Arte e Cultura no combate à LGBTIfobia

Para além da arte drag ou transformista, as populações LGBTI+ cearenses têm lançado mão também sobre diversas linguagens artísticas e culturais

Legenda: A efervescência cultural LGBTI+ demanda cada vez mais a ocupação dos espaços e da agenda pública
Foto: Pexels

Perdemos Noélio Mendes há menos de dois meses, um dos maiores talentos da arte transformista cearense. Com o grupo Metamorfose, as performances de Noélio emocionaram e ajudaram a construir espaços de sociabilidade e fruição artística demarcadamente dissidente nos anos 1980 em Fortaleza, ainda no processo de abertura democrática brasileira. Ao lembrar disso, me ocorre o quão potente é a criatividade e o fazer cultural e artístico de pessoas Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexo para o combate às violências LGBTIfóbicas. 

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Infelizmente, Noélio não conseguiu ver o primeiro Dia Estadual da Arte Transformista (29 de junho), que passou a integrar recentemente o calendário oficial de eventos e datas comemorativas do Estado do Ceará a partir da Lei N° 19.009/2024, de autoria da Deputada Lia Gomes (PDT).  A data visa celebrar a arte transformista, reconhecendo a sua importância como manifestação artística e como vetor da economia da cultura, considerando o seu impacto em uma cadeira produtiva que gera emprego e renda para profissionais da moda, da maquiagem, para as casas de shows, músicos, dentre outros setores.

Para além da arte drag ou transformista, as populações LGBTI+ cearenses têm lançado mão também sobre diversas linguagens artísticas e culturais que, ao oportunizarem a expressão de seus modos de vida e subjetividades, acabam por pautar a valorização da diversidade e a constituir trincheiras criativas de combate ao preconceito e à discriminação. É o caso das Paradas pela Diversidade Sexual do Ceará, realizadas pelo Grupo de Resistência Asa Branca – GRAB em parceria com dezenas de organizações; dos eventos multilinguagens como o Festival For Rainbow e o Transcholagi; das dezenas de concursos Miss Gay realizadas nos bairros de Fortaleza e nos municípios do interior do Ceará; da música de Luiza Nobel e Mumutante; do teatro de Silvero Pereira; da emergente cena ballroom nas periferias, dentre tantas outras manifestações.

A efervescência cultural LGBTI+ demanda cada vez mais a ocupação dos espaços e da agenda pública. Nesse sentido, é pertinente citar que estão em curso algumas iniciativas importantes no campo do executivo estadual,  a exemplo do edital específico de fomento à Arte e Cultura LGBTI+ da Secretaria da Cultura do Ceará. Lançado desde 2016, o edital chega à sua quarta edição em 2024, prevendo o aporte de até 1 milhão de reais a serem distribuídos entre 20 projetos selecionados.

É nítido que precisamos da arte para viver e de uma cultura que dê significado à vida. Ao defender a necessidade de valorização da arte e da cultura protagonizada por LGBTI+, chamo a atenção para o fato de que tais expressões ultrapassam o mérito estético, as barreiras de cada linguagem e se tornam politicamente relevantes em tempos de avanço do conservadorismo no Brasil e no mundo. Ora, se produz arte e cultura da margem sem desafiar o centro do poder, a heteronormatividade compulsória, sem mirar para a realidade presente, sem modificá-la ou sem sonhar?

Dedico esse artigo a Noélio Mendes e a tantos aos artistas, sonhadores e fazedores de cultura LGBTI+ que seguem vivos na nossa memória,  contribuindo através da arte com uma sociedade de mais respeito às diferenças.

*Esse texto reproduz, exclusivamente, a opinião da autora. 

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