Zero álcool: bares de Fortaleza investem em drinks não alcoólicos

Movimentos que estimulam consumo consciente de álcool tem ganhado adeptos; muitos deles decidem tirar o álcool de vez da rotina

Escrito por Ana Beatriz Caldas , beatriz.caldas@svm.com.br
Consumo de álcool é frequentemente associado à sociabilidade
Legenda: Consumo de álcool é frequentemente associado à sociabilidade
Foto: Shutterstock

Entre os novos hábitos de consumo que vêm se consolidando após a pandemia, um que tem se popularizado – especialmente entre jovens – é o de refletir sobre a relação com o álcool. Na internet, movimentos como o Dry January, que viralizou no primeiro mês de 2024 ao propor um detox de álcool de um mês, e o Mindful Drinking, que estimula um consumo moderado e consciente de álcool, têm ganhado adeptos – mas o que começou como “moda” pode ter chegado para ficar.

A previsão é de empresas especializadas em tendências, como IWSRWGSN e Datassential, que recentemente divulgaram estudos que demonstram queda global no consumo de álcool, maior interesse por drinks não alcoólicos e um olhar cada vez mais profundo para a saúde e o bem-estar. 

No Brasil não é diferente: apesar de a cerveja gelada, a caipirinha e outras bebidas serem paixão nacional – e o País enfrentar índices preocupantes de consumo excessivo –, cada vez mais pessoas têm optado por parar de consumir bebidas alcoólicas, seja de forma temporária ou definitiva.

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Segundo o psicólogo Tauily Taunay, doutor em Ciências Médicas e professor de psicologia na Universidade de Fortaleza (Unifor), há vários fatores que contribuem para esse cenário: do discurso anti-álcool promovido por influenciadores populares entre adolescentes ao aumento geral do interesse por uma vida mais saudável.

"A gente vê realmente uma tendência de cultivo da saúde entre os jovens, quase uma 'idolatria' dessa vida mais fitness, de atividade física, treino, crossfit, boa alimentação. E é sabido que o álcool atrapalha tudo isso, então é um comportamento que acaba entrando em conflito com os benefícios que a vida fitness pode trazer", explica. 

O cenário de alta exposição nas redes sociais também contribui para uma preocupação maior com a reputação, completa o professor. “O pensamento é: sabe-se que é algo que faz mal para a saúde, então, se eu beber, estarei fazendo algo que não é bom para mim e as pessoas não vão me enxergar como alguém forte mentalmente”, conclui.

Hoje em dia a gente tem muito mais informação do que há algumas décadas. Como a indústria do álcool sempre foi muito forte, muito potente e com muita propaganda, pouco se difundia os malefícios da ingestão de álcool. Até a OMS diz que não existe uma dose mínima segura para o álcool, e hoje as pessoas estão tomando mais consciência disso."
Tauily Taunay
psicólogo e doutor em Ciências Médicas

A vida sem álcool e os novos limites

Marcos Ferreira, 30, trocou álcool por surf
Legenda: Marcos Ferreira, 30, trocou álcool por surf
Foto: Naely Santos

Associar bebidas alcoólicas à sociabilidade e diversão, explica o professor Tauily Taunay, é algo cultural. “A pessoa que sai para se reunir com os amigos muitas vezes não é nem estimulada, é obrigada a consumir”, aponta.

Por isso, para quem tem uma vida social agitada, deixar o álcool de lado pode ser uma tarefa complicada. O professor Marcos Ferreira, 30, percebeu isso há cerca de um ano e meio, quando decidiu parar de consumir bebidas alcoólicas. Por muitos anos, para ele, estar com os amigos era sinônimo de beber: socializar sem álcool era quase impensável.

Depois de terminar o casamento, Marcos decidiu parar de beber e entendeu que, muitas vezes, bebia apenas porque as pessoas ao seu redor bebiam. “Aos poucos, fui vendo que não sentia muita falta. E acabei substituindo o álcool por outras relações, como o surf, que virou uma nova paixão. Surfar me acalmava, então fui trocando a vida noturna, aos poucos, pela vida diurna”, comenta. 

Além do novo hobby, as ressacas foram definitivas para manter a decisão. Com o passar dos anos, os efeitos colaterais do álcool no corpo foram ficando mais intensos e atrapalhando a rotina.

“Hoje eu não sinto vontade de beber. Prefiro estar com os meus amigos – porque é muito importante estar com eles – e substituir álcool por um refrigerante ou água com gás, uma soda, uma bebida sem álcool. Eu consigo passar bem sem ele”, completa.

