Veja votos e argumentos de Luiz Fux na trama golpista
Julgamento já tem dois votos favoráveis à condenação dos réus
A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) chega a momento crucial, nesta quarta-feira (10), do julgamento de Jair Bolsonaro e de outros sete réus do "núcleo crucial" da trama golpista. Primeiro a votar na sessão, o ministro Luiz Fux já declarou que a Primeira Turma não tem competência para julgar a ação penal e defendeu que o caso seja julgado no Plenário. Contudo, votou para absolver o ex-presidente de todo os cinco crimes apontados pela Procuradoria-Geral da República (PGR).
Dessa forma, o placar segue 2x1 pela condenação.
Ao iniciar a manifestação, Fux destacou os princípios do STF e falou sobre o dever de proteção da Constituição. "Não compete ao STF realizar um juízo político, conveniente ou inconveniente, apropriado ou inapropriado. Ao revés, compete a este tribunal afirmar o que é constitucional ou inconstitucional, legal ou ilegal", pontuou.
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Em seguida, o ministro afirmou, durante análise das preliminares (questões processuais anteriores ao mérito), que o julgamento é contra pessoas sem prerrogativa de foro. Por isso, o STF tem "incompetência absoluta" para o julgamento. Luiz Fux elogiou o trabalho do ministro Alexandre de Moraes, relator do caso, e disse que chegar ao seu posicionamento foi um trabalho de "extrema dificuldade".
"Não é um processo simples, e já não seria tão somente pelo número de denunciados e testemunhas, mas nesse caso salta aos olhos a quantidade de material probatório envolvido", indicou.
Sobre a delação premiada do réu Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, Fux se manifestou favorável à validade e disse que vota pela manutenção dos benefícios combinados pela Procuradoria-Geral da República (PGR): "Mas, nesse caso, o réu colaborou com as delações sempre acompanhado de advogado. E as advertências pontuais feitas pelo delator do descumprimento do pacto, isso faz parte do rol de perguntas que se pode fazer ao colaborador. O colaborador acabou se autoincriminando".
Em relação ao réu Alexandre Ramagem, deputado federal e ex-diretor geral da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), o ministro votou pela suspensão da ação penal contra ele.
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Análise dos méritos
Na análise dos méritos, Fux rejeitou que os réus cometeram crime de organização criminosa. "A imputação do crime de organização criminosa exige mais do que a reunião de vários agentes para a prática de delitos, a pluralidade de agentes. A existência de um plano delitivo não tipifica o crime de organização criminosa", defende. Para ele, é preciso o emprego de arma para configurar essa tipificação.
O ministro também afastou todos os outros quatro crimes pelos quais os réus são julgados: tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito; tentativa de golpe de Estado; dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado.
Fux ponderou que os danos ao patrimônio foram com o objetivo de tomada de poder, não a finalidade em destruir os bens públicos, portanto, o dano seria um meio para a conduta criminosa finalística.
Segundo ele, não há evidências de que os réus incitaram ou se omitiram de responsabilidade de impedir os danos patrimoniais no 8 de Janeiro de 2023. Par Fux, na verdade, o réu Anderson Torres, que estava no exterior, agiu para impedir as ações golpistas naquele dia.
'Manifestações políticas não configuram tentativa de golpe', argumenta Fux
Após um intervalo para o almoço, a sessão retornou pouco depois das 14h, com a análise do mérito dos crimes de tentativa de golpe e abolição violenta do Estado Democrático de Direito.
Fux afastou a possibilidade de condenação dos réus por tentativa de golpe e abolição violenta do Estado Democrático de Direito. Segundo o ministro, discursos, entrevistas, manifestações políticas não configuram esses crimes.
"Não configuram crimes eventuais acampamentos, manifestações, faixas e aglomerações que consistem em manifestação política com propósitos sociais, assim entendido o desejo sincero de participar do alto governo democrático, mesmo quando isso inclua a resignação pacífica contra os poderes públicos", disse.
O magistrado comentou episódios da história brasileira onde manifestantes se envolveram em depredação e conflitos com as forças de segurança, e disse que ações individuais não configuram golpe.
'Incompetência absoluta' para o julgamento
Fux disse que a Corte não tem competência para julgar os réus, pois eles não possuem prerrogativa de foro: "Meu voto é no sentido de reafirmar a jurisprudência dessa Corte, e concluo pela incompetência absoluta para o julgamento", disse, analisando a primeira preliminar.
