Se o diabo veste Prada, Deus provavelmente escolheria a perfeição de Balenciaga
Nova série da StarPlus, "Cristóbal Balenciaga" traça um retrato revelador do "arquiteto da alta costura". Em cena, moda, história e política se entrelaçam nos bastidores da Maison que até hoje é sinônimo de luxo e inovação
História, moda, drama, cultura, política. Sem esquecer de acrescentar também uma aula de produção audiovisual. São essas as matérias-primas da minissérie documental sobre Cristóbal Balenciaga. Lançado nesta sexta-feira (19), o título já ganhou o coração de fashionistas, cinéfilos e críticos. Razões não faltam para os elogios.
A produção é acima de tudo, como o biografado merecia, uma obra elegante. Magnifique, como se diz em Paris, cidade que foi a casa do costureiro espanhol por mais de 30 anos.
Os diálogos, as atuações de posturas milimetricamente sóbrias, a desfaçatez dos olhares julgadores, o medo embrulhado em mentiras necessárias, diante da insanidade da guerra.
Há tanto para ver quando olhamos algo grandioso que fica a sensação de nunca sabemos o bastante. Há tanto para descobrir, para aborver e ver que a atração é imediata.
Para quem ama moda e design, é impossível ficar impassível diante da composição de personagens como Coco Channel, Elsa Schiaparelli, Jeanne-Marie Lanvin e mesmo à mera citação de gênios como Robert Piguet (o homem que treinou Dior e Givenchy), ou Molyneux.
Nomes que transcedem o tempo, pessoas que escreveram o futuro e jamais deixarão de estar presentes nos salões de moda mundo afora. Pois esses gênios, cujas peças hoje são exibidas em museus como obras de arte, foram alguns dos contemporâneos de Balenciaga, o homem, o mestre, o arquiteto da moda que costurava desde criança em uma pequena cidade espanhola e que hoje é citado pela geração caça-cliques, de influencers a celebridades, apenas como uma grife cara a ser exibida como sinônimo de status e dinheiro no banco.
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Poucos "consumidores" da herança moderna de Balenciaga sabem a origem da marca. Menos ainda o que Balenciaga significou na história.
A série, que vai muito além de exibir peças icônicas da alta-costura, revela detalhes do surgimento de uma nova proposta sobre como podemos nos vestir, transformando esse simples ato numa forma de se espressar e se diferenciar no mundo.
O arquiteto, ou rei da moda, como ficou conhecido, também está nu na série. Não o corpo, mas sua essência, seus temores, suas fragilidades e o imenso amor e respeito por suas origens. Foram elas, aliás, que fizeram Balenciaga ser único na passarela mais importante do mundo. Aliás, como se não bastasse, a série ainda nos dá Paris em todo o seu esplendor.
Dirigida por Lourdes Iglesias, Jon Garaño, José María Goenaga, Aitor Arregi, a série da StarPlus é uma dose de bom gosto, acrescida de uma pesquisa histórica apurada, focando inclusive numa época onde o nazifascismo perseguia tudo o que fosse novo, arrojado e fora dos padrões ultraconservadores.
Balenciaga, assim como Chanel, não escapou de seu inferno particular feito de dilemas éticos e políticos, durante a Segunda Guerra. Afinal, como se dar ao luxo de ser apenas um artista da moda, quando a moda é em si um elemento político?
Aqui reside uma das maiores qualidades da série: os bastidores de uma Maison. A resistência e as ambiguidades perante o autoritarismo, as relações perigosas, as amizades influentes, as clientes famosas e os conhecidos arroubos de arrogância que parece estar entranhado em estilistas famosos.
A tarefa de incorporar o enigmático homem que revolucionou o mundo da moda foi entregue ao ator Alberto San Juan. Já o amante, sócio e maior colaborador de Balenciaga, o designer de chapéus Wladzio d'Attainville, é vivido pelo ator belga Thomas Coumans, em uma atuação bem convincente e sem estrionismos, diga-se de passagem.
Nomes de ícones da moda e da arte também ganham espaço na tela, a exemplo de Coco Chanel (Anouk Grinberg), Elsa Schiaparelli (Eva Blay), Jeanne Lanvin (Isabelle Brès), Christian Dior (Patrice Thibaud) e até mesmo Audrey Hepburn (Anne-Victoire Olivier).
O mundo de Balenciaga é rico em vários aspectos. E que bom vermos uma obra de streaming respeitar o seu legado de perfeccionismo e técnicas incomparáveis.
Afinal, se o diabo veste Prada, Deus provavelmente escolheria a perfeição de Balenciaga.