Se de início, os amigos questionaram a escolha, hoje o novo estilo de vida já é conhecido por todos: para Marcos, é possível ir a festas e bares e se divertir sem consumo de álcool. “Eu tive esse momento um pouco mais introspectivo, porque a sociabilidade era muito reduzida ao álcool. O impacto é muito grande e você sente o distanciamento [de amigos]. Ao mesmo tempo, você vai se aproximando de outros amigos e impondo seus limites também”, conclui.

“Autoconhecimento foi essencial”

Cibelly Chaves, 26, parou de beber na pandemia
Legenda: Cibelly Chaves, 26, parou de beber na pandemia
Foto: Arquivo pessoal

Assim como Marcos, a designer e artista multimídia Cibelly Chaves, 26, também decidiu parar de beber ao perceber que consumir álcool era mais “obrigação” do que vontade.

“Sempre tive uma relação de ‘muleta’ com a bebida. Bebia apenas para socializar. Tenho ansiedade social e a bebida me ajudava a me soltar e me enturmar. O fato de estar fazendo algo em grupo me fazia sentir parte de algo, além de não ficar de mãos vazias”, explica.

A designer costumava sair para beber com as amigas, sempre após a faculdade ou depois do trabalho. Na pandemia, ao passar muito tempo em casa, acabou deixando o hábito e escolheu não voltar a consumir drinks alcoólicos.

“O autoconhecimento foi essencial para que eu pudesse perceber meus limites e ficar tranquila em um ambiente onde todos estejam bebendo. Entendi que tudo bem ser mais reservada, eu ainda posso curtir do meu jeito”, completa. 

Hoje, a artista conta que se sente mais disposta e consciente. Além de evitar ressacas “emocionais e físicas”, consegue economizar e experimentar novos hábitos. Ainda assim, lida com um desafio: ⁠“sempre insistem para que eu beba. Quando eu estava tomando medicação as pessoas respeitavam mais do que quando eu digo que é por vontade própria”, pontua.

O incômodo, porém, é pequeno diante dos benefícios. “Hoje sei como meu corpo se comporta com ou sem bebida, e posso escolher o que quero fazer. O problema não está em beber, mas em achar que só podemos socializar e nos divertir com o uso de algo externo”, conclui.

Foco na estética e na saúde

Ao parar de beber, Vívia sentiu mudanças positivas na pele e no cabelo
Legenda: Ao parar de beber, Vívia sentiu mudanças positivas na pele e no cabelo
Foto: Arquivo pessoal

Para a administradora de empresas Vívia Maria, 35, bebida alcoólica era coisa de fim de semana: as saídas com os amigos na sexta-feira e no sábado eram momento de confraternizar, mas também de exagerar nos drinks. Há três anos, porém, ela começou a fazer uma reeducação alimentar, e percebeu que muitos dos efeitos colaterais do álcool permaneciam mesmo após a folga acabar. 

"Eu sentia muita ressaca, muito mal estar. E eu era uma pessoa que só bebia em 'termos sociais'", comenta. "Outro problema é que também estava afetando muito a minha aparência. Estava afetando minha pele, meu cabelo, tudo. Eu me sentia um pouco mais envelhecida, com mais olheiras e não rendia tanto treinando na academia", completa. 

Antes de parar de vez, Vívia reduziu o consumo de álcool - mas, quando começou a ver mudanças benéficas, deixou os drinks de lado de forma definitiva.

"Eu percebi realmente uma melhora na minha pele, no meu cabelo e no meu estilo de vida a ponto que, hoje em dia, eu não me vejo mais tomando álcool. Não é uma coisa que eu sinto falta", declara. "Só mudou um pouco a configuração das coisas: eu passei a sair menos para barzinho e ir mais para restaurantes, para comer e tomar bebidas não alcoólicas".  

Ainda que alguns amigos e conhecidos estranhem a decisão, Vívia acredita que cada vez mais pessoas devem seguir pelo mesmo caminho. "Eu acho que é uma tendência, principalmente para os adolescentes. Quando eu era mais nova, perto dos 16, 17 anos a gente já tinha essa curiosidade pelo álcool. Querer experimentar, querer beber. E percebo que essa geração mais nova que está vindo não está focada no álcool", explica.

Para conhecer: 5 bares que servem drinks sem álcool em Fortaleza

Além dos tradicionais sucos e refrigerantes, a tendência da redução de consumo de álcool gerou uma nova demanda de mercado: bebidas com a mesma complexidade dos drinks, mas não alcoólicas. São os mocktails, também conhecidos como soft drinks.

