Governo do CE desiste de desapropriar prédio centenário da Escola Jesus, Maria e José, em Fortaleza
A edificação de 1905 é tombada e pertence à Arquidiocese de Fortaleza. Desde 2009 foi cedida à Prefeitura de Fortaleza para implementação da Casa da Fotografia. Mas não foi usada
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Enquanto a passagem do tempo alinhada à falta de manutenção segue implacável com a estrutura do prédio da antiga Escola Jesus, Maria e José, no Centro de Fortaleza, nenhuma decisão é tomada em relação ao destino da edificação, construída em 1905. Na ação mais recente, o Governo do Estado desistiu de desapropriar o imóvel que segue deteriorado.
Um decreto assinado pelo governador Elmano de Freitas (PT), publicado no Diário Oficial do Estado (DOE), no dia 23 de abril, formaliza o recuo da decisão que havia sido tomada em março de 2022, à época, pelo governador Camilo Santana (PT), de desapropriação do prédio.
O imóvel, que é tombado, pertence à Arquidiocese de Fortaleza, mas desde 2009 foi cedido pela instituição à Prefeitura de Fortaleza para que a gestão municipal implementasse a Casa da Fotografia. A cessão tem validade até 2029.
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Conforme a norma publicada na edição do DOE (decreto 36.532/2025), da semana passada, Elmano determinou a revogação do decreto anterior (34.609/2022), que havia sido assinado por Camilo que, na época, declarou “a utilidade pública, para fins de desapropriação” do imóvel de área de 4.288,47 m² para implementar justamente a Casa da Fotografia, iniciativa que a Prefeitura havia se disponibilizado a tocar ainda em 2009 e que não avançou.
A edificação está localizada próximo ao Colégio da Imaculada Conceição, na confluência das ruas Coronel Ferraz, do Pocinho e Visconde de Sabóia, no Centro. O decreto de 2022 definiu que caberia à Procuradoria-Geral do Estado (PGE) proceder, por via administrativa ou judicial, a desapropriação. A decisão também definiu que os custos com a desapropriação ficariam à cargo do tesouro estadual.
Já no decreto assinado por Elmano consta que a Secretaria da Cultura do Ceará (Secult), que antes havia recomendado o imóvel para implementar o equipamento, agora indicou ao Governo a revogação da medida.
Por que desistir da desapropriação?
Questionada pelo Diário do Nordeste sobre o motivo de indicar a revogação da desapropriação, a Secult reforçou, em nota, que a edificação pertence à Arquidiocese de Fortaleza e que, embora seja um bem tombado tanto pelo Estado quanto pelo Município, “é de responsabilidade da Prefeitura de Fortaleza”.
Diante desse cenário, diz a nota, “a Secult solicitou à Procuradoria Geral do Estado a suspensão do processo de desapropriação do referido bem, com a adoção das medidas necessárias para revogação do decreto”.
A Secult afirmou ainda que o motivo da sugestão de revogação é o fato de “que não possui ingerência na gestão da Escola Jesus, Maria e José, para quaisquer iniciativas no desenvolvimento de projetos que primam pelo restauro e reabilitação do referido bem imóvel”.
Mas, acrescentou o órgão, “isso não impede que a Prefeitura de Fortaleza e o Governo do Estado do Ceará articulem ações conjuntas voltadas à requalificação do espaço, com vistas à sua utilização para fins educativos, formativos e culturais”.
A Prefeitura reiterou ao Diário do Nordeste que a Escola Jesus, Maria e José “está sob um contrato de comodato válido até 2029 entre a gestão municipal através da Fundação de Cultura, Esporte e Turismo (hoje Conselho Municipal de Política Local) e a Mitra Arquidiocesana de Fortaleza, mas não informou, até a publicação desta matéria se há algum plano da nova gestão para recuperação e uso do imóvel.
Bem tombado e deteriorado
Conforme informações que constam na instrução de tombamento municipal da Escola Jesus Maria e José, o prédio teve a construção iniciada em "14 de setembro de 1902, sob a atenção de Dom Joaquim José Vieira, 2º Bispo do Ceará, sendo inaugurada em 22 de janeiro de 1905 e dirigida por irmãs de caridade da congregação de São Vicente de Paulo".
A escola destinada à educação cristã com a oferta de instrução a crianças pobres funcionou com essa finalidade até os anos 1920, depois teve diversos usos, que geraram inclusive mudança na sua estrutura.
Dentre outros, abrigou uma Casa Paroquial, já que fica nas proximidades da Igreja do Pequeno Grande, abrigou o Auditório da Rádio Assunção Cearense e uma firma de venda de equipamentos pesados para a agricultura. E também sediou a associação "O Berço do Pobre, confiada ao zelo das mães cristãs pelo monsenhor Luís Rocha, e o Cine Paroquial", diz o documento.
Na instrução de tombamento, é destacado que o prédio é "um exemplar da arquitetura eclética da cidade, com tipologia bastante significativa, configura-se como uma das raras edificações educacionais remanescentes de Fortaleza, onde praticamente já não existem outras similares".
O texto reforça que o imóvel tem "uma conjugação harmoniosa da utilização de elementos da arquitetura eclética, como a decoração elaborada e rica das fachadas e a estrutura metálica das varandas, com o emprego de elementos tradicionais da arquitetura local, como a telha de barro e o madeiramento da cobertura, todo em carnaúba".
Em 2007, o imóvel foi tombado pelo município (decreto 12.303/2007). Mas, no decorrer dos anos, a estrutura tem passado por processos de deterioração e severa degradação. Nos últimos anos, o imóvel centenário chegou a ser ocupado, em distintas ocasiões, por famílias sem teto.
Ainda em julho de 2021, a Prefeitura vedou as entradas da edificação. Na época, a justificativa era "garantir o isolamento da área" para que um plano de recuperação do equipamento fosse desenvolvido. Nada prosperou.
Procurada, a Arquidiocese de Fortaleza, via o departamento jurídico, reiterou na segunda-feira (28), que foi realizado contrato de comodato e que a ideia da Prefeitura na época era reformar e instalar o equipamento relacionado à fotografia. Mas “não foi realizada a implementação, bem como não nos foi informado o prazo para o início dessa intervenção.”
Questionada se há alguma intenção da Arquidiocese de requerer o bem antes dessa data, o advogado da Arquidiocese disse que caso receba de volta o espaço, “temos idéias de projetos a serem implementados no local, entretanto, é necessário que o prédio seja entregue em condições de uso, assim como foi disponibilizado em 2008 à Prefeitura de Fortaleza”.