Entenda como e por quem é custeado o serviço de ônibus de Fortaleza
Contrato do Município com atual formato de transporte segue até 2027
A recente suspensão de linhas do transporte público de Fortaleza trouxe de volta a discussão sobre quem tem sustentado esse sistema. Com custo milionário, os ônibus não são bancados apenas pelos passageiros – mas a redução da demanda está no centro da crise.
As tarifas inteiras (R$ 4,50) e meias (R$ 1,50) pagas pelos usuários são uma das receitas que chegam às empresas de transporte. O funcionamento é custeado ainda por subsídio da Prefeitura de Fortaleza, de R$ 14,5 milhões mensais em 2025, e por apoio do Governo do Ceará.
A participação do Estado nesse custeio, porém, não ocorre mais por repasse direto, e sim por meio de três iniciativas:
- Isenção do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) do diesel, que representa R$ 20 milhões anuais em “auxílio” às empresas de ônibus;
- Isenção do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) da frota de ônibus, que representa R$ 4 milhões anuais; e
- Incentivo de R$ 2 milhões para Bilhete Único Metropolitano.
Durante a pandemia de Covid, em 2021, a Prefeitura de Fortaleza e o Governo do Estado firmaram acordo para, em ação compartilhada, conceder R$ 16 milhões (cada ente) ao serviço de transporte regular de passageiros, um aporte de R$ 32 milhões às empresas para não haver aumento da passagem.
Em 2022, o subsídio do Estado e do Município subiu para R$ 72 milhões ao ano – mas em 2023 a tarifa sofreu reajuste. O então prefeito José Sarto justificou, em março de 2023, que o repasse estadual havia cessado, e que, por isso, o Município ampliaria o subsídio para R$ 90 milhões ao ano.
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Para 2024, foi aprovado pela Câmara Municipal de Fortaleza um subsídio municipal de R$ 140 milhões para o sistema. Em novembro, contudo, foi sancionado um valor de R$ 248 milhões para o exercício de 2025, considerado pelo prefeito seguinte, Evandro Leitão, como "insustentável".
Neste ano, por fim, o subsídio do Município às empresas de ônibus que prestam o serviço de transporte público regular na capital é de R$ 174 milhões, R$ 14,5 milhões ao mês.
Com a acentuação da crise, a gestão municipal repassou mais R$ 5 milhões às empresas, metade em agosto e a outra em setembro, como afirmou Evandro Leitão em entrevista nessa terça-feira (30). Segundo ele, o Município foi “ajudado” pelo Governo do Estado.
O prefeito contextualiza que os subsídios surgiram justamente na pandemia, quando 1 milhão de passageiros, em média, utilizavam o transporte público mensalmente. Hoje, são menos de 515 mil.
“Foram criados os subsídios justamente para compensar uma demanda que estava reduzindo cada vez mais. Não só em Fortaleza, mas em várias capitais do Brasil. Passou a pandemia, o subsídio permaneceu”, pontua Evandro.
Tarifa ‘ideal’ e desafios financeiros
Para abarcar todos os custos do sistema sem repasse financeiro do poder público, a passagem de ônibus de Fortaleza deveria custar R$ 7,27, conforme estudo da Empresa de Transporte Urbano de Fortaleza (Etufor) feito em novembro de 2024.
O valor é da chamada “tarifa técnica”, que considera “os preços dos insumos fundamentais para a manutenção do transporte com os custos fixos para a oferta do serviço”. Entre esses custos, estão preços de combustível, preço médio de um veículo novo, e salários de motoristas, fiscais e pessoal de manutenção.
A questão é que, para o Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros (Sindiônibus), o subsídio municipal não tem sido suficiente para bancar a operação e compensar a redução de passageiros e o congelamento da tarifa.
George Dantas, presidente da Etufor, reconhece que “menos de 10% dos usuários de transporte coletivo hoje pagam a passagem inteira”, e que o orçamento das prefeituras “não estava acostumado” com esse custo”.
Segundo ele, a gestão estuda mudar a forma de contratação do serviço e estabelecer um valor não mais por passageiro transportado, mas por quilômetro rodado. “Na prática, isso joga luz no custo do transporte, gera transparência ao sistema”, destaca, reconhecendo que o aumento da tarifa “é discussão sensível”.
“Entendemos que o que se investe no transporte coletivo é um grande programa de transferência de renda pra população, porque é pra qualidade de vida das pessoas”, finaliza.
Especialistas em transporte público de todo o Brasil alertam que o atual modelo de financiamento do sistema não é mais sustentável, e é agravado pelo “efeito dominó” da fuga de passageiros dos ônibus, como abordado em reportagem do Diário do Nordeste em agosto deste ano.
Contrato encerra em 2027
O atual contrato da Prefeitura de Fortaleza que concede às empresas de ônibus o direito de explorar e prestar o serviço de transporte coletivo urbano foi firmado em maio de 2012, com validade de 15 anos. Há possibilidade de renovação por igual período.
O modelo de remuneração proposto na licitação, à época tocada pela Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano e Infraestrutura (Seinf), era por “arrecadação tarifária e subsídios legalmente instituídos”. Naquele ano, a passagem inteira custava R$ 2,00.
A licitação dividia a cidade em 5 áreas, e cada uma seria atendida por um consórcio (grupo de empresas de ônibus), que deveria pagar à Prefeitura para ter o direito exclusivo de prestar o serviço:
- Consórcio Leste (Área 1 – R$ 4.088.000): Viação Urbana LTDA e Auto Viação Fortaleza LTDA.
- Consórcio Antônio Bezerra (Área 2 – R$ 4.115.000): Vega S/A Transporte Urbano, Santa Cecilia Transportes LTDA, Empresa de Transporte Santa Maria LTDA e Transportes Urbano Aliança S/A.
- Consórcio Expresso 05 (Área 3 – R$ 4.095.000): Auto Viação São José LTDA, Terra Luz Transporte S/A, Cearense Transporte Urbano LTDA, Viação Siará Grande LTDA e Fretecar Transporte Urbano e Metropolitano LTDA.
- Consórcio Parangaba (Área 4 – R$ 4.132.000): Auto Viação Dragão Do Mar LTDA, Auto Viação São José LTDA e Maraponga Transportes LTDA.
- Consórcio Messejana (Área 5 – R$ 4.150.000): Auto Viação Fortaleza LTDA, Rota Expressa S/A – Transporte de Passageiros, Auto Viação Dragão Do Mar LTDA e Vega S/A Transporte Urbano.
A soma dos pagamentos foi de R$ 20,58 milhões.