Por que a Estação das Artes não usa praça em grandes eventos? Logística e hospital estão entre razões

Localizada em frente aos equipamentos do Complexo Cultural Estação das Artes, a Praça Castro Carreira tem usos em constante debate

Escrito por João Gabriel Tréz , joao.gabriel@svm.com.br
Diferentes programas compõem o rol de atividades promovidas pela Estação das Artes que ocupam o logradouro público
Legenda: Diferentes programas compõem o rol de atividades promovidas pela Estação das Artes
Foto: Thiago Matine/Divulgação

Com o início da divulgação nas redes sociais da programação de aniversário de dois anos da Estação das Artes — equipamento do Governo do Estado com gestão do Instituto Mirante —, dezenas de comentários citavam — entre tons de sugestão, demanda e crítica — um mesmo espaço: a Praça da Estação. 

Isso porque uma parcela do público frequentador percebe e questiona — não de hoje — uma “subutilização” do espaço nas grandes programações promovidas pelo equipamento. Com o anúncio das comemorações deste ano, uma pergunta se impôs: por que não levar as atrações para a praça, ao invés de limitar o acesso à parte interna do local?

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Apesar de popularmente ser conhecido como “Praça da Estação”, o logradouro público é oficialmente batizado de Praça Castro Carreira e tem gestão da Prefeitura de Fortaleza. De acordo com Uliana Lima, diretora da Estação das Artes, ele tem “ocupação orgânica” promovida por diferentes atores.

“As noites de segundas, quartas e sextas são utilizadas por um grupo de capoeira; a área também é ponto de encontro para atividades com skates e patins; e recebemos ainda ensaios fotográficos diários no local. A população compreende que é um espaço de uso coletivo”, inicia a gestora.

Estação das Artes promove faixa programática Som na Praça, que ocupa a Praça da Estação
Legenda: Estação das Artes promove faixa programática Som na Praça, que ocupa a Praça da Estação
Foto: Thiago Matine / Divulgação

No tocante às programações ligadas ao equipamento, a Praça recebe atividades específicas que sejam “adequadas às possibilidades logísticas”. Entre elas, a Estação das Artes já realizou, ao longo dos dois primeiros anos de abertura, espetáculos de teatro e palhaçaria; ações do Abstrata - Festival Internacional de Videomapping; e o programa Som na Praça, que acolhe apresentações de cultura popular e música em diferentes ritmos.

A gestora ainda ressalta a Praça como “lugar de serviços”, ofertados à população em vulnerabilidade do território, citando o Projeto Acolher — iniciativa da Secretaria de Proteção Social, Justiça, Cidadania, Mulheres e Direitos Humanos (SPS) — e a Estação Móvel — que realiza ações com profissionais de Psicologia, Serviço Social, Enfermagem, Educação Física e Nutrição.

Hospital, chuva e logística

“São diversos os fatores que definem quais espaços da Estação das Artes vão abrigar as programações”, começa Uliana Lima. “A utilização da Praça da Estação é condicionada a questões como quadra chuvosa, que inviabiliza a realização de eventos externos pela necessidade de preservar o público, os artistas e os equipamentos; e também pela proximidade com o Hospital Santa Casa da Misericórdia de Fortaleza, o que nos exige atenção especial ao som”, elenca.

Outro fato central levado em consideração é a própria questão estrutural para receber apresentações, incluindo cobertura e presença de banheiros, por exemplo, o que já existe na Gare (parte interna da Estação das Artes).

Área interna da Estação das Artes, conhecida como Gare, possui estrutura logística que inclui banheiros e cobertura
Legenda: Área interna da Estação das Artes, conhecida como Gare, possui estrutura logística que inclui banheiros e cobertura
Foto: Thiago Matine / Divulgação

“Ao realizar programações dentro do Complexo Cultural, conseguimos otimizar os recursos públicos ao utilizar todo o aparato já existente, o que nos possibilita direcionar o orçamento para a manutenção de uma programação semanal diversa. Ao realizar eventos na Praça da Estação, é necessário espelhar tudo o que já existe na Gare, o que requer um investimento também financeiro”, explica a diretora.

Produção, segurança, infraestrutura, saúde, tecnologia, comunicação e serviços gerais são aspectos levados em conta para a construção logística de um evento. A experiência oferecida ao público precisa, por exemplo, ofertar um quantitativo específico de banheiros e ambulâncias, por exemplo, dependendo da quantidade de público.

“Estamos sempre atentos aos retornos do público para dialogar sobre os muitos usos possíveis deste espaço, mas é importante reforçar que é nosso dever otimizar um recurso que possa garantir um ano inteiro de programações gratuitas para toda a população”, argumenta Uliana.

