Espetáculo reflete desafios de ser atriz a partir das histórias de artistas cearenses
“Medalha de Ouro” terá duas sessões, neste sábado e domingo, no Teatro Dragão do Mar
Ana Marlene, Mazé Melo Figueiredo, Aline Silva, Ana Luiza Rios, Ângela Moura, Samia Bittencourt, Marta Aurélia, Marina Brito, Rita Cidade, Juliana Carvalho, Zizi Telécio. As onze atrizes cearenses listadas inspiram um processo de pesquisa da também atriz Sol Maufer que, neste fim de semana, tem como fruto o espetáculo “Medalha de Ouro”.
Em cartaz no Teatro do Dragão no sábado, 10, e domingo, 11, a obra mistura documental e ficcional para refletir sobre os inúmeros desafios — intrínsecos e estruturais — que vêm junto do ofício no Ceará. Com Sol e Larissa Góes em cena, a peça tem dramaturgia de Sara Síntique e direção de Andréia Pires.
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Pesquisa sobre ser atriz começou em 2012
Em entrevista ao Verso, Sol explica que a pesquisa debruçada no “ser atriz” começou em 2012, quando ela apresentava uma intervenção urbana trajando um vestido costurado com figurinos de cinco atrizes que a inspiraram a seguir a carreira.
Em 2016, a pesquisa se desenvolveu no mestrado, culminando em uma exposição em 2019. Já em 2023, Sol, junto de Larissa e Sara, entraram no Laboratório de Teatro do Porto Iracema das Artes com o projeto intitulado “Ao cansaço segue-se o sonho”, com tutoria de Daní Avila Smal.
Ao longo do processo de pesquisa, marcado por momentos de pausas, o número de atrizes foi crescendo, chegando às onze inicialmente citadas. Para a construção de “Medalha de Ouro”, o foco é em três delas.
“A gente não teve condição de colocar as histórias de cada atriz e escolheu três — Ana Marlene, Mazé Melo Figueiredo e Aline Silva —, porque as histórias delas acabam abraçando, passando, atravessando as histórias de todas as atrizes”, explica Sol
Dificuldades financeiras atrapalham ofício
São muitas as questões citadas pela atriz como empecilhos para o caminho. “A gente tem diversas dificuldades: de classe social, que tem a ver com aparência, ‘você não passou porque não tem o perfil’”, lista.
As possibilidades (ou impossibilidades) financeiras de manutenção de vida pela arte também são destacadas pela atriz. No processo de “Medalha de Ouro” no Porto Iracema, Sol, Larissa e Sara receberam uma bolsa, cada, no valor de R$ 1 mil. Os recursos, no entanto, não deram vazão total à concretização do espetáculo.
“A bolsa sustenta nosso transporte, alimentação, algum livro, e a gente tinha que se desdobrar para poder pagar as nossas contas. Era muito trabalho, muito puxado, então, pra levantar o espetáculo, a gente teve que colocar recurso próprio”, partilha.
“Por isso, muitos artistas acabam não conseguindo se expressar, exibir filmes, espetáculos, porque não conseguem colocar recurso próprio deles para poderem se manter artistas. Muitos artistas bons minam a potência de criação por falta de recurso financeiro, essa é a grande real”, atesta Sol.
Realização sem edital e com parcerias
O grupo que se somou para a concretização do espetáculo, além de Sol, Larissa, Sara e Andréia, conta ainda com figurino de Dionísio, trilha sonora de Pedro Madeira, video mapping de TI EGO e interlocução dramatúrgica de Henrique Fontes.
“A gente fez com muitas parcerias, de pessoas que acreditaram na proposta, conhecem e acreditam na gente, profissionais que acabaram cobrando um valor que a gente conseguiu pagar, mas a gente tá se devendo”, afirma Sol.
As apresentações do fim de semana no Dragão, feitas sem apoio de edital e com recursos próprios investidos, também depõem, como aponta a atriz, sobre questões estruturais da cultura local.
“Hoje, em Fortaleza, as possibilidades materiais de se viver de arte não existem. Cachês são muito baixos, editais também, se inscrever não quer dizer que você vai ser aprovado. O governo tinha que investir mais nisso”, defende.
É por isso, ela reforça, que artistas buscam outros trabalhos. “Muitos são professores, produtores como eu. Me sustento com meu trabalho de produção cultural”, afirma.
Entre avanços e entraves antigos
Entre as dificuldades, Sol também reconhece melhoras no cenário geral. “Quando comecei há 15 anos, não tinham tantos testes para filmes, hoje tem mais e isso é uma conquista”, avalia.
“A escola é um lugar muito importante, porque proporciona possibilidades para novos artistas, é uma escola de fato”, afirma, depois questionando: “Mas, daí para frente, o que acontece?”.
“A gente não tem um lugar onde possa, por exemplo, fazer temporada. Um espetáculo se mantém vivo quando se apresenta várias vezes”, ressalta a atriz. “Estamos estreando agora porque, se não, o espetáculo ia morrer. Essas duas apresentações não vão garantir que a gente vai pagar as contas e o investimento que fez”, pondera.
A despeito do acúmulo de desafios, a insistência em seguir na lida também chega forte para Sol. “Despontar na discussão como a gente precisa aceitar determinados trabalhos, passar por cima de certas coisas que não nos agradam, para não desistir da carreira, da profissão e para não deixar de sonhar”, segue.
O sonho surge no discurso da artista como espécie de “antídoto” contra as provações. “A maneira de não desistir é não deixar de sonhar. Mesmo diante do cansaço, das dificuldades, da vida, de ser mulher, (o trabalha fala sobre) como não desistir, não deixar de sonhar. Sonhar é um modo de não desistir”, reforça.
Espetáculo Medalha de Ouro
- Quando: sábado, 10, às 20 horas, e domingo, 11, às 19 horas
- Onde: Teatro Dragão do Mar (rua Dragão do Mar, 81 - Praia de Iracema)
- Quanto: R$ 40 (inteira) e R$ 20 (meia), à venda no Sympla (com taxas) e na bilheteria