Conheça Karim Aïnouz, diretor cearense que concorre ao prêmio principal do Festival de Cannes
Nascido em Fortaleza, realizador coleciona prestígios dentro e fora do Brasil com olhar particular sobre as relações, o cotidiano e personagens repletos de humanidade
A 76ª edição do Festival de Cannes, evento francês dedicado ao cinema, finaliza neste sábado (27) com um nome cearense em destaque. É Karim Aïnouz. Veterano na Croisette, o cineasta escreveu novo capítulo ao disputar, pela primeira vez, o prêmio máximo do festival, a Palma de Ouro, com “Firebrand”, primeiro filme em língua inglesa dirigido por ele.
É mais um reconhecimento na prestigiada carreira do realizador nascido em Fortaleza em 1966. O longa "A Vida Invisível" (2019), por exemplo, foi o representante do Brasil no Oscar 2020, e tantos outros projetos conduzidos por ele figuraram entre os melhores em vários eventos.
Karim é filho de uma bióloga cearense e de um engenheiro argelino. Ele deixou a Capital aos 16 anos com apoio da família. Fixou-se no Distrito Federal, onde graduou-se em Arquitetura pela Universidade de Brasília (UNB).
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Foi nesse tempo de juventude que o interesse pelas artes e pelo cinema aflorou e o direcionou. Passou uma temporada com o pai na França, e de lá se mudou para os Estados Unidos, lugar em que cursou o mestrado em Studio Art pela New York University. Quanto ao cinema, a ideia de Karim era estudar os fundamentos da crítica.
Assim, ao imergir na teoria, despertou para a ação. “Deu vontade de botar a mão na massa. A maneira de entrar no cinema foi fazendo estágios com diretores, para saber o que era aquela manufatura, aquela prática”, relatou ao Diário do Nordeste na ocasião do Troféu Sereia de Ouro, comenda do Sistema Verdes Mares, em 2016, com a qual foi laureado.
Karim ainda se especializou em Teoria Cultural pelo programa de estudos independentes do Whitney Museum of American Art (EUA). No circuito cinematográfico, estreou dirigindo curtas-metragens, sendo dois no Ceará. Já na seara de longas, o primeiro foi “Madame Satã” (2002), selecionado para a mostra Un Certain Regard, do mesmo Festival de Cannes.
De lá para cá, diversos outros trabalhos queridos pela crítica foram gestados pelas mãos de Aïnouz. “O Céu de Suely” (2006), “O Abismo Prateado” (2011), “Praia do Futuro” (2014) e “A Vida Invisível” (2019) despontam como os principais. Além disso, junto a Marcelo Gomes, dirigiu “Viajo Porque Preciso, Volto Porque Te Amo” (2009).
O artista reside em Berlim, na Alemanha, mas atua constantemente entre três cidades brasileiras: Fortaleza, Rio de Janeiro e São Paulo.
Firebrand e a rainha em busca de revolução
O filme que levou Karim a disputar a Palma de Ouro em Cannes neste ano, “Firebrand”, conta a história de Catarina Parr (Alicia Vikander), última esposa do rei inglês Henrique VIII (Jude Law). A trama é baseada em livro de Elizabeth Fremantle, lançado em 2013.
Graças à própria astúcia, Parr (1512-1548) sobreviveu a um rei irascível, que mandou cortar as cabeças de suas duas esposas anteriores (Ana Bolena e Catarina Howard), e que não hesitou em romper com a Igreja de Roma para poder se divorciar de Catarina de Aragão.
Com o marido na França, ela chegou a ser regente em um período de guerra, além de escrever e publicar livros religiosos assinando o próprio nome. A exibição do longa na Croisette rendeu oito minutos de aplausos.
Agora, com cada vez mais renome na sétima arte, Karim já tem um novo projeto em Hollywood: “Rosebushpruning”, sátira social que será estrelada por Kristen Stewart, Elle Fanning e Josh O'Connor.
Caracteristicas da direção de Karim Aïnouz
O cearense possui cinematografia composta de dramaturgias mínimas, construídas por cores de forte contraste, poder cênico e em cujos personagens habita uma existência situada num espaço entre o arbítrio e a fatalidade, revelando dilemas universais em situações íntimas e particulares.
As características são enumeradas no portal da Associação Cultural Videobrasil, que também relembra que o artista foi responsável por colaborar com o dinamarquês Olafur Eliasson na realização da videoinstalação “A Sua Cidade Empática” (2011), na ocasião do 17º Festival de Arte Contemporânea SESC_Videobrasil.
Ainda como desdobramento dessa colaboração, Karim realizou o filme “Domingo” (2014), parte da série Videobrasil Coleção de Autores. O diretor também é mentor de roteiro no Porto Iracema das Artes e membro da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas.
No artigo “Escritas cinematográficas de Karim Aïnouz: roteiros, trânsitos migratórios e arquivamentos literários no filme O Céu de Suely (2016)”, de Calila das Mercês, a estudiosa faz comentários bastante pertinentes quanto ao trabalho do cearense.
Segundo ela, “assumindo a interdisciplinaridade e superando estruturas rígidas, Aïnouz amplia seus diálogos, ao mostrar com tons precisos recortes de pessoas (ou representações de pessoas) que costumam ser deixadas de lado pela História e pelas mídias tradicionais, gente que não está inscrita nas páginas de editorias de cotidiano ou como destaque em jornais de grande circulação”.