Entenda o que é transtorno bipolar, distúrbio que afasta pelo menos 1 cearense por dia do trabalho

Confundida com “mau humor”, condição de saúde é alvo de preconceitos; Dia Mundial do Transtorno Bipolar busca eliminar estigmas

Escrito por Theyse Viana , theyse.viana@svm.com.br
Mulher com bipolaridade
Legenda: Especialista alerta que muitas pessoas confundem os episódios depressivos da bipolaridade com a própria depressão, mas há diferença importante entre ambas
Foto: Shutterstock

“Você é bipolar demais.” A frase, em músicas ou no dia a dia, é usada para descrever alguém que muda de humor com frequência – mas é rasa, preconceituosa e ignora o que é o transtorno bipolar, que afasta pelo menos 1 cearense por dia do trabalho.

Na pandemia, mais de 1.300 pessoas receberam auxílio doença ou aposentadoria por invalidez no Ceará após diagnóstico de bipolaridade: foram 760 só em 2020, e mais 548 no ano passado. Com 2019, foram 1.894 afastamentos em 3 anos. Pelo menos 1 por dia.

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Os dados são do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), tabulados pelo Diário do Nordeste, e se baseiam nos benefícios concedidos mensalmente, entre 2019 e 2021, a residentes do Ceará.

O que é transtorno bipolar?

Diante de um senso comum que não leva a bipolaridade a sério, o conceito se perde: o que é, de fato, esse distúrbio? Quem explica é a psiquiatra Luísa Weber Bisol, professora de Medicina Clínica da Universidade Federal do Ceará (UFC).

“É um transtorno mental em que os pacientes têm episódios de depressão, ficam sem energia, muitos com ideação suicida; que são alternados com períodos estáveis e também de mania ou hipomania, em que há um humor eufórico, não se sentem cansados”, resume.

Muitas pessoas confundem os episódios depressivos da bipolaridade com a própria depressão, mas a psiquiatra alerta que há diferença importante entre ambas.

Depressão é caracterizada por humor triste, falta de prazer, alteração de sono, de apetite, dificuldades de concentração, que perduram pelo menos 2 semanas. No transtorno bipolar, há esses episódios, mas existe também a mania ou hipomania.
Luísa Weber Bisol
Psiquiatra e professora da UFC

Luísa destaca que o diagnóstico é puramente clínico, “não há um exame de sangue ou de análise cerebral que mostre a bipolaridade”. Por isso, é preciso que o médico investigue a vida do paciente a fundo: “veja o filme da vida da pessoa, não a foto daquele momento”.

“A maioria das pessoas busca ajuda quando estão deprimidas, porque a euforia é tida como uma coisa boa. Então, se eu não investigar a história do paciente, posso dar o diagnóstico errado”, frisa.

Quais os tipos de transtorno bipolar?

A psiquiatra lista ainda quais são os 5 tipos de transtorno afetivo bipolar: tipo I, tipo II, ciclotímico, induzido por substâncias e não especificado, ou seja, quando não se consegue classificar entre os demais.

Veja as características de cada tipo:

  • Transtorno bipolar tipo I: o paciente tem períodos de mania, que duram no mínimo 7 dias e podem causar sintomas psicóticos; e depressivos, que se estendem de 2 semanas a vários meses. O quadro pode levar a internação.
  • Transtorno bipolar tipo II: o paciente tem períodos de hipomania, que duram no mínimo 4 dias; e depressivos. Não há prejuízos maiores às atividades cotidianas.
  • Transtorno bipolar misto ou não especificado: sintomas são insuficientes em número ou na duração para classificar a doença em tipo I ou II.
  • Transtorno bipolar ciclotímico: o paciente tem oscilações crônicas do humor, que podem ocorrer no mesmo dia, alternando sintomas de hipomania e episódios depressivos leves.
  • Transtorno bipolar induzido por substâncias: alternância entre episódios depressivos e maníacos durante ou após intoxicação ou abstinência de substância psicoativa ou medicamento.

A bipolaridade pode incapacitar o indivíduo a exercer as atividades de trabalho, estudo e sociais, uma vez que “nos episódios, o paciente sai de seu funcionamento”, como simplifica a médica Luísa Weber Bisol.

“Com depressão, muitas vezes a pessoa não tem energia nem pra escovar os dentes. Na mania, ela está muito acelerada, agitada, não consegue parar pra fazer suas atividades. Os pacientes têm prejuízo de cognição, raciocínio. Isso impacta diretamente”, descreve.

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mortes no Ceará, entre 2020 e 2022, tiveram como causa o “transtorno afetivo bipolar”. A psiquiatra Luísa Weber afirma que “muitos pacientes com o transtorno acabam morrendo por suicídio”.

Onde buscar ajuda no Ceará

  • Grupo de Estudos em Transtornos Afetivos – GETA: projeto de extensão da UFC, do qual a psiquiatra Luísa Weber Bisol faz parte, oferta atendimento gratuito no Hospital Universitário Walter Cantídio. Contatos: @getaufc / (85) 98891-9246 (para agendamento).
  • Hospital de Saúde Mental de Messejana
    Contatos: (85) 3101.4348 | www.hsmm.ce.gov.br
    Endereço: Rua Vicente Nobre Macêdo, s/n – Messejana – Fortaleza/CE
  • Postos de saúde: as unidades são portas de entrada para obter ajuda especializada, como os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS).

Van Gogh era bipolar

Sim, Vincent van Gogh (1853-1890), o pintor holandês, tinha transtorno afetivo bipolar. Após buscarem explicações médicas para os comportamentos do artista, pesquisadores concluíram que é provável que ele tenha sido portador do distúrbio mental.

É por esse motivo, aliás, que o Dia Mundial do Transtorno Bipolar é marcado em 30 de março. O objetivo da data, segundo o Ministério da Saúde, “é chamar a atenção para a bipolaridade, eliminar o estigma social e levar informação à população”.

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