Em Barbalha, professor completa 45 anos como carregador do Pau da Bandeira: ‘Fé e muita coragem’

Roberto Maguila, 55, começou na tradição ainda criança e hoje se dedica a preservá-la

Escrito por
Ana Beatriz Caldas beatriz.caldas@svm.com.br
Roberto Maguila é um dos principais carregadores do Pau da Bandeira
Legenda: Roberto Maguila é um dos principais carregadores do Pau da Bandeira
Foto: Ismael Soares

Quem avista o professor de educação física Antônio Roberto de Sousa, 55, andando pelas calçadas da famosa Rua do Vidéo, no Centro Histórico de Barbalha, com certeza imaginará que trata-se de uma celebridade local.

Com um sorriso no rosto, o homem, conhecido popularmente como Roberto Maguila, é cumprimentado por todos que o encontram, dos senhores que moram na rua há décadas às crianças que por ali passeiam – muitas delas, seus alunos ou ex-alunos na rede municipal de ensino.

Ex-jogador de futebol, o barbalhense tem uma trajetória profissional que, de fato, o fez se tornar conhecido. Mas é sua história junto à fé em Santo Antônio, o padroeiro de sua cidade natal, cuja memória carrega no nome, que o tornou ainda mais querido na região. Neste domingo (1º), Roberto será um dos carregadores-chefe do famoso Pau da Bandeira – ato de tradição e penitência que fará pela 45ª vez consecutiva.

Carregamento do Pau da Bandeira é feito por mais de 300 homens
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Foto: Clodoaldo Amaro/Prefeitura de Barbalha

Neste ano, o tronco de Jatobá escolhido para o esperado momento tem 1,5m de diâmetro e pesa três toneladas. Junto a Roberto, mais de 300 homens participam do carregamento do Pau da Bandeira – considerada uma das mais honrosas para os homens de Barbalha e motivo de orgulho para os cearenses fiéis de Santo Antônio. 

A vontade de participar chegou cedo, quando Roberto tinha apenas 10 anos de idade, por influência do irmão mais velho, que foi carregador por muitos anos. Desde então, Roberto se encantou pela tradição e hoje é um dos carregadores mais antigos ainda em atividade – e em posição de destaque, na linha de frente do carregamento.

Em 2025, o professor completa 45 anos como carregador
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Foto: Ismael Soares

“Para mim é sempre importante, porque eu sou devoto”, explica. “A gente tem que ter muita fé e muita coragem para ir numa mata daquela para ir atrás do pau – e depois também, né? Porque a gente vai de manhã e é o dia todo, então tem o desgaste físico e emocional”, completa.

Além da devoção a Santo Antônio, Maguila destaca a importância de compartilhar o momento de penitência com outros fiéis. “Nesse período, os carregadores têm uma irmandade, uma união que não tem tamanho, tudo em volta do nosso padroeiro, de Santo Antônio”, conta.

Maguila cumprimenta 'irmãos' de penitência nos festejos de 2024
Legenda: Maguila cumprimenta 'irmãos' de penitência nos festejos de 2024
Foto: Clodoaldo Amaro/Prefeitura de Barbalha

Todo ano é uma história diferente. Quem participa do pau da Bandeira, cada um tem uma história para contar. É uma história que fica marcada para o resto da vida.”
Roberto Maguila
Professor de educação física e carregador do Pau da Bandeira

Para participar do revezamento dos carregadores, é preciso chegar cedo à “cama do Pau”, localizada no Sítio Roncador e ser “batizado”. “Tem que sentar no pau, tomar um banho de areia, de poeira. É bem legal, é um batizado bem forte”, explica Roberto.

Por se tratar de uma penitência, não há preparo físico, apenas orientações dos mais experientes para os mais novos não se machucarem. “É na fé mesmo”, garante Maguila.

Ao longo dos anos, nem todas as experiências foram positivas – especialmente nos anos 80 e 90, muitos acidentes ocorreram por não haver uma fiscalização de órgãos competentes.

Atualmente, porém, autoridades como o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional e a Secretaria do Meio Ambiente acompanham e orientam sobre as árvores que nativas podem ser cortadas.

“Tem os órgãos competentes, tem aquela árvore que a gente pode retirar. Antes, 20, 30 anos atrás não tinha, a gente podia tirar qualquer árvore nativa, aí se tornava mais perigoso”, lembra Roberto. “Além disso, quando a gente retira a árvore, a gente tem uma responsabilidade de fazer um reflorestamento, de pegar e ter esse cuidado. E não é só chegar lá e plantar, a gente tem que acompanhar se ela vai crescer”, completa.

Pau Mirim: para manter a tradição

Foi na escola onde Roberto trabalha, a ETI Josefa Alves, que surgiu um projeto que busca contribuir com a manutenção da tradição do Pau da Bandeira: o Pau Mirim. Todos os anos, no dia do início da festa, junto ao cortejo de grupos de cultura popular, meninos de 8 a 13 anos carregam um “tronco” feito de jornais e outros materiais para simbolizar o Pau da Bandeira.

“Eles já vão se empolgando, vão gostando e tudo. Nesse ano, já terá carregadores que foram do Pau Mirim e vão participar do Pau de Santo Antônio”, celebra. “A nossa tradição a gente tem que manter, porque a gente vai passando e a festa vai continuando”, completa.

Carregamento será feito por 6km e inicia festa

O percurso do carregamento do Pau da Bandeira, realizado entre o início da manhã e o fim da tarde, tem 6 km de extensão e vai do Sítio Roncador até o Centro Histórico de Barbalha, onde o Pau da Bandeira é cercado por barbalhenses e turistas que, por tradição, buscam tocar ou sentar no tronco como parte das simpatias para casar ou encontrar um grande amor. 

Depois, o Pau é erguido com a bandeira de Santo Antônio – cujo tecido é preenchido com nomes de fiéis que também contam com a ajuda do Santo Casamenteiro – em frente à Igreja Matriz da Cidade, dando início aos festejos que vão até o dia do Santo, 13 de junho.

Confira a programação completa deste domingo (1º):

5h – Alvorada com orquestras filarmônicas pelas ruas da cidade

7h – Apresentações das bandas cabaçais no Centro Histórico

8h – Chegada dos grupos de tradição no Largo da Matriz (mais de 70 grupos culturais)  Participação das escolas com o Pau Mirim, simbolizando o carregamento e incentivando as futuras gerações

9h – Missa da Bênção da Bandeira na Igreja Matriz de Santo Antônio

10h – Início do grande cortejo cultural com mais de 70 grupos, da Matriz até a Igreja do Rosário / Exibição dos símbolos da festa: bandeira de Santo Antônio, imagem do padroeiro e Cachaça do Vigário

12h – Início do carregamento do Pau da Bandeira (jatobá de 23m, 1,5m de diâmetro, 3 toneladas). Percurso de 6 km, do Sítio Roncador ao Centro, comandado pelo capitão Rildo Teles

15h – Shows regionais nos palcos-ilhas

Por volta das 17h – Chegada ao Centro Histórico  Passagem pelo corredor cultural com rituais populares e simpatias para casamento  Encerramento do carregamento e hasteamento do Pau da Bandeira em frente à Igreja Matriz

20h – Shows de Dorgival, Waldonys, Ítalo Queiroz, Flávio José, Falamansa, Flávio Leandro e muito mais nos quatro palcos de Barbalha (Palco do Rosário, Palco da Estação, Palco Marco Zero e Palco da Matriz)

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