Arquiteta requalifica casa no Centro de Juazeiro do Norte para estimular preservação de prédios históricos na cidade

Hévila Ribeiro também é criadora do projeto Memórias de Juazeiro, dedicado a registrar cultura, edificações e lugares do município onde nasceu, cresceu e pela qual sempre é apaixonada

Escrito por
Diego Barbosa diego.barbosa@svm.com.br
(Atualizado às 08:37)
Legenda: Hévila Ribeiro na fachada onde em breve será a Casa das Memórias: amor forte e consciente pela cultura histórica de Juazeiro do Norte
Foto: Wennyta Pinheiro

Pouco se fala sobre provas de amor dedicadas a cidades. Mas elas existem, são bonitas e poderosas. A declaração que Hévila Ribeiro faz todo dia a Juazeiro do Norte é lutar pela preservação do patrimônio histórico do município. E faz isso da forma mais corajosa possível: requalificando, ela mesma, uma casa da década de 1950 que luta para sobreviver em meio à crescente indiferença da população sobre a cultura arquitetônica do lugar.

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O trabalho deve ficar pronto até o fim deste ano e preservará boa parte das características originais da residência – da fachada aos ladrilhos hidráulicos. Localizado na Rua da Conceição, o imóvel, além de inspirar outras pessoas a fazer o mesmo, também é a materialização de algo maior: o Memórias de Juazeiro, projeto desenvolvido pela mesma Hévila cujo intuito é registrar cultura, edificações e lugares da terra do Padim Ciço. 

Não à toa, quando estiver concluída, a nova morada será chamada Casa das Memórias. “A ideia é que ela sirva como sede do ‘Memórias do Juazeiro’, pra que a gente consiga desenvolver atividades e coloque pra frente esse processo de revitalização do Centro da cidade e a importância das edificações históricas no nosso município”, conta a arquiteta.

Mas vamos do início. Tudo começou em 2019, resultado do Trabalho de Conclusão de Curso da juazeirense e da própria redescoberta dela como cidadã do local. Desde cedo, Hévila semeou no íntimo a vontade de ir embora de Juazeiro porque observava o mesmo comportamento nas gerações anteriores. Como se, para crescer profissionalmente, não fosse possível permanecer na cidade natal, mas migrar para Fortaleza, Recife ou capitais próximas.

Até que, mediante muito estudo, pesquisa e mergulho na história do território, a chave virou e ela abriu os olhos para o indispensável: jogar luz sobre o que está ao redor. “A gente é abençoado pela Chapada do Araripe, estamos imersos nesse caldeirão cultural que é a região do Cariri todos os dias. Foi a partir dessa descoberta de minhas raízes que o amor cresceu”.

Legenda: Excursão por pontos importantes de Juazeiro do Norte, a exemplo do Santuário dos Franciscanos, é uma das atividades promovidas por Hévila Ribeiro
Foto: Júnior Macedo

Se o pendor para blogueira estava com ela há tempos – chegou a iniciar uma plataforma com amigas na intenção de escrever sobre a cidade – a iniciativa de lançar um perfil nas redes sociais dedicado ao mesmo tema do TCC, sobre edificações históricas de Juazeiro, aflorou ainda mais a vocação. Mas nada de deslumbre ou requinte: a sina mesmo de Hévila era não conter em si o que sempre foi bandeira e força. Ela queria transbordar.

E segue até hoje assim. Com 61 mil seguidores até o fechamento deste texto, o Memórias de Juazeiro é um tesouro. Narrativas sobre mulheres empreendedoras, divulgação de eventos e documentários, narrativas sobre as casas históricas do Centro, bem como milhares de curiosidades sobre o mesmo chão que pisou Padre Cícero, estão na ordem do dia.

Em uma das publicações, é possível ler: “Avenida Dr. Floro, n 169. Pela primeira vez consegui fotografar essa edificação por completo. Acredito que seja a única casa que tenha as portas com arco conopial, uma raridade na nossa cidade. Também podemos ver alguns detalhes da platibanda que era linda e muito trabalhada”. 

Para Hélida, a chance é imperdível para que mais e mais pessoas – dentro e fora de Juazeiro – acessem essas raridades e percebam que não dá para passar pelas cidades sem saber o que faz delas especial. No caso de onde ela vem, o sublime está desde o fato de ser um interior que parece capital até a inclinação para o belo, o ancestral, a cultura.

Para Hélida, projeto Memórias do Juazeiro é chance para que pessoas acessem o belo que está ao redor
Legenda: Para Hélida, projeto Memórias do Juazeiro é chance para que pessoas acessem o belo que está ao redor
Foto: Divulgação

Se não for bem preservado, o centro histórico da cidade pouco refletirá essas pérolas que ainda resistem na paisagem, embora com muito custo: competem com prédios, comércios e estacionamentos. Podem ser demolidas a qualquer momento. Desaparecer.

“Entre todas as edificações que cataloguei – próximo a mil – mais de 60% já estava descaracterizada, sendo que a área contemplada corresponde justamente à época em que o Padre Cícero viveu no Juazeiro. Pra mim, o ‘Memórias do Juazeiro’ é uma forma de deixar isso vivo”.

Então, se você vir alguém com câmera na mão, acompanhando dezenas de pessoas pelo Centro juazeirense, pode chegar junto: é Hévila esticando o amor pela cidade, segurando na mão o coração de um local. Se vir o movimento de gente em prol de patrimônios imensos em cultura, repletos de arte e história, é também ela não deixando que isso se perca.

Legenda: "O amor é também se identificar com as próprias raízes, e isso tem tudo a ver com o lugar onde a gente mora”
Foto: Jaque Rodrigues

E se vir uma casa em que o afeto impera e onde tudo se move para que ele cresça ainda mais, pode aguardar: muito em breve, as portas serão abertas e a conscientização fará parte da rotina. “O amor poderia ser sinônimo de lar, de casa. É lugar onde você se sente bem, onde pode ser você mesmo, onde você sabe onde está. É também se identificar com as próprias raízes, e isso tem tudo a ver com o lugar onde a gente mora”. 

O amor, no fim, é cidade, tal qual escreveu Antonio Cicero: “Você me abre seus braços e a gente faz um país”. Tal qual fala Hévila Ribeiro quando diz: “Onde a gente está molda quem a gente é”.

 

Esta é a história de amor de Hévila Ribeiro por Juazeiro do Norte e as edificações históricas da cidade. Envie a sua também para diego.barbosa@svm.com.br. Qualquer que seja a história e o amor

 
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