Enem 2023: qual o papel da família e escola na saúde mental dos estudantes nessa reta final

O Exame Nacional do Ensino Médio será realizado nos dias 5 e 12 de novembro. Especialistas falam sobre a importância de uma rotina equilibrada entre estudos e lazer

Escrito por Gabriela Custódio , gabriela.custodio@svm.com.br
Estudantes chegam para prova do Enem 2022
Legenda: Na preparação para o Enem, é importante que a família esteja atenta aos jovens e observe se há mudanças que demonstram sofrimento
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Ansiedade, sensação de “branco” na hora de resolver a prova e dificuldade para manter uma rotina saudável e para organizar os estudos, devido ao grande volume de assuntos, são alguns dos problemas enfrentados por jovens que estão prestes a fazer o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Na preparação para a prova, que será realizada nos dias 5 e 12 de novembro, ter o apoio da família e da escola pode fazer a diferença para que os estudantes se mantenham saudáveis e seguros, independentemente do resultado.

Além da ansiedade, a psicopedagoga Renata Pires relata que também é comum os estudantes apresentarem “certa apatia”. Por entenderem que não vão conseguir dar conta da grande demanda de estudos, muitos ficam alheios e mostram desinteresse e falta de motivação. Esse quadro, segundo a mestre em Psicologia e especialista em Psicopedagogia, pode levar a depressão ou fobia social.

“Atualmente atendo alguns adolescentes que inclusive estão temporariamente privados de ir à escola. Então, é um momento bem desafiador, principalmente depois dessa pandemia e com o super uso dos eletrônicos como forma de compensar faltas sociais”, comenta.

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Em meio a esse período repleto de nervosismo, a psicóloga Brenna Damasceno, especialista em Terapia Analítico-comportamental e em Neuropsicologia, destaca que o apoio familiar é fundamental para diferentes aspectos da preparação dos estudantes.

Desde o básico, que é prover uma alimentação saudável, sono de qualidade e boas condições de estudo — ambiente iluminado, arejado e silencioso, todo material didático necessário, acesso à internet etc. —, até o apoio psicológico. No caso deste, recomendo que as famílias estejam próximas: escutem os jovens, acolham as queixas e ofereçam ajuda. Se está apresentando sofrimento ao longo do processo é porque se importa muito, então dependendo da gravidade é necessário buscar ajuda profissional.
Brenna Damasceno
Psicóloga e especialista em Terapia Analítico-comportamental e em Neuropsicologia

É importante que a família esteja atenta aos jovens nesse período de preparação, observando se há mudanças que demonstram sofrimento. Brenna Damasceno destaca sinais como preocupação excessiva, dificuldade de concentração, irritabilidade, inquietação, insônia, fatigabilidade aumentada e humor deprimido, além de baixas autoestima e autoconfiança. Sintomas físicos como taquicardia, hiperventilação e dores de cabeça frequentes também podem ser um alerta.

Em todo esse contexto, Renata Pires aponta que nem sempre interrogar o filho ou a filha pode ser uma boa estratégia para gerar aproximação. De acordo com ela, os pais podem colocar-se em uma situação de parceria e empatia, entendendo as dificuldades do outro e compartilhando as próprias experiências e vivências. Mas deve-se ter cuidado com as cobranças em relação à rotina, e a palavra-chave é equilíbrio.

É importante que nessa rotina tenha estudo, mas é importante que tenha programas com os amigos, lazer ao ar livre. É importante que tenha acesso eletrônico, mas (com) limitação. É um período de transição, da infância para a vida adulta, mas muitas vezes os pais acham que eles já são suficientemente grandes para dar conta das suas coisas. Eles precisam sim de liberdade, mas também orientação e supervisão.
Renata Pires
Psicopedagoga, mestre em Psicologia e especialista em Psicopedagogia

O papel da escola

Estudantes em sala de aula
Legenda: Especialistas apontam que a escola não deve promover competição entre os estudantes e promover um ambiente leve e amistoso para auxiliar na promoção da saúde mental
Foto: Shutterstock

A escola, por sua vez, também pode agir de forma benéfica para a saúde mental dos estudantes. Em vez de promover tanta competição entre eles, a instituição deve proporcionar um ambiente leve e amistoso, aponta Brenna Damasceno. A psicóloga também cita a oferta de espaços de escuta, acolhida e reflexão, que podem ser individuais ou em grupo.