Para o ministro, a ação deveria ser julgada no Plenário do STF. "Ao rebaixar a competência original do plenário para uma das turmas, estaríamos silenciando as vozes de ministros que poderiam esterilizar a formar de pensar sobre os fatos a serem julgados nesta ação penal. A Constituição Federal não se refere às Turmas, ela se refere ao plenário, e seria realmente ideal que tudo fosse julgado pelo plenário do STF com a racionalidade funcional", afirmou.
'Tsunami de dados' dificultou processo, diz Fux
O ministro também acolheu a tese de cerceamento da defesa, quando os advogados dos réus afirmaram que tiveram pouco tempo de análise. "Foi nesse contexto que as defesas alegaram cerceamento de defesa, em razão dessa disponibilidade tardia que apelidei de um 'tsunami de dados'", explicou.
"Por isso, em razão da disponibilização tardia de um tsunami de dados, data dump, sem identificação suficiente e antecedente minimamente razoável para os autos processuais, eu confesso que tive dificuldade para elaborar um voto imenso. Eu acolho a preliminar de violação à garantia constitucional contraditória e da ampla defesa e reconheço a ocorrência de cerceamento e, por consequência, declaro a nulidade do processo desde o recebimento de denúncia", pontuou Fux.
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Fux pede condenação de Mauro Cid por tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito
O magistrado, por fim, decidiu julgar individualmente os réus envolvidos na trama golpista. Segundo ele, o delator Mauro Cid não deve ser condenado por integrar organização criminosa, mas por tentar abolir de maneira violenta o Estado Democrático de Direito.
"O que há de prova nos autos é a confissão do colaborador de que solicitou o monitoramento de um ministro do Supremo", apontou Fux, em referência ao uso de órgãos públicos como a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) para monitorar adversários políticos do governo de Bolsonaro.
O segundo réu analisado por Fux é o ex-comandante da Marinha, Almir Garnier.
'Não há elemento que indique anuência de Garnier no plano golpista', avalia Fux
Ex-comandante da Marinha, Almir Garnier recebeu o voto do ministro Luiz Fux para ser absolvido de todos os cinco crimes pelos quais era acusado na trama golpista. São eles: organização criminosa, abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado.
Fux considerou insuficientes as evidências citadas no processo. "Não há qualquer evidência de que o réu Almir Garnier tenha aderido a uma tal associação criminosa", argumentou o ministro.
"Não há elemento material que indique anuência de Almir Garnier a qualquer plano golpista. Apenas afirmar que as tropas estão à disposição não define um ato concreto", frisou.
Fux vota para absolver Bolsonaro de julgamento da trama golpista
Fux votou para absolver Bolsonaro de todos os crimes, pois "não há provas suficientes" para a condenação. Ele julgou "improcedentes" as acusações contra o ex-presidente.
Em seu discurso de voto sobre a conduta de Jair Bolsonaro na tentativa de golpe, Fux diz que é preciso dividir as acusações em partes. Segundo o ministro, é necessário investigar os três seguintes pontos: Abin Paralela, ações contra o sistema eleitoral e tentativa de golpe de estado.
"O réu Jair Bolsonaro tinha o intuito de buscar a verdade dos fatos sobre o sistema eletrônico de votação", declarou.
Para Fux, não há provas de que Bolsonaro participou do esquema que tentou impedir eleitores de votar nas eleições, quando o ato não foi comprovadamente "praticado dolosamente".
Ao citar os ataques ao sistema eleitoral, Fux afirma que "não se pode configurar tentativa de golpe discursos ou entrevistas" e cita que uma live feita no exterior não poderia "abolir o estado democrático de direito".
Afirmou ainda que houve uma licitação para urna com voto impresso no País. Ele ainda relembrou uma fala que o "prejudicou" no Tribunal Superior Eleitoral (TSE): "Urna é igual uma torradeira elétrica, se tirar da tomada não funciona mais".
Minuta do golpe
Ao citar a minuta de golpe, Fux diz que "é inegável que a minuta precisaria passar por inúmeras providências para que se gerasse uma tentativa com violência e grave ameaça".
