Helena Barbosa destaca prioridades de gestão na Secultfor: 'Cultura para além da Praia de Iracema, Centro e Aldeota'
Anunciada como secretária da Cultura de Fortaleza pelo prefeito eleito Evandro Leitão, gestora cita "organização da casa" e descentralização como prioridades
Organizar a “casa” e descentralizar ações. São esses os movimentos prioritários previstos pela gestora Helena Barbosa para quando assumir, em 1º de janeiro, a Secretaria da Cultura de Fortaleza (Secultfor). Em entrevista por telefone ao Verso nesta quarta (18), a próxima titular da pasta fala sobre a “expectativa” da classe, o que a levou a aceitar o convite feito pelo prefeito eleito Evandro Leitão (PT) e os movimentos de transição.
A escolhida pelo petista desponta como perfil técnico. Graduada em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Ceará e com especializações em Gestão e Políticas Culturais (Itaú Cultural/Universidade de Girona) e Gestão Cultural Contemporânea (Itaú Cultural/Instituto Singularidades), Helena tem trajetória de mais de 15 anos na cultura.
Na gestão pública, soma mais de uma década de atuação, já tendo trabalhado como coordenadora e assessora na Secretaria da Cultura do Ceará (Secult) e assumido as gestões do equipamento Porto Dragão e, mais recentemente, do Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura (CDMAC).
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“Uma de nós na Gestão Municipal”
Desde janeiro de 2022, ela é superintendente do Dragão do Mar, tendo implementado nesses quase dois anos à frente do centro cultural uma série de políticas ligadas ao território, com aproximação de diversos agentes vizinhos — das comunidades à população em situação de rua, passando pelo empresariado.
Tal atuação frente ao CDMAC estimulou uma defesa de parte da sociedade civil do nome de Helena para a Secultfor. Uma petição pública intitulada “Uma de nós na Gestão Municipal”, destinada ao prefeito eleito, chegou a circular em prol da indicação dela para a pasta.
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“É um reconhecimento que vem a partir de uma coletividade. Isso já diz muito sobre o perfil do meu trabalho, fico bastante honrada. Não reforcei e não estive junto disso, mas as pessoas me procuraram”, relata.
Ela diz desconhecer a relevancia da mobilização popular na decisão por seu nome na pasta: “Nem sei até que ponto esse movimento influenciou na indicação do prefeito, mas tenho total entendimento que é resultado de um trabalho de muito tempo fundamentado nisso, no diálogo com outro”.
“Fiquei bastante orgulhosa de entender que o meu trabalho é capaz de mobilizar a sociedade civil. Assim, se requer mais confiança, mais esperança, são outras estratégias e elas se deram de forma orgânica”
“Compromisso com a Cidade”
Em meio ao movimento, o nome dela passou a circular também nos bastidores da transição como uma possibilidade para a cultura na futura gestão. Helena, no entanto, estava focada no fechamento do ano do Dragão do Mar e, inclusive, prevendo período de férias e mestrado.
O convite oficial chegou no começo desta semana, enquanto Helena estava em viagem de trabalho para apresentar o Dragão do Mar e participar de treinamento com gestores a convite da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan).
Apesar dos planos de descanso e estudo, Helena credita o aceite a um motivo: “Tenho um compromisso muito grande com a Cidade”. Segundo a gestora, a “possibilidade de expandir o que estava fazendo no Dragão para a cidade inteira” se sobrepôs.
“Se eu sentisse que era uma proposta onde teria canal aberto e conseguiria construir, eu iria considerar”, segue. O lugar da descentralização defendida na fala de Evandro, que classifica como “segura”, “tranquila” e “animada”, corroborou a decisão.
“Canal direto” e “condições de trabalho e execução” foram as demandas da futura secretária. “A Secultfor é uma estrutura muito desafiadora. Acentuei (que) não tenho vaidade por cargo, mas tenho um compromisso com a Cidade”, reforça.
“Quando se coloca meu nome, há uma expectativa em torno do que vou construir, então preciso de garantias de compromissos nesse sentido, que vão estar dentro de uma equipe qualificada para a gente deixar essa marca de gestão — que ele está propondo e eu coaduno — que é a da descentralização da cultura”
Descentralizar políticas é prioridade da gestão
Na gestão do Dragão do Mar, Helena deixou marcas como a criação do Núcleo de Articulação Territorial, a política de gratuidade de ingressos para moradores das comunidades vizinhas e o mapeamento de espaços vazios e ociosos na região, por exemplo.
“Como a gente conecta todo mundo para que se possa pensar a cultura para além da Praia de Iracema, Centro e Aldeota? Como essas políticas culturais chegam em cada bairro de Fortaleza? Já venho fazendo isso desde o Porto Dragão, na verdade, e vou aplicar na Secretaria”, destaca.
