Novo Ideb: qual o impacto de usar o Enem para cálculo da nota de alunos? Especialistas analisam
Caso seja implementada, a alteração será feita na prova de 2025 para os primeiros resultados em 2026
O Ministério da Educação começa setembro com uma análise sobre a possibilidade de usar as notas dos estudantes do 3º ano do ensino básico no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) para cálculo do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) no Brasil. A ideia é simplificar a avaliação da qualidade do aprendizado no País.
Essa proposta foi adiantada pelo ministro Camilo Santana no programa Conexão da Rádio Verdinha FM 92.5, nesta segunda-feira (3). Já neste mês, as redes de ensino e educadores devem ser consultados para a análise da medida. Caso seja implementada, a alteração será feita na prova de 2025 para os primeiros resultados em 2026.
"Nós vamos passar por um processo de reavaliação depois desse ciclo de quase 18 anos desde quando o Ideb foi criado para ver de qual forma nós vamos modelar ou simplificar, ou exigir um indicador mais avançado para melhorar a qualidade", observa o ministro.
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Camilo considera o Ideb como o “mais importante indicador” para mensurar e medir a qualidade das escolas públicas e privadas no País. Contudo, o Ideb deve passar por uma reformulação em paralelo ao novo Plano Nacional de Educação (PNE).
Uma das mudanças avaliadas é justamente usar a nota do Enem para que os estudantes do 3º ano do Ensino Médio não precisem fazer o Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb).
"No terceiro ano do Ensino Médio, os alunos fazem duas provas: a do Saeb e a do Enem. Então, são duas provas que competem uma com a outra. É melhor que o Enem possa ser a avaliação já que o estudante está focado no Enem", analisa.
Nós vamos passar por um processo de discussão, temos dois anos para o Novo Ideb, vamos ouvir as redes, os estados e municípios, ouvir os especialistas para que a gente possa construir um Ideb que possa aperfeiçoar, melhorar e diminuir as desigualdades
Mas, afinal, qual o impacto que essa medida pode ter para o Ensino Médio caso seja aprovada? O Diário do Nordeste consultou especialistas em Educação para entender os detalhes da medida.
O que dizem os especialistas
Eloísa Vidal, doutora em Educação e professora na Universidade Estadual do Ceará (Uece), concorda com a necessidade de reformulação do Ideb para entender, de fato, como está a aprendizagem nas escolas brasileiras.
“O Ideb encerrou um ciclo, está esgotado desse jeito, o Ministério tem sim que pensar num novo indicador mais complexo, porque o Ideb não dá conta nos processos de desigualdades da rede”, detalha. Mas isso, como avalia, não pode ser feito de qualquer jeito.
“A nossa expectativa, como pesquisadores da área, é que esse indicador não se restrinja apenas aos resultados de desempenho dos alunos e taxas de aprovação. Esperamos que esse indicador seja um pouco mais complexo e que inclua outras variáveis”, frisa.
Em relação ao uso do Enem para dar nota a esse grupo de estudantes, Eloísa aponta alguns tópicos que podem “distorcer” os resultados. “O Enem funciona por adesão – ninguém é obrigado a fazer – e para virar um indicador compondo um índice que, inclusive, compara resultados teria que se adaptar muito”, completa.
Um problema na hora de fazer a análise, por exemplo, está na diferença de adesão ao Enem entre estados. Enquanto o Ceará possui em torno de 80% dos jovens concludentes do Ensino Médio, em São Paulo essa taxa cai para menos de 30%.
Outro aspecto é que estudantes usam outros vestibulares para ingressar no Ensino Superior, como para universidades particulares e estaduais, que ficariam de fora da análise.
Além disso, a doutora em Educação, defende a necessidade de avaliar aspectos da infraestrutura da escola – como a existência de laboratórios e até uso de ar-condicionado –, questões socioemocionais dos estudantes e aspectos ligados ao gênero e raça dos alunos.
“Uma escola precarizada não tem condições de dar a mesma resposta em termos de aprendizagem do que uma escola bem equipada. Então, esse indicador precisa entrar no Ideb como uma variável importante”, conclui.
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Marco Aurélio de Patrício Ribeiro, professor universitário e doutor em Educação, é favorável à mudança como uma forma de não sobrecarregar os estudantes que já estão “preocupados em definir o futuro profissional.”
“O Enem, pelo formato que tem e as disciplinas que abrange, avalia muito melhor a qualidade do ensino do que o próprio Ideb”, acrescenta em relação às diferentes disciplinas, como História, Geografia, Biologia, Física e Química, por exemplo.
O especialista lembra que o Ideb pode indicar os pontos de melhoria e disseminar as práticas educativas que podem ser replicadas em outras instituições.
“Isso serve como uma reflexão para que as escolas revejam os procedimentos educacionais e as escolas bem sucedidas possam ser vistas e os projetos que elas desenvolvem sejam espalhados”, detalha.
Por isso, o indicador pode funcionar como um “norte” para cada instituição de ensino elaborar formas de aumentar a qualidade do aprendizado.
“Serve como uma estratégia para a escola conhecer os seus resultados e trabalhar para superá-los. Para mim, a grande qualidade dessas avaliações não é ter um fundo comercial do ‘primeiro lugar’, mas da escola competir com ela própria e a cada ano dar o seu melhor”, finaliza.
Como funciona o Ideb
Criado em 2007, o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) avalia os resultados de dois conceitos relevantes para a qualidade da educação: o fluxo escolar e as médias de desempenho nas avaliações.
O Ideb é calculado a partir dos dados sobre aprovação escolar, obtidos no Censo Escolar, e das médias de desempenho no Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb). O Índice permite traçar metas de qualidade educacional para os sistemas, variando de 0 a 10.
A avaliação também é importante condutor de política pública em prol da qualidade da Educação. É a ferramenta para acompanhamento das metas de qualidade para a educação básica e comparar a qualidade da educação com países desenvolvidos.