Quando eu parei, o tempo me encontrou
Minha vida pediu pausa e o que eu aprendi sobre o tempo e os recomeços possíveis.
Como nas primeiras páginas de Para não acabar tão cedo, de Clarice Freire, o tempo aqui não entra apressado. Ele chega de mansinho, pedindo licença, lembrando que tudo o que é essencial precisa de fôlego para existir. O tempo, esse personagem invisível, organiza nossas rotinas, molda afetos e, muitas vezes, nos governa sem que percebamos.
Vivemos sob a lógica dos ponteiros acelerados. O relógio dita prazos, o calendário cobra resultados e a sensação constante é a de atraso. No fim do ano, essa pressão ganha corpo: listas de pendências se acumulam, promessas ficam para janeiro e repetimos, quase como um mantra coletivo: “agora não dá mais tempo”.
É como se dezembro fosse um corredor estreito onde tudo precisa passar correndo, empurrando para o futuro aquilo que não coube no presente.
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Essa relação distorcida com o tempo cobra seu preço. No meio desse fluxo, vivi uma experiência que redefiniu minha própria noção de urgência: fiquei 30 dias internada em uma instituição terapêutica. Foram 30 dias longe de tudo aquilo que eu chamava de vida: longe do trabalho, das notificações, das demandas externas.
Justamente eu, que acreditava não ter tempo para nada. Meu tempo servia apenas ao trabalho e, nessa entrega total, acabei perdendo (ou ganhando, vai depender do seu ponto de vista) o essencial.
O afastamento forçado revelou um paradoxo: ao sair do mundo, encontrei o tempo. Sem agendas cheias, os dias ganharam densidade. Aprendi que tempo não é só duração, é presença. “Compositor de destinos”, diz a canção, lembrando que o tempo não é inimigo, mas matéria-prima da vida e uma entidade, quase um deus a quem se pede sabedoria.
Talvez o tempo nunca tenha sido o problema. Talvez tenha sido a forma como eu me ausentei dele. No fim do ano, quando tudo parece correr mais rápido e a vida pede decisões imediatas, esquecer de si vira hábito. Mas o tempo não cobra, ele apenas espera que a gente aprenda a escutá-lo.
A escolha que nos resta é decidir se vamos apenas correr atrás dele ou, finalmente, caminhar ao seu lado.
*Este texto reflete, exclusivamente, a opinião da autora