Apesar das explicações, a gestora ressalta que a Estação se soma ao pensamento coletivo sobre o espaço da Praça. “A observação que fazemos dos usos possíveis de espaços é diária. Compreendemos este equipamento de forma múltipla e, junto com o público e a classe artística, descobrimos cotidianamente novas possibilidades”, sustenta.

“Ressaltamos que todos os projetos e movimentações são pensados coletivamente, em diálogo com a Prefeitura de Fortaleza, com os grupos artísticos aprovados em Edital, por exemplo, e ainda com outros equipamentos da Rede Pública de Espaços e Equipamentos Culturais do Estado do Ceará (Rece). A utilização da Praça da Estação é, portanto, um pacto que envolve diferentes atores, e garanti-la com responsabilidade e segurança é um dever de todos”
Uliana Lima
diretora da Estação das Artes

Praça e acesso

O discurso que pede uma melhor utilização da Praça da Estação por parte da Estação das Artes está diretamente ligado à demanda por maior abertura de acesso das programações do equipamento. Quando realizados na parte interna, os eventos têm limite de acesso do público.

O músico Mateus Farias, que se apresenta no aniversário da Estação no domingo (31) com o parceiro musical Marcelo di Holanda, percebe a demanda. “O que todo mundo pede é para shows grandes terem maior estrutura. Acho que se começasse a utilizar a praça em eventos maiores, isso seria uma uma grande melhoria, mas eu sei que existem várias questões para isso”, reconhece.

Popularmente conhecida como Praça da Estação, a Praça Castro Carreira fica entre as ruas General Sampaio, 24 de maio, Dr. João Moreira e Castro e Silva, no Centro de Fortaleza
Legenda: Popularmente conhecida como Praça da Estação, a Praça Castro Carreira fica entre as ruas General Sampaio, 24 de maio, Dr. João Moreira e Castro e Silva, no Centro de Fortaleza
Foto: Thiago Matine / Divulgação

Para os quatro dias de programação do aniversário de dois anos, a Estação ofereceu diferentes formas de acesso aos ingressos limitados. Para sexta e sábado, por exemplo, foram disponibilizados virtualmente, para cada dia, dois lotes de 750 ingressos cada. Outros 500 ingressos estarão disponíveis por ordem de chegada a partir da abertura dos portões em cada dia.

Nos primeiros meses de atuação da Estação das Artes, inclusive, o formato de acesso oficial do equipamento se dava a partir de distribuição de pulseirinhas na ocasião de cada evento realizado. Reclamações de lotação e desorganização das filas foram comuns à época.

Há nove meses, em junho de 2023, a Estação adotou outro protocolo de acesso, abrindo mão das pulseiras e efetivando a entrada sujeita à capacidade do espaço, com possibilidade de rotatividade de público. Pontualmente, há eventos com ingressos disponibilizados virtualmente.

“Pelas questões logísticas já enumeradas, fez-se necessário a adoção de diferentes metodologias para garantir o acesso seguro da população às programações dentro da Estação, como foi o caso das pulseiras, em um primeiro momento; e da retirada de ingressos pela plataforma Sympla ou da entrada por ordem de chegada, atualmente”, aponta Uliana.

A limitação de público, explica a gestora, se dá por diferentes motivos. “Por questões de segurança inerentes a qualquer evento com público, faz-se necessário limitar a quantidade de pessoas. Outra questão importante e que não pode ser desconsiderada é o fato de que atuamos em um bem tombado estadualmente e inscrito na lista de patrimônio do Iphan, o que por si só exige um cuidado dobrado”, aponta.

Espetáculos de diferentes linguagens já ocuparam o espaço da Praça da Estação dentro de programações da Estação das Artes; na foto, o grupo de Tradições Folclóricas Raízes Nordestinas
Legenda: Espetáculos de diferentes linguagens já ocuparam o espaço da Praça da Estação dentro de programações da Estação das Artes; na foto, o grupo de Tradições Folclóricas Raízes Nordestinas
Foto: Thiago Matine / Divulgação

A diretora reforça a atenção do equipamento a buscar melhorias e ajustes necessários. “É por estarmos sempre atentos aos feedbacks do público frequentador e querermos oferecer a melhor experiência para todos, que estamos diariamente revisando essas metodologias e incorporando novos modos de fazer”, explica.

“Trata-se de uma relação de aprimoramento constante, com resolução de umas questões e abertura de outras, especialmente em uma dinâmica que envolve a atuação de mais de um equipamento do Complexo Cultural. Mas, o balanço geral é positivo, visto que, em dois anos, mais de 200 mil pessoas já foram diretamente beneficiadas por atividades culturais gratuitas”, finaliza.

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