O que é o pré-teste do Enem? Entenda etapa citada por cearense que 'previu' questões
Edcley Teixeira, estudante de Medicina de Sobral, diz ter memorizado questões em etapa prévia ao exame.
A anulação de três questões do Enem 2025, anunciada pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) em meio a suspeitas de vazamento por um cursinho de pré-vestibular no Ceará, levou a uma série de questionamentos sobre a formulação do exame, incluindo a fase de pré-testes.
O assunto, assim como os debates sobre a segurança do Enem, ressurgiu após o estudante de Medicina de Sobral, Edcley Teixeira, afirmar ter feito "previsões" das questões aplicadas na prova, publicando, inclusive, nas redes sociais capturas de tela com questões idênticas às vistas no Enem 2025.
Mas, afinal de contas, do que se trata o pré-teste do Enem?
Segundo o próprio Inep, que explica a etapa no Guia do Participante, ele consiste em uma "aplicação de um conjunto de itens" destinados a uma amostra de alunos com "características semelhantes às da população para a qual a prova se destina".
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O trecho está em guia divulgado em 2021 que explica todo o processo de desenvolvimento das questões que podem integrar o exame.
A primeira etapa, por exemplo, inclui a elaboração das questões por "professores credenciados em chamadas públicas ou instituições de educação superior credenciadas". Elas podem ser, já na fase seguinte, incluídas no Banco Nacional de Itens (BNI).
Esse BNI é um sistema, gerenciado pelo Inep, com banco de dados capaz de armazenar itens de prova de "forma segura", resultando, posteriormente, na inclusão deles em provas como o Exame Nacional do Ensino Médio.
O que são os pré-testes do Enem?
Antes das questões serem, de fato, incluídas em edições do Enem, entretanto, elas são testadas, sendo aplicadas para uma amostra de estudantes com perfil semelhante ao dos que realizam a prova.
É exatamente esse ponto que o Inep classifica como um "pré-teste", citado como "uma forma empírica de avaliar a qualidade técnico-pedagógica e psicométrica dos itens".
Para o instituto, essa fase é importante para aumentar a precisão da prova, destinando a ela a responsabilidade das análises "estatísticas e pedagógicas" capazes de avaliar níveis de dificuldade dos itens e até as possibilidades de acerto ao acaso.
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Esse pré-teste também inclui uma fase seguinte, em que são conduzidas investigações profundas. "Depois dessas análises, as questões que atendem aos critérios ficam disponíveis para a montagem das provas, e as demais questões são descartadas ou encaminhadas para reformulação", discorre o Guia do Participante do Enem.
Como são aplicados os pré-testes do Enem?
O Guia do Participante do Inep não deixa clara qual a metodologia de pré-teste aplicada atualmente. A informação que se tem, até então, é que avaliações usadas como pré-testes alimentam diretamente o Banco Nacional de Itens (BNI).
Edcley Teixeira, no entanto, disse ter "previsto" as questões do Enem após ter participado do Prêmio Capes Talento Universitário, que, segundo ele, já seria uma prova conhecida por incluir questões a serem calibradas para o exame nacional. O estudante ainda diz ter desenvolvido um método capaz de prever questões para outras edições.
O Inep não confirmou que as questões do prêmio foram usadas como teste para o Enem.
O público do pré-teste
Para o professor em Estatística da Universidade Federal do Ceará (UFC), André Jalles Monteiro, o público utilizado nas testagens dos itens para o Enem — fase também chamada de "calibragem" — é um ponto importante a ser considerado.
"Até algum tempo atrás, não era feito pré-teste com estudantes do Ensino Médio. Se fazia o pré-teste com alunos recém-aprovados, que acabaram de terminar o ensino médio. Portanto, seriam alunos perfeitos, porque eles não participariam do Enem outra vez", explicou em entrevista ao Diário do Nordeste.
O comportamento dos estudantes teria mudado essa ideia. "Só que muitos estudantes fazem o Enem uma segunda vez. Um percentual razoável de estudantes terminam o ensino fundamental e fazem isso. Daí é muito fácil um estudante ler uma questão, achar ela interessante e, de certa forma, gravar na memória", opina.
André explica nunca ter participado do processo de elaboração de itens para o Enem e ressalta, destacando acreditar no processo confidencial desse passo, que pessoas com acesso aos pré-testes devem saber da possibilidade dessas questões serem abordadas no exame.
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Também ouvido pela reportagem, o professor de matemática Samyo Praciano comenta exatamente a suposta aplicação desse pré-teste entre universitários: "O próprio MEC diz que no processo do pré-teste é escolhida uma população parecida com a que fará o Enem, mas o aluno universitário não é uma população parecida, ela já passou por esse processo", questiona.
Focado no Exame Nacional do Ensino Médio desde 2020, o professor acredita na defasagem do BNI, já que provas recentes trouxeram questões de outras edições.
"A gente sente, como profissional da educação, por exemplo, que o banco está escasso. Em 2023, chegou ao ponto de repetir uma mesma questão de 2010, que até acabou anulada. Isso não deveria acontecer. Deveriam ser inéditas, até para não trazer a obviedade ou algo já visto em outros vestibulares", defende o docente.
Protocolo de segurança dos pré-testes
Ainda na tarde de terça-feira (18), o ministro da Educação Camilo Santana contou ter acionado a Polícia Federal para investigar suposto vazamento das questões por meio de Edcley Teixeira.
Segundo Camilo, "pessoas que fazem o pré-teste não podem" divulgar o conteúdo por questões de confidencialidade. Entretanto, apontou logo em seguida, quem passa por essa testagem não sabe que está sendo incluído em um pré-teste de itens.
O Diário do Nordeste questionou o Inep, ainda na manhã desta quarta-feira (19), se há, de fato, algum termo de confidencialidade assinado por quem participa da etapa de testagens. Até o fechamento desta matéria, o posicionamento do instituto não havia sido enviado.
Acusado de ter vazado questões do exame, Edcley se pronunciou, por meio de advogados, sobre o caso. Em nota, a defesa do estudante apontou que "confia plenamente nas instituições e na Justiça, acreditando que a apuração dos fatos confirmará a inexistência de qualquer ato ilícito por parte de Edcley de Souza Teixeira".