Como as narrativas e expectativas sobre Juliana Marins na Indonésia te afetaram?

Tomamos a história como uma espécie de enredo da vida real e passamos dias esperando os próximos capítulos

Escrito por
Dahiana Araújo dahiana.araujo@svm.com.br
(Atualizado às 14:47)
Legenda: Muitos de nós vibramos para que Juliana fosse encontrada bem, com vida. Abraçasse sua família e voltasse segura para casa, o que me lembra em como outros temas também inquietaram nossas emoções
Foto: Reprodução/Instagram

É junho de 2025 e peguei-me refletindo sobre o clichê “mito da imparcialidade” no jornalismo, que vez ou outra ressurge, mesmo que velado , principalmente dentro das redações de jornais, mas também em rodas de conversa entre profissionais. A morte da publicitária Juliana Marins, brasileira que caiu durante uma trilha no vulcão Rinjani, na ilha de Lombok, na Indonésia, foi o que acendeu em mim as divagações sobre esse tema. Algumas histórias nos afetam em muitos sentidos. 

Ao chegar na redação, a informação de que Juliana, após 4 dias da queda, foi encontrada sem vida trouxe junto alguns lamentos, questionamentos, reflexões. À correria do ofício da equipe responsável por reportar a notícia, com agilidade e cuidado, juntou-se um certo pesar de alguns dos jornalistas no entorno. ‘Que triste!’, ouviu-se entre as bancadas de computadores. 

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Ainda reflexiva sobre o tema, lembrei-me de que, certa vez, escutei de uma amiga jornalista que, em muitos momentos, a potência da nossa subjetividade no jornalismo tem a ver também com honestidade. Quando falo sobre a imparcialidade como um mito é justamente porque nós, jornalistas, somos inúmeras vezes questionados sobre nossas opiniões - quando as expressamos e quando não. Nem sempre é cabível…

De fato, muitos de nós não sabemos ao certo quem foi Juliana, seus sonhos, anseios, trajetória. Mas ao longo dos últimos dias, vários de nós, cidadãos, em meio às tarefas da rotina, torcemos para que a turista brasileira fosse encontrada bem, com vida. Nos perguntamos sobre como a família estava se sentindo, quais os receios, os medos, as angústias. 

Também nos perguntamos sobre como estaria Juliana. Sozinha, com fome, com frio, com medo. Julgamentos, de fato, sempre aparecem, dentro e fora da redação, mas aqui não é o caso. O fato é que, sim, lamentamos muito a morte da brasileira - assim como a sequência de angústias de sua família. A peleja pela retirada do corpo. O luto que seguirá vivo.

Muitas outras histórias e realidades mexem conosco. Dores, perdas, lutos, assim como alegrias, conquistas e superações nos levantam sensações, reflexões, diálogos e questionamos. Vibramos com algumas histórias de vida e também lamentamos profundamente feminicídios, fomes, guerras. 

Sobre o caso de Juliana, por que essa história gerou tanta comoção? Como nos afetou? Quem tem todas as respostas? Daqui, deste lugar de fala, de quem já cobriu história de amor e dor, sinto que mexe conosco - sendo ou não jornalistas -  justamente porque a queda, espera e morte da brasileira virou uma expectativa sobre vida real. Uma espécie de narrativa, com muitas outras sensações e sentimentos funcionando como suspense, nos deixando à espera de um “final feliz”. 

Juliana Marins, sorrindo sentada em uma grade, em meio a uma paisagem aberta de campo verde e céu azul
Legenda: Juliana Marins morreu após cair de trilha no vulcão Rinjani, na ilha de Lombok, Indonésia

Diante de expectativas também nos é saudável refletir, questionar. Humanidade é (também) sentimentos. Muitos de nós vibramos para que Juliana fosse encontrada bem, com vida. Abraçasse sua família e voltasse segura para casa, o que me lembra em como outros temas também inquietaram nossas emoções. Lamentamos a morte do Papa Francisco, de Glória Maria; o início de guerras, lacrimejamos forte durante apurações de ataque em escolas. 

Houve choro e silêncio durante os árduos anos da pandemia de COVID-19 e também a cobertura da queda do Edifício Andréa. Mas eu também vibrei: com a medalha de Rebeca Andrade nas Olimpíadas, a vinda da vacina contra a COVID - impossível não se emocionar -, com a chegada de comida pra quem tinha fome e de cura pra quem chorou a dor da enfermidade. 

Temos opinião e isso é legítimo. Saravá. As coisas doem em nós, nos causam revolta, nos acalmam, nos impressionam, trazem gargalhadas. E às vezes, com a correria, a gente leva as inquietações pra casa, pro travesseiro, pra o que nos rodeia. Estamos vivos, pulsamos. No entanto, para além disso, as nossas sensações são ainda mais preciosas quando pensamos sobre elas. Ser imparcial sempre será um mito, ainda mais quando a narrativa é sobre a vida real - ou o seu fim.