Embora de reconhecida importância para o desenvolvimento humano e social, as escolas passaram por grandes obstáculos durante a pandemia da Covid-19, tanto pelo distanciamento presencial quanto pela adesão a novas tecnologias, e precisaram reorganizar processos e atividades. Porém, nem todas conseguiram continuar funcionando.
De acordo com o Censo Escolar da Educação Básica, principal ferramenta de monitoramento educacional do País, pelo menos 162 estabelecimentos de ensino deixaram de funcionar no Ceará entre 2019, ano pré-pandêmico, e 2021, que tem o levantamento mais recente. A retração atingiu principalmente escolas particulares.
Em 2019, o Estado tinha 7.519 escolas ativas, das quais 1.603 eram privadas. Dois anos depois, foram registrados 7.357 estabelecimentos de ensino, com 1.503 particulares - 100 a menos. O segundo grupo mais atingido foi o das escolas municipais de áreas rurais, com 83 unidades a menos, passando de 2.532 para 2.449.
Complementando o fenômeno, o Ceará também vivenciou redução importante de matrículas na rede de ensino particular em paralelo ao incremento na rede pública, especialmente nas municipais, que ofertam vagas da Educação Infantil aos anos finais do Ensino Fundamental.
De acordo com o levantamento, em 2019, as escolas privadas tiveram um total de 417 mil matrículas, incluindo alunos do Ensino Infantil ao Médio; já em 2021, foram 340 mil. Por outro lado, as unidades da rede pública receberam 1.783.492 matrículas, contra 1.744.807 do penúltimo ano.
Todos os anos, as informações do Censo são coletadas junto às secretarias municipais e estaduais de educação, bem como às escolas privadas, e repassadas ao Governo Federal.
Recessão econômica
Os dados do Censo mostram o quarto levantamento consecutivo de redução de escolas em atividade no Estado. Entre 2017 e 2018, foram 165 a menos. Entre 2018 e 2019, houve diminuição recorde de 183 unidades. Os números caíram para menos 69 entre 2019 e 2020, e voltaram a ser ainda mais negativos entre 2020 e 2021, com menos 93.
Solonildo Almeida, doutor em Educação e professor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE), atribui o fechamento de algumas unidades escolares particulares à perda de renda provocada pela pandemia, tornando insustentável a manutenção de matrículas, e a oferta do tempo integral na rede pública, que tem se tornado “mais atrativa para para os pais e de certa medida para os estudantes”
“Com o aumento do tempo de permanência na escola, com duas jornadas, dois turnos como manhã e tarde, inclusive com suporte de material didático pedagógico e alimentação, existe a expectativa de melhora do ensino público”, percebe.
Desafios para as escolas
Contudo, o especialista pondera que só o aumento do tempo de permanência na escola não é garantia de um aumento da qualidade do sistema. Por isso, as estratégias de aproveitamento desse tempo precisam ser muito bem trabalhadas pedagogicamente para garantir a qualidade de vida dos estudantes nos seus aspectos sociais e de saúde.
Porém, com o retorno presencial no início deste ano, o professor defende que a prioridade das redes de ensino, tanto públicas quanto privadas, deve ser o acolhimento dos estudantes a partir da noção de que não houve a universalização do acesso às tecnologias digitais de suporte.
Essa geração que foi privada do ensino presencial, se por um lado teve a intensificação do acesso a informações, por outro teve o distanciamento da presença física dos professores. Isso tem gerado um novo tipo de estudante, com maior autonomia de aquisição de informações.
Para Solonildo, o processo educativo pode ocorrer em diferentes esferas, mas em nenhuma delas se pode considerar a substituição total “da potência da relação de seres humanos no mesmo espaço físico”.
O papel do professor
O fechamento das escolas foi uma solução acertada em prol da saúde coletiva, na leitura do professor, mas ele destaca que elas permaneceram “abertas” mesmo durante as teleaulas síncronas ou assíncronas. Agora, com as portas reabertas, “essa escola precisa mudar seus paradigmas em relação a qualquer outro modelo já vivenciado pela humanidade”.
Um dos principais agentes dessas mudanças devem ser os próprios educadores, cujo papel já vem sendo reposicionado desde o fim dos anos 1990 com a introdução das novas tecnologias da informação e comunicação (NTIC). Porém, nesses últimos dois anos, houve o uso massivo tanto pelos discentes quanto docentes de recursos como tablets, smartphones e computadores.
“De tal maneira, o papel do professor como organizador do conhecimento substituiu aquela ideia equivocada do professor como detentor exclusivo do conhecimento”, acredita Solonildo.
Mais investimentos
No início deste mês, o Governo do Ceará anunciou um plano de investimento na Educação na ordem de R$ 1,37 bilhão no período de 2022 a 2026. Desse total, R$ 1,2 bilhão será destinado à universalização do Ensino Médio em Tempo Integral, dos quais R$ 685 milhões serão para construção e reconstrução de escolas estaduais.
Além disso, serão aplicados R$ 150 milhões na construção de 80 Centros de Educação Infantil. As iniciativas integram o Programa Ceará Educa Mais, que envolve 25 ações visando à melhoria da aprendizagem na rede pública de ensino.