"A execução das medidas previstas dependeria de atos preparatórios envolvendo diversas outras autoridades, além do presidente da República, o Estado de Sítio depende de pré-autorização do Congresso, da Constituição Federal, além de para o Senado", argumentou.
Conforme o ministro, as provas apresentadas pela acusação são "insuficientes" para demonstrar que essa minuta chegou a ser apresentada a Jair Bolsonaro ou que seja de autoria do ex-presidente.
Plano Punhal Verde Amarelo
Fux mencionou também a falta de provas que mostrem o envolvimento de Bolsonaro no plano "Punhal Verde Amarelo", que previa o assassinato do presidente Lula, do vice-presidente Geraldo Alckmin e do ministro do STF Alexandre de Moraes.
Voto sobre acusações contra Braga Netto
Ao iniciar o voto sobre as acusações contra o general Walter Braga Netto, o ministro diz que um militar na reserva não é capaz de "abolir violentamente" o Estado democrático de direito, uma vez que "não possui meios ou recursos" para praticar o golpe.
Fux votou por condená-lo por crime de abolição violenta e o absolveu de organização criminosa.
Cearense Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa, é absolvido de todos os crimes
Fux votou para absolver o cearense Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa, por todos os crimes. Para Fux, o réu não pode ser responsabilizado e condenado pelo crime de organização criminosa. Ele julga a denúncia improcedente por "não existir provas suficientes" e que houve "apenas algumas desobediências", não representando crime.
Já sobre as acusações de abolição violenta do Estado democrático de direito e golpe de estado, Fux afirma que a denúncia não comprova o envolvimento de Paulo Sérgio nas ações. Apesar de reprovar o atraso do ex-ministro na entrega do relatório das Forças Armadas sobre as urnas, isso não configura atentado contra a democracia.
Absolvição total de Augusto Heleno
Fux absolveu Augusto Heleno, ex-ministro do GSI conhecido General Heleno, de todos os crimes.
Fux vota para absolver Anderson Torres sob o argumento de que não há 'qualquer prova'
Anderson Torres, ex-ministro da Justiça, também foi absolvido de todos os crimes: tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado, organização criminosa, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado.
Conforme Fux, não há contra o ex-ministro "qualquer prova" de que ele determinou ou planejou a abolição do Estado democrático e direito.
Alexandre Ramagem também é absolvido de todos os crimes
Mais cedo no julgamento, Fux havia votado pela suspensão da ação penal contra Alexandre Ramagem, deputado federal e ex-diretor geral da Agência Brasileira de Inteligência (Abin).
O ministro decidiu que Ramagem também deve ser absolvido de todos os crimes imputados.
Como está o placar do julgamento?
O julgamento está com dois votos a favor e um contra pela condenação do grupo: o relator, ministro Alexandre de Moraes votou nessa terça-feira (9) para condenar os réus, e foi seguido pelo ministro Flávio Dino. Já nesta quarta-feira (10), Fux votou para absolver Bolsonaro e Almir Garnier.
Até o momento, o placar segue 2x1 pela condenação dos réus.
A decisão é tomada por maioria simples - então, se mais um magistrado votar a favor, Bolsonaro e os aliados serão sentenciados.
A ministra Cármen Lúcia irá proferir seu voto na próxima sessão do julgamento, que ocorre nesta quinta (11). Já Cristiano Zanin, presidente da Primeira Turma do STF, vota nesta sexta (12) e tem a palavra final.
A ação penal 2668 trata de denúncia oferecida pela Procuradoria Geral da República (PGR). São acusados 31 réus, divididos em quatro núcleos:
- Núcleo 1: envolve oito réus, incluindo Bolsonaro, e é considerado o núcleo "central" ou "crucial" da articulação golpista.
- Núcleo 2: conta com seis réus que são acusados de disseminar informações falsas e ataques a instituições democráticas.
- Núcleo 3: é formado por dez réus associados a ataques ao sistema eleitoral e à preparação da ruptura institucional.
- Núcleo 4: sete réus serão julgados por propagação de desinformação e incitação de ataques às instituições.
Quem faz parte do 'núcleo 1'?