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Para essa concretização, a gestora ressalta a importância de diálogo com outras pastas — em especial a da Juventude, responsável pela Rede Cuca — e agentes culturais da Cidade. “São os Cucas, os outros equipamentos, os coletivos. A cultura não tem que chegar só através do equipamento se eu tenho a escola do Nóis de Teatro, a favela do Inferninho”, exemplifica.
“É a lógica do ponto de cultura. Não precisa tão somente ser instituições. Como você mapeia esses pontos que produzem criativamente em seus territórios? Como fomenta?”, segue Helena.
Desafios de “organizar a casa”
Apesar de priorizar a descentralização e ressaltar a “expectativa” da classe cultural por ações do tipo, a gestora ressalta que o passo inicial deve ser a organização da pasta.
“O desafio vai ser saber como é fazer a partir da estrutura da Secretaria, da administração direta. Eu sei que é aplicável, a gente tem boas referências de descentralização, mas como isso vai ser usado para a cidade a gente vai sentar e pensar de forma coletiva”, segue.
“Tem que organizar a casa, chamar os artistas para conversar, começar a criar canais de diálogos diretos com a cena, que a gente sabe que está muito afastada da Secultfor já tem um tempo”, elenca.
“É importante conversar com artistas, produtores, técnicos, pesquisadores, sobre o que na cena da cidade está sendo produzido para contribuir com uma política que, de fato, consiga chegar a um ato de democratização não só de acesso do público, mas do artista”
A entrevista com Helena se deu no dia seguinte ao anúncio oficial, enquanto ela ainda estava em trânsito. Por isso, maiores informações acerca de estrutura, orçamento previsto e transição não estavam ainda detalhadas.
A gestora ressalta que precisa se “aproximar da transição da Secretaria de Cultura do município”. “Vou seguindo muito a lógica do movimento que o prefeito vai orientando. Talvez após o Natal eu já tenha um cenário de maior análise da Secretaria”, aponta.
Legados do Dragão do Mar
Para o Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura, do qual segue gestora até o fim do ano, Helena ressalta as conquistas alcançadas na gestão e quais desafios ainda permaneceram.
“O grande trabalho (para o CDMAC), hoje, é estrutural, e aí requer de fato uma mobilização maior do ponto de vista do Governo do Estado e da secretaria de Obras, mas de relacionamento, reformulação de programas, construção de redes tanto na parte política, artística e social, a gente está muito bem”
A superintendente destaca entregas como o cadastro de mais de 800 pessoas das comunidades vizinhas na política de gratuidade de ingressos e projetos estruturados com o Moura Brasil e o Poço da Draga, por exemplo.
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“A gente vai terminar o relatório de gestão e compartilhar em números, mas o sentimento é de muita felicidade e alívio, de que deu certo o que a gente se propôs. Agora o desafio é estrutural, que depende de outras coisas”, aponta.
Expectativas da Cidade e “configuração fortuita”
Ainda no início da trajetória na cultura, antes de se envolver em gestão, Helena teve experiências ligadas à Secultfor em diferentes instâncias. Foi, por exemplo, aluna de audiovisual da Vila das Artes, equipamento que está no escopo da secretaria municipal.
“Por mais que minha atuação na gestão pública tenha sido à frente de equipamentos do Estado, sou uma pessoa que viu a cultura de Fortaleza, sobretudo. Conheço muito bem a administração direta e os projetos da cidade”, reforça.
Os desafios futuros frente à pasta, ela acredita, não devem diferir do que já encarou, seja como aluna da Vila ou em cargos de gestão. “Tudo isso, na verdade, traz um repertório muito bacana para rodar uma Secretaria como essa. É claro que você vai estar na linha de frente, que administração direta é bem mais complicada de rodar, mas eu já sei disso”, reforça.
Quanto às expectativas e eventuais demandas da cena cultural, Helena também considera que teve “terreno preparado” pela experiência no CDMAC.
“É gostoso estar dentro de um lugar onde você consegue implementar política de proximidade, mas a cobrança é na porta da sua casa. Ele me preparou para isso. As pessoas, artistas e comunidades estavam o tempo inteiro ao nosso lado, então é a doçura e o desafio de estar próximo de quem você está servindo, no sentido do serviço público”, aponta.
Politicamente, Governo e Prefeitura estarão novamente alinhados a partir de 2025, fato que é ressaltado por Helena como uma “configuração muito fortuita” para as políticas culturais, com ela “ocupando a Secult município, a Luisa na CE, o Tiago (Santana) no Instituto Mirante, a Rachel (Gadelha) no Instituto Dragão do Mar (ambos são presidentes de Organizações Sociais que gerem equipamentos culturais do Governo)”.
"Com esse cenário, não tem porque dar errado. Não vai ser fácil, a administração direta não é fácil, mas é uma configuração muito fortuita. É um cenário que não se repete com facilidade, então a gente tem que aproveitar e colocar as coisas para frente, para que se continue sendo referência em política cultural do ponto de vista de Estado e também de município”, defende.