Por que nenhuma empresa tem interesse em explorar petróleo em águas cearenses?

Leilão com 16 blocos da Bacia Potiguar, da qual o território do Ceará faz parte, não teve interessados

Escrito por
Paloma Vargas paloma.vargas@svm.com.br
Imagem de cima da Plataforma de petróleo P-71 na bacia de Santos
Legenda: Plataformas de petróleo, como a P-71 da Bacia de Santos, podem ser construídas na Margem Equatorial
Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil

A Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), vinculada ao Ministério de Minas e Energia (MME), realizou nesta terça-feira (17) um leilão de concessão de áreas para exploração de petróleo.

Entre as áreas oferecidas havia 16 blocos exploratórios, alguns situados no litoral leste do Ceará, que fazem parte da Bacia Potiguar (composta por territórios do Rio Grande do Norte e Ceará) da Margem Equatorial.

Porém, o lote que contemplava a área que atingiria o estado deu deserto no leilão, ou seja, não tiveram interessados.

O objetivo da ação era fomentar a expansão da atividade no país, incluindo a exploração na Foz do Rio Amazonas (ato que gera protestos de instituições nacionais e internacionais ligadas ao meio ambiente).

Por esta área, diferente da Bacia Potiguar, tiveram empresas interessadas que arremataram lotes.

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O que está por trás do leilão deserto?

Segundo o consultor na área de petróleo e gás, Bruno Iughetti, o principal motivo de não terem aparecido interessados para explorar a Bacia Potiguar é a falta de expectativas de reservas significativas de petróleo e gás na região.

Os poços existentes atualmente nessa área são classificados como poços 'maduros' o que significa baixa produção”. 
Bruno Iughetti
especialista em Petróleo e Gás

Ele ainda lembra que já houve outro leilão dessa área, em 2023, tendo sido também "deserto, pelas mesmas razões".

Bloco da Bacia Ceará foi retirado antes de leilão

Além de ter blocos de exploração no território chamado de Bacia Potiguar, o Ceará também possui parte da Bacia Ceará, a qual divide com territórios do Piauí.

O Engenheiro de petróleo e gás, diretor de comunicação da Associação dos Engenheiros da Petrobras no RN/CE, Ricardo Pinheiro, explica que no início do ano um bloco que faz parte da Bacia Ceará teria sido colocado na lista de oferta deste leilão que ocorreu nessa terça-feira.  

"Na primeira versão havia 332 blocos possíveis de irem a leilão. O governo faz isso, justamente para ver se há interesse de alguém em trabalhar neles. Os blocos que ninguém tem interesse nessa primeira chamada, já são tirados. Foi o que aconteceu com o Ceará". 

Naquele momento, ainda conforme Pinheiro, a própria Petrobras teria demonstrado interesse. Já nos blocos da Bacia Potiguar, que acabou indo para leilão, mas não recebendo nenhum lance, o especialista em petróleo e gás afirma que este é "um fenômeno que acaba sendo previsível".

"A Petrobras já tem muita informação da Bacia Potiguar, já tem dois poços perfurados na área que hoje se chama Margem Equatorial. Eles são recentes e continuam em estudo, estão avaliando as informações obtidas através desses blocos. Por isso, não teria um interesse muito forte da Petrobras nesse momento, já que ela já tem o suficiente para continuar estudando a área", explica o engenheiro.

Mapa com demarcação de blocos de exploração de petróleo na Margem Equatorial
Legenda: Mapa com demarcação de blocos de exploração de petróleo na Margem Equatorial que foram para leilão, evidencia costa do Ceará
Foto: Reprodução

Com relação às empresas privadas, Pinheiro ressalta que "dificilmente fazem grandes apostas nesse momento".

"Porque ainda há muita dúvida, ninguém sabe se vai ter licença ambiental, como isso vai andar, ninguém sabe ainda quais vão ser as dificuldades políticas, principalmente, em relação à condução da perfuração na Margem Equatorial", comenta.

Preço do petróleo retraiu investidores

O especialista no mercado de petróleo também reforça que este não foi um bom momento para o leilão, considerando as incertezas do mercado internacional por conta da guerra entre Irã e Israel. 

Ele lembra que até o dia 11, o barril de petróleo custava cerca de US$ 66. 

