Cearense de Acaraú, João Fontenele desponta em novela e no cinema
Artista atuou neste ano em obras como o filme "Milagre do Destino" e a novela "Guerreiros do Sol", além de ter dirigido o curta "Peixe Morto"
Quando pequeno, ainda na Acaraú de nascença, João Fontenele achava que “atuar era só um sonho distante”. Mal imaginava, ao assistir novelas na TV ao lado da avó e participar de apresentações culturais no colégio de freiras onde estudou, que iria enveredar, com destaque, pelo caminho que se esboçava ali.
Hoje aos 33 anos, o cearense vem construindo carreira não só como ator, mas também diretor. Neste ano, João participou da novela “Guerreiros do Sol”, produção original da Globoplay, e tem circulado — e sido premiado — com “Peixe Morto”, curta que dirigiu.
Com projetos futuros no audiovisual que incluem a realização de um novo curta, dublagens de duas animações, nova temporada de série e um telefilme, João fala ao Verso sobre os primeiros passos da trajetória, a repercussão dos trabalhos mais recentes e a relação com Acaraú.
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Atuar como possibilidade real
“Sou de uma cidade do interior que não tem teatro e, até pouco tempo atrás, não tinha cinema. Quando o cinema chegou, eu já não morava mais lá”, contextualiza o artista. Apesar disso, foi pela televisão e pelas atividades escolares que identificou “paixão” por atuar.
“Parecia algo impossível de virar profissão. Mas, quando me mudei pra Fortaleza pra estudar, comecei a enxergar as coisas de outra forma”, avança João. A vinda para a capital, que fica a cerca de 238 km de Acaraú, ocorreu quando ele tinha 14 anos.
A motivação foram os estudos do Ensino Médio, mas os conhecimentos adquiridos se alargaram para além da educação formal. Para o curso superior, ele escolheu a Comunicação, mas se dedicava à formação em atuação nas horas livres.
“Tive acesso a mais informações, cursos, pessoas da área... e foi aí que caiu a ficha: atuar podia, sim, ser uma possibilidade real pra mim. Então decidi me dedicar e comecei a me envolver e a buscar oportunidades”
Nesse processo, João passou por cursos de atuação no Cuca Barra e no Porto Iracema das Artes, fez aulas de dança contemporânea no Theatro José de Alencar e se integrou a grupos de artes cênicas, passando a circular por teatros de Fortaleza
Depois, buscou mais experiências na área no Rio de Janeiro, tanto formativas quanto profissionais. O primeiro trabalho no qual foi “pago dignamente para atuar” ocorreu na capital fluminense, no longa “Vende-se Esta Moto”.
Projetos no audiovisual
A virada principal ocorreu, no entanto, no filme “Baião de Dois”, especial da TV Verdes Mares. “Me senti um ator profissional, foi o meu primeiro protagonista. Depois (dele), decidi me dedicar de verdade à carreira. Passei a acreditar que era possível”, avança.
Com base de formação no palco, João destaca o audiovisual como principal foco de atuação hoje. Depois do telefilme, o ator participou de projetos como os longas “Se arrependimento matasse” e “Cabeça de Nêgo”, a série “Meninas do Benfica” e o curta “A Vapor”.
Os aprendizados do teatro, porém, seguem firmes e presentes na lida do artista, bem como projetos nessa arte. “Amo teatro, e ainda hoje faço. Inclusive, atualmente estou montando um monólogo pra estrear em 2026”, adianta.
“Investigar e experimentar as diversas formas de atuar só nos engrandece como artistas. Atuar é um exercício constante. Acredito que o teatro nos dá tônus e coragem pra enfrentar outras linguagens de atuação”
Neste ano, entre os desafios da carreira, estiveram a presença no filme “Milagre do Destino”, também exibido na TV Verdes Mares, e a estreia de “Guerreiros do Sol”, da Globoplay.
Na novela do streaming, que já foi finalizada na plataforma e exibida no canal Globoplay Novelas, ele interpreta o policial corrupto Arigó. Há previsão de exibição na TV aberta em 2026.