- Jair Bolsonaro, ex-presidente da República;
- Alexandre Ramagem, ex-diretor da Abin e atual deputado federal;
- Almir Garnier, almirante da reserva e ex-comandante da Marinha;
- Anderson Torres, ex-ministro da Justiça e ex-secretário de Segurança do DF;
- Augusto Heleno, general da reserva e ex-ministro do GSI;
- Mauro Cid, tenente-coronel da reserva e ex-ajudante de ordens da Presidência;
- Paulo Sérgio Nogueira, general da reserva e ex-ministro da Defesa;
- Walter Braga Netto, general da reserva e ex-ministro da Casa Civil, além de candidato a vice-presidente em 2022.
Quais são os crimes julgados?
- Tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito;
- Tentativa de golpe de Estado;
- Participação em organização criminosa armada;
- Dano qualificado;
- Deterioração de patrimônio tombado.
Como votaram Moraes e Dino?
Os votos dos ministros Alexandre de Moraes e Flávio Dino preencheram as sessões dessa terça. Ambos encaminharam a condenação de Bolsonaro e outros sete réus e defenderam a legalidade da delação de Mauro Cid.
O primeiro, como relator do processo, discorreu sobre 13 pontos para embasar suas falas, apontando o ex-presidente como líder da organização criminosa que atentou contra o Estado Democrático de Direito de julho de 2021 até 8 de janeiro de 2023.
A cronologia de fatos delituosos citada pelo ministro incluiu declarações de Bolsonaro e aliados pela "desinformação" sobre o sistema eleitoral, o ato de 7 de Setembro de 2021, reunião com embaixadores e interceptação de eleitores feita pela Polícia Rodoviária Federal (PRF) no dia da eleição de 2022.
O relator ainda citou a reunião dos Kids Pretos, a tentativa de atentado à bomba no Aeroporto de Brasília e os atos violentos no dia da diplomação da chapa eleita, liderada pelo presidente Lula (PT). Ao imputar Bolsonaro como líder da organização criminosa, Moraes também mencionou uma longa lista de declarações do ex-presidente, apontadas pelo relator como ameaças ao Judiciário.
Para Moraes, não há dúvida sobre a incidência dos tipos penais analisados.
"Isso não é conversa de bar, não é alguém no clube conversando com amigo, isso é um presidente da República, no 7 de Setembro, a data da Independência de Brasil, instigando milhares de pessoas contra o Supremo Tribunal Federal, contra o Judiciário e, especificamente, contra um ministro do Supremo Tribunal Federal", disse o relator.
Já Flávio Dino reforçou que debates e pressões realizados além dos autos não afetam a decisão dos magistrados. "Quem veste esta capa tem proteção psicológica suficiente para se manter distante disso, talvez por isso vista a capa", disse. O magistrado pontuou ainda que os crimes julgados no processo são "insuscetíveis de anistia".
Dino defendeu que os réus e seus seguidores agiram efetivamente com violência e grave ameaça, relembrando declarações contra o cumprimento de ordens judiciais, rompimento de barreiras policiais, tentativas de ataque com uso de bombas e ameaça a juízes. "A violência é inerente a toda essa narrativa", disse.
"Os acampamentos não foram em porta de igreja (...) Creio que, se você está com o intuito pacifista, tem uma irresignação, você vai à missa, ao culto, quem sabe até acampa na porta da igreja, mas não, os acampamentos foram na porta dos quartéis", complementou.
Ele apontou, ainda, diferentes níveis de responsabilidade entre os acusados. Segundo ele, o ex-presidente Jair Bolsonaro e o ex-ministro Braga Netto tinham o domínio dos eventos e protagonizaram as ameaças mais contundentes à democracia. Anderson Torres, então ministro da Justiça e Segurança Pública, também foi citado pela reunião ministerial, pela operação da PRF para dificultar o voto e pela minuta do golpe.
Por sua vez, Mauro Cid teria atuado em diversas frentes da trama. O almirante Almir Garnier também foi mencionado por Dino pela aquiescência às iniciativas golpistas.
Em relação ao general Paulo Sérgio Nogueira, acusado de convocar de reuniões e se envolver com a minuta de decreto; Alexandre Ramagem, que comandava a Abin; e o general Augusto Heleno, chefe do GSI, há menores graus de culpabilidade, na análise de Dino. Os atos deles, segundo o ministro, tiveram eficiência causal reduzida — no caso de Ramagem, por ter deixado o governo em março de 2022; de Heleno, por não ter atos exteriorizados no segundo semestre; e de Paulo Sérgio, por aparentemente ter desistido da trama diante de resistências internas.