Conheça Assunção Gonçalves, Mestra da Cultura que conviveu com Padre Cícero e marcou a história de Juazeiro do Norte

Disponível gratuitamente no YouTube, produção destaca como Assunção influenciou diferentes gerações e de que forma a casa dela resguarda vasto acervo sobre Padre Cícero

Escrito por
Diego Barbosa diego.barbosa@svm.com.br
Da janela aos corredores, passando pela sala cravejada de retratos, é possível acessar as particularidades da Mestra no documentário por meio da casa dela
Legenda: Da janela aos corredores, passando pela sala cravejada de retratos, é possível acessar as particularidades da Mestra no documentário por meio da casa dela
Foto: Divulgação

Se Assunção Gonçalves não existisse, Juazeiro do Norte a teria criado. A artista, professora e Mestra da Cultura marcou a história do município do Cariri cearense por, entre outros feitos, ter convivido de perto com Padre Cícero, influenciar gerações a preservar o legado artístico e cultural da região e, sobretudo, imprimir leveza e doçura ao cotidiano.

Fragmentos dessa personalidade tão carismática e de grande importância para o Ceará são apresentados em “Assunção: A arte de ser amada”. O documentário de pouco mais de 27 minutos está disponível no YouTube e foi lançado no último dia 20 de fevereiro na Cantina Zé Ferreira, bar, museu e cinema localizado em Juazeiro do Norte. 

Veja também

A produção é uma realização do perfil Memórias de Juazeiro – dedicado a registrar cultura, edificações e lugares do município – e tem direção de Hévila Ribeiro e Zizome Gouveia. Com delicadeza e cuidado, os dois pegam o público pela mão e convidam a adentrar a casa de Mestra Assunção, conhecida pelos íntimos como Nêga. O lar é um tesouro de lembranças.

Da janela aos corredores, passando pela sala cravejada de retratos, é possível acessar as particularidades da Mestra e saber o porquê de ela ter sido tão querida. “O amor de Assunção Gonçalves se manifestava de diversas formas: na dedicação à arte, na paixão pela educação e na maneira como preservava e compartilhava a história de Juazeiro do Norte”, conta Hévila Ribeiro, 28, também arquiteta, pesquisadora e produtora cultural. 

Segundo ela, contar histórias como a da Mestra é fundamental porque elas revelam como a memória e a identidade de uma cidade são construídas não apenas pelos grandes feitos, mas pelos gestos cotidianos. “Assunção, com sensibilidade e compromisso, registrou por meio da oralidade, da escrita e da pintura aspectos essenciais da história de Juazeiro, ajudando a formar um imaginário coletivo que ainda ressoa na cidade”.

Convivência e devoção a Padre Cícero

Quanto à relação da Mestra com Padre Cícero, Hévila destaca ser apenas um episódio dentro da vasta trajetória da caririense – dona de outras dimensões igualmente relevantes. Embora a convivência com o patriarca de Juazeiro tenha influenciado parte da obra de Assunção, o legado dela vai muito além dessa ligação. 

“A produção pictórica, a dedicação à educação e o compromisso com a preservação do patrimônio cultural fazem dela uma figura essencial para o Cariri”. Ainda assim, é de encher os olhos os registros do documentário nos quais é possível ver Assunção participando da construção da estátua de Padre Cícero ou pintando quadros em homenagem ao Padim. 

Assunção entre duas amigas acompanhando a construção da estátua de Padre Cícero
Legenda: Assunção entre duas amigas acompanhando a construção da estátua de Padre Cícero
Foto: Divulgação

As obras artísticas, por sinal, ocupam toda a casa dela – sendo o lar um dos motivos para a produção do documentário. A ideia para o filme surgiu com o objetivo de sublinhar a necessidade de preservação das casas históricas que ainda resistem ao processo de transformação do centro de Juazeiro e de fortalecer o patrimônio cultural da cidade.

A residência de Assunção Gonçalves se destacou como espaço de relevância não apenas pela arquitetura preservada, mas pelo papel fundamental que a artista desempenhou na salvaguarda da memória juazeirense.  “O documentário busca não apenas homenageá-la, mas ampliar o acesso ao legado dela, reforçando a importância da memória coletiva e da preservação do patrimônio cultural do Cariri”.

Sobrinha de Assunção, Francisca Gonçalves é uma das entrevistadas do documentário
Legenda: Sobrinha de Assunção, Francisca Gonçalves é uma das entrevistadas do documentário
Foto: Divulgação

Depoimentos de familiares, amigos e admiradores, além de vídeos de arquivo com entrevistas feitas com a própria Mestra, ajudam a fortalecer a película. Em cada fala, é nítido como a presença de tão doce e altiva personalidade fazia diferença nos dias e segue como inspiração para que nunca se deixe de apostar na beleza e no entusiasmo diante do mundo.

Conservar a casa

Há um ponto crítico, porém. A urgência da manutenção da casa de Assunção Gonçalves continua uma preocupação entre aqueles que reconhecem a importância da edificação para a história e a cultura de Juazeiro do Norte. “Afinal, mais do que uma residência, o imóvel é um repositório vivo de documentos, obras de arte e lembranças de uma mulher que dedicou a própria vida à preservação do patrimônio local”, diz Hévila.

A resposta das autoridades públicas a essa demanda tem sido tímida. Até o momento, não há um projeto concreto para transformar a casa em um espaço institucionalizado de memória. 

Amigos, familiares e admiradores reivindicam que casa de Mestra Assunção se transforme em memorial
Legenda: Amigos, familiares e admiradores reivindicam que casa de Mestra Assunção se transforme em memorial
Foto: Divulgação

“A criação de um memorial não apenas contribuiria para a preservação de uma das residências mais antigas do centro da cidade – testemunha da história e da arquitetura local –  mas garantiria o acesso da população ao legado de Assunção Gonçalves. O documentário reforça essa necessidade, trazendo à tona o debate sobre o futuro da residência e a urgência de políticas públicas voltadas para a preservação do patrimônio cultural do município”.

Os próximos passos do documentário, espera-se, podem reverter esse panorama. Embora gratuito no YouTube, o filme segue para novas exibições em eventos culturais e festivais. A ideia é ampliar o alcance do projeto e incentivar o debate sobre a preservação do patrimônio.

Legenda: Parede de fotografias e pinturas na casa de Mestra Assunção, com um autorretrato ao centro: arte e memória juntas
Foto: Divulgação

Um detalhe curioso é que a movimentação em torno do nome de Assunção Gonçalves acontece no exato momento em que a Secretaria da Cultura do Ceará (Secult-CE) elege os novos Mestres e Mestras selecionados pelo Edital dos Tesouros Vivos da Cultura 2024

Doze pessoas naturais, dois grupos e uma coletividade serão titulados para preservar a memória cultural e garantir a transmissão de seus saberes e fazeres artísticos e culturais. Os representantes são de Aracati, Baturité, Aquiraz, Crato, Fortaleza, Camocim, Assaré, Nova Olinda, Quixadá, Juazeiro do Norte, Missão Velha, Itatira e Canindé.


Serviço
Documentário “Assunção: A arte de ser amada”, sobre a Mestra Assunção Gonçalves
Disponível gratuitamente no YouTube por meio deste link

Este conteúdo é útil para você?