Nova cor do ano provoca reflexões sobre minimalismo, identidade e saturação estética

Entre serenidade e homogeneização, Pantone elegeu “Cloud Dancer” como a cor de 2026

Escrito por
Elaine Quinderé verso@svm.com.br
Legenda: Cor do ano da Pantone 2026, "Cloud Dancer" é descrita pela marca como “um sussurro de calma num mundo barulhento"
Foto: Pantone / Divulgação.

Quando a Pantone anunciou, pela primeira vez desde 1999, uma cor branca como a cor do ano, o mundo do design, arte, moda e decoração estremeceu. A escolhida para 2026 é “Cloud Dancer”, um branco suave, arejado, com subtons equilibrados e descrito pela própria Pantone como “um sussurro de calma num mundo barulhento”.

É sob essa leveza etérea que a escolha carrega intenções claras: oferecer um ponto de pausa, uma tela em branco para podermos serenar nossas mentes, repensar, recriar e respirar.

“Cloud Dancer” funciona como antídoto aos excessos visuais e à saturação de estímulos de uma sociedade marcada pelo ritmo acelerado da tecnologia, redes sociais e cultura do consumo.

O que há nessa cor e por que ela funciona

“Cloud Dancer” não é um branco frio, impessoal ou estéril. Trata-se de um off-white, uma cor suave, natural e acolhedora, com um balanceamento cuidadoso de tons quentes e frios, perfeitamente criado para evitar o clima clínico de um branco puro.

Visualmente, a cor sugere leveza, calma, uma espécie de “respiro cromático”. Serve tanto como base neutra para contrastes mais ousados quanto como um convite à simplicidade, à clareza e à sutileza.

Por essas qualidades, “Cloud Dancer” é especialmente interessante para a moda minimalista, para a tendência “clean girl aesthetic”, tão criticada por mim aqui. Para o mundo da arquitetura e design, ela vai funcionar perfeitamente na decoração de interiores que valoriza luz, amplitude e paz visual, design de produtos ou ambientes que busquem ser acolhedores e contemporâneos.

Mas por que essa cor? Segundo representantes da Pantone, como a diretora executiva do instituto de cores, Leatrice Eiseman, a escolha reflete um desejo coletivo por “novo começo”, por reconectar com uma sensação de serenidade e clareza em meio ao caos.

A seleção não ocorre no vácuo: a Pantone analisa tendências globais em moda, arte, tecnologia, comportamento social, design, arquitetura e estética. “Cloud Dancer” surge como resposta a uma demanda por desaceleração, introspecção e espaço — espaço para criar, para repensar e para respirar.

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Em outras palavras, a cor de 2026 não vem pintar apenas tecidos ou paredes, ela tenta pintar um estado de espírito.

Então, se a cor cumpre seu papel simbólico, poderemos ver em 2026:

Uma valorização ainda maior de designs minimalistas, seja na moda ou na decoração que priorizam o essencial, a neutralidade, a elegância discreta. “Menos é mais” como reflexo de um anseio por leveza;

● Ambientações interiores mais claras, serenas, com paletas neutras, favorecendo a sensação de calma e bem-estar em casas, escritórios, espaços de convivência;

● Experimentações criativas: “Cloud Dancer” como pano de fundo para contrastes de cores mais fortes, materiais naturais, texturas, reforçando a ideia de que a cor funciona como base, não como protagonista absoluto;

● No âmbito cultural e simbólico, a cor pode ser vista como um reflexo de um momento de transição global, um convite à introspecção, à simplicidade, à pausa (e talvez como protesto silencioso contra a saturação visual e o consumo exacerbado).

No entanto, a adoção de um branco como “cor do ano” não é isenta de questionamentos. Em tempos em que a diversidade, visibilidade e expressão intensa de identidades e contrastes são cada vez mais valorizadas, afirmar que o “espírito do ano” possa ser representado por uma neutralidade sutil pode soar como retração - como se o mundo tivesse decidido silenciar cores fortes, vozes dissonantes e pluralidade visual.

Além disso, há uma ironia: num momento em que muitos buscam urgência, visceralidade, protagonismo, a aposta pela sutileza pode parecer um gesto de evasão, de deixar tudo em branco, em silêncio. Talvez a cor represente menos esperança ativa e mais uma pausa cautelosa, tímida demais.

Finalmente, há a dúvida prática: será que tanta neutralidade não se transforma em homogeneização visual? Quantas casas, roupas e produtos passarão a se parecer uns com os outros, extinguindo originalidade em nome da “serenidade”?

“Cloud Dancer” é o espelho do momento. Não era a escolha óbvia, foi, talvez, a escolha de quem está cansado de barulho, da pressa, do excesso. É uma cor que não grita, que não exige protagonismo: ela oferece espaço, respiração e pausa.

Para 2026, a Pantone não entrega apenas um pigmento, ela entrega um convite: para desacelerar, olhar de novo, repensar, reinventar. Resta saber se, em um mundo tão fragmentado e diverso, tanta uniformidade cromática tem o poder de unir ou de apagar nuances importantes.

Este texto reflete, exclusivamente, a opinião da autora

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