Na capital cearense, cada vez mais bares e restaurantes têm incluído bebidas no estilo, ampliando o cardápio e a clientela. A seguir, conheça cinco desses estabelecimentos e os mocktails mais famosos de cada casa:

Bossa 85

Frescor e ingredientes tropicais: Bossa com Laranja e Bossa com Frutas Amarelas
Legenda: Frescor e ingredientes tropicais: Bossa com Laranja e Bossa com Frutas Amarelas
Foto: Divulgação

No Bossa 85, a base da mixologia tradicional e a curadoria de sabores que se adequam ao paladar dos cearenses fazem parte da elaboração dos mocktails.

Segundo o chefe de bar da casa, Nilson Martins, os drinks sem álcool que mais fazem sucesso são o Bossa com Laranja (xarope artesanal de gengibre, sumo de limão, suco de laranja e água gaseificada) e o Bossa com Frutas Amarelas (xarope artesanal de maracujá, cajá e seriguela, sumo de limão e água gaseificada).

Serviço
Endereço: R. Osvaldo Cruz, 1326 - Aldeota
Mais informações: @bossa.85

Coktelitas House

Drinks Coktelitas, nas versões morango e coquetel de frutas
Legenda: Drinks Coktelitas, nas versões morango e coquetel de frutas
Foto: Divulgação

Na Coktelitas House, os drinks sem álcool fazem parte do menu desde o início do negócio, há 20 anos. Atualmente, versões mais elaboradas como o drink Coktelitas (morango, laranja, hortelã e limão) e o Moscow Mule Sem Álcool fazem sucesso.

Segundo a proprietária Fernanda Dantas, a opção também está disponível para o braço da casa que realiza eventos, como forma de atrair outros públicos, como o público fitness.

Serviço
Endereço: R. Osvaldo Cruz, 2330A - Dionísio Torres
Mais informações: @coktelitashouse

Hoots Gastropub

Os mais pedidos: Pineapple Soft e Lovered
Legenda: Os mais pedidos: Pineapple Soft e Lovered
Foto: Divulgação

No Hoots Gastropub, os mocktails autorais fazem parte do cardápio desde 2023, quando pesquisas com clientes apontaram a demanda crescente.

Sócio do Hoots, Paulo Carvalho explica que os drinks atendem também quem possui restrições alimentares - e, claro, os "motoristas da vez". Os mais famosos são o Pineapple Soft e o Lovered.

Serviço
Endereço: Av. Des. Moreira, 125 - Meireles
Mais informações: @hootsgastropub

Parrileiro

Berry Lemonade e Pink Lemonade, os sucessos da casa
Legenda: Berry Lemonade e Pink Lemonade, os sucessos da casa
Foto: Divulgação/Canjica Studio

No Parrileiro, o menu de soft drinks foi expandido recentemente - segundo o mixologista Alan Souza, por ser "um universo que só cresce". O especialista explica que há variações dos modos de preparo e foco especial na variedade de sabores e apresentação, para que os clientes "bebam com os olhos".

Os queridinhos da casa são o Berry Lemonade (chá de hibisco, xarope de morango, mix de cítricos, soda de limão e água com gás) e a Pink Lemonade (cordial de morango, xarope de morango com hibisco, mix de cítricos, água com gás e espuma de mel com manjericão), além do refrigerante autoral do Parrileiro.

Serviço
Endereço: Av. Dep. Joaquim de Figueiredo Correia, 194 - Cambeba / R. Marcos Macêdo, 850 - Aldeota
Mais informações: @parrileiro e @parrileiroaldeota

Villa Roma Cucina

Refrescância e sabor: Chai e Iced Ice Lemon
Legenda: Refrescância e sabor: Chai e Iced Ice Lemon
Foto: Divulgação

No Villa Roma, os xaropes sem álcool são a base dos mocktails. Para atender ao maior número de pessoas, o chefe de bar Marcelo Karmo que vem testando receitas com adoçantes, já que muitos clientes não podem consumir açúcar.

No estabelecimento, os mais pedidos são o Chai (canela com gengibre, água com gás e limão) e o Iced Ice Lemon (xarope de chá de limão siciliano, néctar de limão e água gaseificada). Além dos drinks já consagrados, Marcelo avisa que uma nova carta de bebidas, com mocktails exclusivos, está sendo preparada e será lançada em breve.

Serviço
Endereço: Rua Frederico Borges, 404 - Varjota
Mais informações: @villaromacucina

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