“A partir disso, alguns convites para outros trabalhos aqui em Fortaleza começaram a surgir. Fiquei bem empolgado com esse retorno. Acho que ‘Guerreiros’ teve uma boa repercussão e acabou trazendo um certo destaque para os atores que fazem parte da obra”, considera.
Além do monólogo teatral já citado, há outros trabalhos futuros previstos para João, incluindo a realização de um novo curta no ano que vem.
“Também tem algumas obras já gravadas que devem estrear em 2026, como as minhas primeiras vozes originais para longas de animação: ‘Bila Cocão’, de Esaú Pereira, e ‘Metade Calabresa’, de Bruno Braga”, adianta.
O ator acrescenta à lista, ainda, a segunda temporada da série “Caminho de Volta”, de Arthur Leite e Petrus Cariry, e o telefilme “Terra Natal”, que conta com direção de Déo Cardoso, Leão Neto e Wagner Nogueira.
Expansão no audiovisual
Além das experiências em diferentes formatos, outra expansão de área vivida pelo artista se deu no próprio âmbito audiovisual. “Na pandemia comecei a me produzir e realizar os meus próprios projetos. Acho que foi a saída que eu, assim como vários outros artistas, encontrei pra continuar fazendo arte”, relembra.
O primeiro trabalho do artista na direção foi o documentário performático “Barquinho”, lançado em 2022. De lá para cá, ele seguiu assinando diferentes projetos, como “Quentinha” (2023), “Raposa” (2024) e “Olho Vivo” (2024).
“Ser um ator atento e sensível ajuda muito na relação com a direção e o roteiro. Acho que tudo está conectado, e quanto mais a gente se abre pra essas experiências, mais completo a gente se torna na arte”, avalia João.
Não é incomum que, nos curtas, o cearense não apenas dirija, mas também atue, produza e roteirize. É o caso do mais recente trabalho assinado por ele, o premiado “Peixe Morto”.
O filme foi exibido no 35º Cine Ceará, onde ganhou o troféu Canal Brasil de Curtas, e no Festival do Rio, entre outros eventos. Conforme o artista, o “objetivo principal” é sempre mostrar o trabalho de atuação.
“Sinto que conquistei um certo respeito, uma admiração pela luta do ator que também realiza. Outros realizadores passaram a ter mais confiança no meu trabalho, na forma como enxergo o mundo e tento trazer isso pra tela”
"Talento e vontade de sobra, só precisa de mais estrutura"
Outro dado que desponta em alguns dos curtas de João é o lugar de Acaraú nas tramas. Tanto “Raposa”, codirigido com Margot Leitão, quanto “Peixe Morto”, por exemplo, se passam na cidade natal do diretor.
Além dos “cenários lindos” e das camadas e nuances que o município guarda, a escolha tem intenções também simbólicas.
“É uma forma de ressignificar a cidade onde nasci e com a qual já tive uma relação meio controversa. É a cidade onde cresci, onde minha família mora, mas da qual eu precisei sair pra conseguir oportunidades na área em que trabalho”, reflete.
De certa forma, é uma maneira do artista estimular na cidade um cenário que gostaria de ter encontrado quando ainda morava lá.
“Minha tentativa é unir tudo isso: é fazer com que a cidade também possa oferecer chances pra que nós, artistas, possamos realizar nossas obras. Para que o cinema seja uma possibilidade de trabalho”, torce.
Para tanto, João não se furta em destacar a importância — e necessidade — de cada vez mais apoio para a cultura, não só em Acaraú, mas no Ceará como um todo.
“A gente produz muito e com muita qualidade. Talvez seja o momento em que mais estamos produzindo e circulando pelo Brasil e pelo mundo. Ainda assim, vejo que falta investimento. Porque, apesar de estarmos colhendo bons frutos, ainda é difícil alcançar uma estabilidade financeira trabalhando com arte por aqui”, analisa.
“Já provamos que temos capacidade de fazer bem feito. Agora, o que falta é mais investimento, pra que exista uma constância, pra que os intervalos entre uma obra e outra, de cada realizador, sejam menores, mais fluidos. A gente tem talento e vontade de sobra, só precisa de mais estrutura pra continuar e crescer”