"Houve uma subida de mais 10% devido à guerra e pode impactar mais, dependendo do agravamento dessa guerra. Então está num momento de muita incerteza. Se a gente for analisar bem direitinho, não por culpa da ANP, não por culpa do governo, nem por culpa de ninguém, mas a guerra nas vésperas do leilão fez com que o momento para investimento não fosse bom".

Pinheiro ainda reforça que a oscilação grande de preço no barril de petróleo assusta muito o investidor, já que a exploração na Margem Equatorial é algo caro. 

"Qualquer poço desse aí que a gente está falando de valores que variam entre US$ 10 e U$S 25 milhões. É muito dinheiro envolvido. E quem faz a oferta já tem que fazer a indicação de pagamento e começa a contar um prazo para ser feito o primeiro poço, os primeiros estudos. Além disso, tem a insegurança com relação a como se darão os licenciamentos. Então as empresas se assustam nesse momento de grande volatilidade do preço do petróleo". 

Qual seria o destino da Margem Equatorial

Pinheiro é taxativo ao dizer que mesmo tendo dado deserto esse leilão, esse "não é o fim da Margem Equatorial". Ao contrário, ele acredita que passada a primeira fase desse leilão, incentivos devem ser concedidos.

Isso deve ocorrer, principalmente, quando a Petrobras já estiver perfurando na Foz do Rio Amazonas e obter sucesso nesse trabalho. "Então, com certeza, os próximos leilões devem ser bastante disputados", acredita.

O que foi ofertado neste leilão?

Este foi o 5º Ciclo da Oferta Permanente de Concessão (OPC). Ao todo foram 16 setores com blocos exploratórios, localizados em cinco bacias sedimentares: Parecis (em terra); Foz do Amazonas, Potiguar, Santos e Pelotas (no mar).

Ao todo, 12 empresas apresentaram declarações de interesse e garantias de oferta para esses setores. No total, 31 empresas se inscreveram e estavam aptas a apresentar ofertas na sessão pública do 5º Ciclo.

As empresas que não apresentaram declarações de interesse acompanhadas de garantias de oferta poderiam apresentar ofertas em consórcio com empresas que tenham declarado interesse.

O que é a Oferta Permanente 

A Oferta Permanente é a principal modalidade de licitação para exploração e produção de petróleo e gás natural no Brasil.

Diferentemente das rodadas tradicionais, esse modelo permite a oferta contínua de blocos exploratórios e áreas com acumulações marginais, localizados em bacias terrestres ou marítimas.

Com isso, as empresas têm liberdade para estudar os dados técnicos das áreas e apresentar ofertas no momento que julgarem mais adequado, sem depender de prazos rígidos ou ciclos específicos de licitações.

Essa flexibilidade tem tornado a Oferta Permanente um instrumento essencial para fomentar a competitividade e atratividade do setor no Brasil.

Atualmente, há duas modalidades de Oferta Permanente: Oferta Permanente de Concessão (OPC) e Oferta Permanente de Partilha da Produção (OPP), de acordo com o regime de contratação (concessão e partilha).

Qual a briga por trás da exploração da Margem Equatorial

Desde os anos 1980, a Margem Equatorial tem sido alvo de estudos para a descoberta de novas reservas de petróleo, com o intuito de aumentar a produção de energia fóssil no Brasil.

A Petrobras informou que, ao longo da extensão da região até o Rio Grande do Norte, foram perfurados cerca de 700 poços em águas rasas, a maioria antes da criação da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).

Contudo, muitos desses poços foram descontinuados devido a problemas mecânicos.

Em 2015, a descoberta de grandes reservas de petróleo na Bacia Guiana Suriname gerou interesse entre investidores, que passaram a investigar bacias sedimentares semelhantes, que renderam 11 bilhões de barris de petróleo à reserva da Guiana.

Mais recentemente, em agosto de 2024, a Petrobras apresentou uma atualização do Plano de Proteção à Fauna, e, em outubro do mesmo ano, o Ibama solicitou novos esclarecimentos sobre o licenciamento na Foz do Amazonas.

O órgão reconheceu progressos na documentação, especialmente no que diz respeito ao tempo de resposta no atendimento à fauna em caso de vazamento de petróleo.

No entanto, o Ibama pediu mais informações sobre a “adequação integral do plano ao Manual de Boas Práticas de Manejo de Fauna Atingida por Óleo, como a presença de veterinários nas embarcações e o número de helicópteros para emergências”.

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