‘Saúde sucateada’: que medidas Evandro quer adotar para solucionar crise na rede pública de Fortaleza

Prefeito eleito lista série de planos para a área e reconhece que deve pedir ajuda financeira a Estado e União

Prefeito eleito de Fortaleza, Evandro Leitão
Legenda: Evandro pretende focar em fortalecer atenção primária e buscar apoio para garantir funcionamento pleno do IJF
Foto: Thiago Gadelha

Hospital em colapso, rede de saúde mental sem profissionais, fila de espera para consultas e exames em postos, R$ 500 milhões em dívidas. Os problemas históricos da saúde pública de Fortaleza se agravaram, nos últimos meses, e se impõem como desafio para a próxima gestão municipal, em 2025, liderada pelo prefeito eleito Evandro Leitão (PT).

Em entrevista exclusiva ao Diário do Nordeste, nesta sexta-feira (27), o gestor comentou sobre as estratégias que deve adotar, junto à futura secretária de Saúde, Socorro Martins, para quitar dívidas, captar investimentos e recuperar a rede de serviços que descreve como “em total sucateamento”.

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Assim foi iniciada a conversa com a reportagem, no escritório do petista, no bairro Dionísio Torres, na manhã de sexta-feira. Ao falar sobre o maior hospital municipal de Fortaleza, o Instituto Dr. José Frota (IJF), que vivencia uma crise de falta de insumos e profissionais, o prefeito eleito foi categórico: “nós precisamos fazer uma repactuação dos repasses”.

Evandro pontuou que são necessários, anualmente, R$ 700 milhões para custeio da unidade, dos quais “aproximadamente R$ 600 milhões são do Tesouro Municipal”. “Esse número consome praticamente todo o IPTU arrecadado, fazendo com que esses recursos não possam ser investidos em outras áreas”, estima.

“Então eu já iniciei um processo de diálogo, de tratativa com o Governo Federal, com a ministra da Saúde, Nísia Trindade, e estive com o presidente Lula, para a gente iniciar o ano de 2025 já com algum horizonte para repactuarmos esses valores. A primeira coisa é isso.”

De acordo com ele, a nova gestão receberá o IJF com “cancelamento de procedimentos cirúrgicos, inadimplência com fornecedores, com cooperativas, com profissionais da saúde, e cerca de R$ 100 milhões em dívidas”.

Uma das possíveis causas do caos instalado no IJF nos últimos meses foi identificada pela equipe de transição, de acordo com Evandro: “de 2023 para 2024, se fizermos um comparativo, o IJF reduziu os insumos e materiais em aproximadamente 50%”.

“O porquê eu não posso falar pelos outros, mas é claro que a atual gestão, de alguma forma, como não tem recursos, ou os recursos que tem estão sendo investidos em outras áreas, termina faltando na área da saúde, na atenção terciária de um dos hospitais mais importantes que nós temos”, opina.

Evandro, durante coletiva de imprensa sobre a transição de Fortaleza, ontem, reforçou as críticas sobre a gestão da saúde do prefeito José Sarto (PDT). Disse que apenas 50% do que foi demandado de informações de saúde foi enviado" pela atual gestão e criticou o chefe do executivo por falar em necessidade de repactuação ou estadualização do IJF só às vésperas do fim do mandato.

"O prefeito Sarto passou quatro anos. Por que não pensou nisso (estadualização) lá atrás? Agora no fim da gestão, faltando menos de uma semana, ele fala isso? Nós estamos discutindo com o Ministério da Saúde, já conversei com o Ministro Padilha, com o presidente Lula. Estamos discutindo a ampliação das Equipes de Saúde da Família (ESF)", disse Evandro.

Na quinta-feira (26), durante coletiva do plano operacional do Réveillon, o prefeito Sarto justificou a crise do IJF e defendeu que ele fosse estadualizado ou federalizado. "O IPTU de Fortaleza praticamente todo ele vai para o custeio do IJF. Precisa ter uma repactuação, inclusive defendida por arautos deste atual governo. É que o IJF é o hospital que deve ser estadualizado ou federalizado porque a missão constitucional da cidade, do município de Fortaleza, é atenção básica", disse Sarto.

“Só falta cair o teto”

Pacientes buscam consultas com psiquiatras e psicólogos no Caps
Legenda: Pacientes buscam consultas com psiquiatras e psicólogos no Caps
Foto: Fabiane de Paula

Além do IJF, outro pilar estrutural da rede de saúde de Fortaleza tem sido atravessado pela falta de profissionais, impactando diretamente no atendimento da demanda: os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), que já são em número insuficiente na cidade.

Um dos compromissos de campanha de Evandro Leitão foi aumentar o número de CAPS em Fortaleza – o que ele garantiu que vai concretizar, embora não tenha estabelecido uma meta de quantos equipamentos devem ser construídos.

“Para além da problemática da ausência de profissionais, temos uma rede completamente sucateada, que só falta cair o teto de equipamentos que nós temos, sem a menor condição de trabalho. Eu, inclusive, cheguei a visitar. Existe um sucateamento da saúde pública em Fortaleza”, resume.

“Fortaleza necessita de aproximadamente 65 CAPS, nós temos 27. Então nós iremos ampliar. Na nossa campanha eu não estabeleci metas, o meu compromisso foi ampliação dos CAPS e contratação de novos profissionais”, reforçou.

Outra medida que Evandro deve implementar durante o mandato é a ampliação do horário de funcionamento dos postos de saúde até 21h, o que ele chama de “terceiro turno”. Para isso, ele reconhece, é preciso ampliar a quantidade de trabalhadores, o que deve fazer por meio do aumento das Equipes de Saúde da Família (ESF).

“Fortaleza tem um teto de 1.350 ESF, mas nós temos apenas algo em torno de 470 equipes. Ainda podemos credenciar mais de 800”, contabiliza. “Na saúde bucal, ainda temos uma margem para credenciamento de mais de 200 equipes. É o meu foco, além de fazer uma recuperação em todos os equipamentos de saúde existentes em Fortaleza”, frisa.

Com esse fortalecimento da atenção básica, o gestor espera “fazer um trabalho de prevenção”, que “terá um forte reflexo tanto nas UPAs, como também nas policlínicas e nos demais hospitais da cidade”.

“Crises todos passamos”

Prefeito eleito de Fortaleza, Evandro Leitão
Foto: Thiago Gadelha

Diante de todas essas metas para uma área tão estratégica e complexa da gestão da capital, Evandro foi questionado sobre a escolha de Socorro Martins como titular da Secretaria Municipal de Saúde (SMS) – que já ocupou o cargo no mandato de Roberto Cláudio e também vivenciou uma crise no IJF.

“A maioria das pessoas da área da saúde parabenizou pela escolha, por se tratar de uma grande profissional. Crises todos nós passamos. Qual foi o profissional que não passou por uma crise de saúde, na educação, uma crise hídrica? Quem é gestor sabe que faz parte do dia a dia”, ponderou.

O futuro chefe do executivo de Fortaleza reforçou, porém, que é dever do gestor “minimizar, reduzir essas crises”. “A saúde de Fortaleza está um caos. No posto de saúde falta até o band-aid que você coloca depois de se vacinar. Imagino que em toda a história de Fortaleza a saúde não passou por um caos e problema tão sério como o que estamos tendo agora. Mas vamos enfrentar e superar.”

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