscópio proposto pela obra.
Ainda que em um elenco numeroso — que inclui nomes como Gabriel Leone, Alice Carvalho, Carlos Francisco, Isabel Zuáa, Hermila Guedes, Ítalo Martins, Udo Kier e Thomás Aquino, entre outros —, cada figura que surge na história tem lugar, destaque e importância inegáveis, seja da participação mais longa à mais pontual.
Do primeiro tipo, há a carismática e afetuosa dona Sebastiana, interpretada pela atriz Tânia Maria, de 78 anos. Artesã do interior do Rio Grande do Norte que estreou nos cinemas com “Bacurau”, ela é destaque em “O Agente Secreto” ao acolher Marcelo e outros “refugiados”.
Do segundo, destaca-se a imponente Elza (Maria Fernanda Cândido), de quem pouco se sabe, mas cuja sequência principal é ponto crucial da narrativa.
Há, também, os cearenses Geane Albuquerque e Robério Diógenes. Ela interpreta Elizângela, funcionária de cargo comissionado responsável por um dos momentos de maior humor do longa ao se “engraçar” com o protagonista.
Já ele é Euclides, um delegado fora da lei que se impõe a partir de pequenos poderes, se envolve em esquemas violentos e cruza o caminho de Marcelo de diferentes formas.
Mesmo que acompanhe e conte uma narrativa maior, envolvendo o passado e o presente do misterioso protagonista, “O Agente Secreto” se forma a partir dos pequenos excertos que valorizam cada presença em cena.
Cada “episódio”, irmanado aos outros pelo absurdo e pelo risível, apresenta aspectos que se somam ao panorama que o filme faz tanto do regime ditatorial quanto da resistência a ele.
Tal caráter mais “fragmentado” se justifica por uma escolha narrativa revelada a determinada altura do filme e que, ao ser evidenciada, traz à forma uma reflexão temática sobre memória, registro e preservação.
Com gosto agridoce, "O Agente Secreto" ecoa no Brasil de hoje pelo que traz, em especial, sobre o tão lembrado "preço" que a história cobra de quem agiu, e ainda age, contra o País e em prol de si.
*O repórter viajou para Belo Horizonte a convite do evento