Robô evita que mais de 180 toneladas de lixo da rede de drenagem de Fortaleza cheguem ao mar
Mapeamento subterrâneo permite limpeza de canais e deve evitar alagamentos em épocas de chuva, além de diminuir poluição de praias
Pluvi é um pequeno robô de 20 kg, feito de aço inox, fabricado em Goiânia com um motor importado da França. Semelhante a um veículo de exploração espacial, tem quatro rodas como patas e câmeras como olhos, que funcionam para “caçar” pontos bloqueados na rede de escoamento da água da chuva de Fortaleza.
Desde março até o início de dezembro, mais de 182 toneladas de lixo foram removidas das tubulações das chamadas galerias pluviais com a ajuda do aparelho. O que começou com 600 kg retirados nos meses de março e abril, cada, chegou ao recorde de 42 toneladas, em setembro.
Esta é a segunda reportagem da série do Diário do Nordeste com ações que mudam o destino do lixo para reduzir os impactos ambientais e gerar valor com base em recursos tecnológicos.
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A cada viagem, o equipamento pode percorrer até 100 metros. As imagens do trajeto são transmitidas e checadas ao vivo por uma equipe de operadores na rua, por meio de um pequeno monitor. Eles têm apoio de uma câmera superzoom capaz de enxergar 80 metros à frente, para prever se Pluvi terá obstáculos no caminho.
“Já encontramos pedaços de sofá, restos de cama, pneu”, enumera Samuel Alves, técnico de inspeção do equipamento. “A gente se pergunta como isso tudo entrou numa abertura de 60 cm”.
Contudo, segundo o encarregado, a maioria do material encontrado é plástico, normalmente arrastado pelo vento até as galerias. Junto com a areia, é o principal responsável pelo bloqueio das tubulações, principalmente nas curvas. “Já tiramos uma caminhonete de lixo de um ponto só”, lembra.
Essa tecnologia também é utilizada em cidades como Vitória (ES), Agudos (SP), Porto Alegre (RS) e Maceió (AL). Em Fortaleza, o projeto de Vídeo Inspeção de Galerias Pluviais é coordenado pela Secretaria Municipal de Urbanismo e Meio Ambiente (Seuma), com financiamento do Banco Mundial.
O principal objetivo é detectar obstruções para evitar que o lixo acumulado vá para a orla e prejudique a balneabilidade das praias. Por isso, as atividades estão focadas na Bacia da Vertente Marítima, faixa localizada ao longo do litoral, entre os Rios Cocó e Ceará.
As galerias pluviais têm caminhos que desembocam em rios e mares. Se estiverem sujas, é natural que, quando chova, essa água escorra e gere prejuízo para drenagem. Fortaleza tinha pontos de alagamento históricos, mas hoje não temos mais tão fortes
A secretária define o contrato como “ambicioso”. Inicialmente, estava previsto o mapeamento de 125 km de galerias, mas, como o ritmo está “rápido”, deve-se ultrapassar os 150 km até 2025. Até o momento, 51 km já foram percorridos por Pluvi.
“A tendência é que, terminado esse contrato, a gente parta para expansão para outras áreas da cidade”, considera Lobo.
Minimização dos custos
O gerente de operação da empresa NorBrasil, Nilo Massone, aponta as vantagens do uso do robô. A principal delas é a precisão de localização de avarias. Assim, não é preciso quebrar todo o calçamento de uma rua e abrir grandes buracos para encontrar o motivo do problema de algum extravasamento.
“Quando você não tem uma tecnologia assim, só conhece os problemas quando chega na necessidade de correção. O robô ajuda a dar manutenção preventiva e minimizar o custo da operação da rede”, explica.
Segundo ele, embora o foco do robô seja a despoluição, as imagens e relatórios gerados por software permitem identificar problemas na tubulação, já que algumas delas chegam a ter cerca de 80 anos de uso.
“Lançamos tudo isso num mapa e, dentro dele, sabemos a posição da rede na rua e das avarias. Você acaba fazendo um trabalho de projeto de manutenção. Quando filma, o robô consegue detectar até o nível da água que passa pela tubulação, aí a gente sabe se ela está saturada, se precisa de duplicação”, exemplifica.
Luana Siewert Pretto, presidente do Instituto Trata Brasil considera “eficiente” esse tipo de análise porque, na leitura dela, “hoje o saneamento básico precisa contar com a tecnologia para avançar, seja pela videofilmagem ou pela instalação de sensores de vazão ou de pressão nas redes de água e esgoto”.
Esse é um trabalho preventivo que evita, muitas vezes, que seja feito algo corretivo, ou seja, quando ocorre o entupimento total da rede e faz-se necessária uma ação de emergência de troca dessa tubulação. Acaba sendo muito mais viável do ponto de vista econômico
Depois do trabalho em campo, Pluvi precisa passar por manutenção, tendo as engrenagens abertas e limpas. Se chegar a cair dentro da água - naturalmente salgada por causa da maresia -, a limpeza tem de ser imediata. O sistema de software também é atualizado com frequência para implementar melhorias na execução.
Ações complementares
Segundo a secretária Luciana Lobo, a video inspeção de Pluvi está dentro do programa Fortaleza Cidade Sustentável (FCS), que visa a melhorar as redes naturais da Capital cearense, sendo “irmão” da ação Se Liga na Rede.
De forma complementar, 2,5 mil residências no Grande Pirambu, Cristo Redentor, Jacarecanga e adjacências devem ser ligadas à rede de esgoto, para evitar lançamentos irregulares nas galerias pluviais. Até o momento, quase 2 mil já foram contempladas.
“Cada um real gasto em saneamento economiza seis em saúde. Só esse número dá uma posição da transversalidade desses gastos. Além disso, temos a dignidade de a pessoa se sentir morando num local apto”, entende.
Além disso, segundo o técnico de obras Nilo Massone, o mapeamento da rede deve facilitar a manutenção preventiva e minimizar o custo de uma rede nova para várias frentes de serviços da Prefeitura.
Educação ambiental
O desafio do projeto em Fortaleza é justamente torná-lo uma política pública permanente, na visão de Nilo. “O ideal é que o sistema permaneça limpo, principalmente nos pontos críticos, porque a base não é mais no achismo, é na certeza das avarias”, sugere.
“Às vezes a rede é limpa, nova, tá perfeita, mas a população não ajuda. Vem a enchente e revela tudo”, complementa o técnico Samuel Alves. “Tem pontos que a gente limpa e permanecem conservados. Em outros, quando a gente volta, começou a juntar de novo”.
Dentro do FCS, a Seuma também desenvolve o Plano de Educação Ambiental e Sanitária (Peas), cujo propósito é educar a população da Bacia da Vertente Marítima e do entorno do Parque Rachel de Queiroz para diminuir a geração de lixo e melhorar o manejo e descarte adequado de resíduos nessas regiões.
“O avanço do saneamento e a correta gestão têm que estar associados ao uso da tecnologia. Quando bem realizado, esse tipo de mapeamento, de uma maneira técnica, competente e bem executada, evita problemas futuros e traz informações muito relevantes para a gestão”, reforça Luana Siewert, do Trata Brasil.