Livro resgata história da família Santana com reflexão sobre a importância dos álbuns fotográficos
Obra reúne fotografias feitas pelo engenheiro e político cearense Eudoro Santana nas décadas de 60 e 70; lançamento do livro será nesta quarta-feira (16), no Museu da Fotografia

Já nas primeiras páginas da publicação, a pergunta definitiva salta aos olhos: como guardar o tempo? Elaborado a partir de álbuns de família que datam dos anos 1960 e 1970, o fotolivro “Reter tudo ou Quanta maravilha do dia a dia que passou”, editado pelos irmãos Isabel Santana Terron e Tiago Santana, é uma resposta a esse questionamento, e busca ressaltar a importância das fotografias familiares como documentos que retratam, também, uma história coletiva.
A obra resgata, por meio de álbuns com fotografias feitas pelo político Eudoro Santana – pai de Isabel e Tiago e também do ministro Camilo Santana e da cineasta Andrea Santana –, presenças e ausências no contexto da ditadura militar.
No livro, há registros comuns da vida privada de Eudoro e da esposa, Ermengarda, a exemplo de imagens do casamento dos dois, do nascimento e do crescimento dos filhos, além de momentos descontraídos em família.
Mas há também espaços em branco, que representam, em parte, o impacto da brutalidade do regime ditatorial – em 1974, ano em que Isabel nasceu, Eudoro Santana ficou um mês desaparecido ao ser preso e torturado pelos militares.
Em entrevista ao Verso, o fotógrafo Tiago Santana destaca a importância de narrativas individuais e familiares para a construção da memória coletiva de um país e traça um paralelo da obra com “Ainda Estou Aqui”, livro de Marcelo Rubens Paiva adaptado para o cinema por Walter Salles.
“Nós sofremos muito na nossa família, exatamente nesse mesmo período. Por sorte, meu pai não desapareceu, mas ele foi preso, foi levado, ficou mais de um mês desaparecido, não sabíamos onde ele estava, mas por sorte ele voltou. Muitos não voltaram”, ressalta Tiago.
Na época em que Eudoro foi levado por policiais militares, a família morava no Cariri cearense e Ermengarda estava grávida de Isabel, a filha mais nova dos Santana. Junto a Tiago, a matriarca da família passou dias explorando a região de carro em busca do marido, que havia sumido sem deixar vestígios.
“Claro que não ia encontrar, era um certo desespero nesse sentido, mas eu me lembro muito bem disso”, pontua Tiago. “Esse livro resgata isso, sabe, essa memória coletiva desse tempo que foi a ditadura militar, ali no Cariri cearense, de uma família que atravessou esse tempo defendendo e lutando pela democracia”, completa.
A publicação também reconta, de certo modo, a trajetória de Tiago Santana com a fotografia. Hoje um fotógrafo renomado nacionalmente, o artista conta que começou a se interessar pelo assunto ao observar o pai, na época um fotógrafo amador, na adolescência.
“Meu pai tinha uma parceria com a minha mãe, onde ele fotografava e ela fazia a diagramação e preparava os textos dos álbuns, e a gente acabou reproduzindo isso, eu e minha irmã Isabel”, explica.
“É um livro caseiro, um livro afetivo, um livro que é um fotolivro – não é uma biografia, não tenta [ser] isso. É um livro que traz uma experimentação de tradução dessa narrativa contada a partir dos álbuns dessa família, nesse período”, detalha.
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Álbuns de fotografia como registro histórico
Além do resgate afetivo, o fotolivro de Isabel e Tiago Santana busca traçar reflexões sobre a importância dos álbuns de fotografia como documentos históricos, em um momento em que a forma de produzir, armazenar e se relacionar com imagens se tornou quase que 100% digital.
“Ele traz alguns conceitos importantes que é pensar ‘o que são os álbuns de fotografia hoje? Qual a permanência desses álbuns?’ e qual a importância deles na construção das narrativas sobre o tempo, sobre o passado, e para construirmos o futuro”, pontua Tiago.
Para o artista, apesar dos benefícios que a digitalização dos processos trouxe para diversas áreas, o digital “é muito mais volátil, muito mais perecível do que o analógico”. “Recuperar esses álbuns e entender essas narrativas através dos álbuns é uma coisa muito, muito importante na construção do pensamento do que foi o nosso País e do que [ele] será”, destaca.
O lançamento da publicação em Fortaleza será realizado no Museu da Fotografia, nesta quarta-feira (16), a partir das 18h30. Na ocasião, os editores Isabel Santana Terron e Tiago Santana irão conversar com o escritor Joca Reiners Terron, que assina o posfácio do livro.
Serviço
Lançamento do livro “Reter tudo ou Quanta maravilha do dia a dia que passou”
Quando: Quarta-feira, 16 de abril, a partir das 18h30
Onde: Museu da Fotografia de Fortaleza (rua Frederico Borges, 545 - Varjota)
Acesso gratuito