“O papel da escola tem muito a ver com ajudar nesse autoconhecimento, estimular a parceria versus a competitividade, a agressividade positiva — no sentido de se correr atrás do que quer — e conhecer cada estudante de perto para que não exista uma cobrança sobre uma massa”, complementa Renata Pires.

Suporte para além do dia da prova

Mas ter uma rede de apoio não é essencial apenas antes da prova. É importante que os jovens sintam-se acolhidos durante todo o processo, inclusive após o Exame e perante a possibilidade de o resultado não ser o esperado. Para Brenna Damasceno, dar segurança de que o estudante terá apoio para tentar novamente pode ser “extremamente terapêutico”.

“Isso pode ir sendo construído ao longo de todo o ano com acolhimento, incentivo, reconhecimento do esforço nos estudos e principalmente com a comunicação de que se entende que a realidade do Enem é de fato desafiadora e que não passar é uma possibilidade mesmo com toda dedicação”, afirma a psicóloga.  

Além disso, Renata Pires afirma que se deve focar mais no processo do que no resultado em si. "Focando no processo, um dia o resultado chega. (Com) uma boa rotina, organização do tempo, boa alimentação, escuta atenta, parceria e empatia, se não for possível a aprovação no primeiro momento e se esse for o desejo, um dia será”, aconselha.

A incerteza sobre o futuro e sobre o que fazer caso não consiga a vaga que sonha no bacharelado em Ciências Biológicas preocupam Mariana Queiroz, de 17 anos. Mas ela conta que encontra suporte em casa. “(Meus pais) me apoiam bastante conversando comigo e me acalmando com o fato de eu ainda ser nova e poder tentar de novo no ano seguinte caso eu não conseguisse passar na prova.”

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Essa será a terceira vez que a jovem faz o Enem. Ela já tinha feito em 2021 e em 2022, mas agora a prova representa sua “porta de entrada para o mundo acadêmico”. Para “desligar a cabeça” da ansiedade que sente para o Exame, ela também conta com a ajuda da literatura. “Tenho lido bastante, dos títulos mais clássicos aos mais modernos”, diz.

Ao longo do ano, ela manteve uma rotina “maleável” para não precisar se privar de atividades que gosta de fazer e, ainda assim, conseguir acompanhar conteúdos relacionados ao Enem e às matérias da escola. Nessa reta final, a jovem modificou a estratégia. “Acabei mudando o meu estilo de estudo para ficar fundamentado na resolução de questões de provas antigas e ter uma ideia a mais de como o Enem vai querer cobrar os conteúdos que eu já sei”, relata.

A ajuda do acompanhamento profissional

Aos 18 anos, Maria Izabelly Paixão vai fazer o Enem pela segunda vez — mas agora não mais como um treino. Neste ano, o Exame realmente definirá a entrada da jovem no curso de Direito, o que tem sido motivo para se sentir pressionada e ansiosa. “Tento me controlar ao máximo porque sei que me esforcei o ano todo”, diz. Para ela, o Enem é uma “virada de chave” para uma fase importante e na qual será “muito feliz”. “Tenho dado tudo de mim justamente para ter essa fase de forma tranquila e muito mais especial.”

Ainda assim, com a organização que estabeleceu, a jovem conta que não precisou renunciar a muitas atividades ao longo do ano e conseguiu conciliar os estudos e as saídas com amigos e familiares.

A rotina de Izabelly inclui cerca de quatro a cinco horas de estudo por dia, duas redações por semana, simulado aos fins de semana e participação no projeto Academia Enem, iniciativa da Prefeitura de Fortaleza. Em meio a tudo isso, o acompanhamento psicológico tem sido um aliado.

A terapia não foi buscada especificamente devido ao Exame, mas a intenção foi chegar bem ao dia da prova, sem crises de ansiedade. “(Tem ajudado) demais. Até porque tive três crises de pânico e depois a terapia ajudou. Estou me achando mais confiante para essa prova”, comenta a estudante.

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