Clínica para autistas retomará atendimento após descredenciamento de plano de saúde em Fortaleza

De início, 240 pessoas voltarão a ser assistidas; em julho, o rompimento entre a Clínica Adaptro e a Unimed Fortaleza deixou cerca de 600 pacientes sem acesso às terapias semanais

Escrito por Gabriela Custódio , gabriela.custodio@svm.com.br
Legenda: O acordo entre a Unimed Fortaleza e a Clínica Adaptro foi pactuado em audiência extrajudicial realizada na quarta-feira, 14 de agosto
Foto: Divulgação/Defensoria Pública Geral do Ceará

A Clínica Adaptro, especializada no atendimento de pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA), vai retomar o atendimento de pacientes da Unimed Fortaleza, segundo informou a Defensoria Pública Geral do Estado do Ceará (DPCE). A unidade havia sido descredenciada do plano de saúde em julho, e 600 pacientes ficaram sem acesso às terapias semanais. O acordo foi pactuado entre as entidades em audiência extrajudicial promovida pela DPCE e pelo Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE) na quarta-feira (14).

O Diário do Nordeste noticiou o descredenciamento no último 12 de julho. Cinco dias depois, a 31ª Vara Cível de Fortaleza determinou que a Clínica Adaptro mantivesse o contrato com a Unimed Fortaleza e o atendimento aos pacientes da operadora pelo menos até o dia 31 daquele mês. Segundo informações da DPCE, porém, ainda havia impasses sobre como seria a retomada destes atendimentos.

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Na audiência, representantes da clínica informaram que têm condições de atender 240 beneficiários. Ficou acordado que 152 deles serão indicados pela Unimed Fortaleza, pois esses não haviam sido inseridos em outras clínicas. Preferencialmente e prioritariamente serão atendidos os usuários acima de 12 anos e, posteriormente, aqueles que manifestarem interesse de retorno.

A operadora se comprometeu a enviar a lista com os nomes desses pacientes até esta sexta-feira (16). Os 88 remanescentes serão informados pela Adaptro.

Segundo a Defensoria, até a terça-feira, 20 de agosto, será apresentada uma nova lista com os nomes dos demais usuários, informando se eles já foram realocados em outras clínicas.

À época da reportagem do Diário do Nordeste sobre o caso, a Unimed Fortaleza havia indicado que mais de 80% dos pacientes da Adaptro já haviam sido contactados com sucesso, e 50% estavam com agendamentos realizados. Além disso, o diretor de Provimentos em Saúde da operadora, Francisco Assis, informou, naquele momento, que uma nova clínica — a NPC Life — já havia sido credenciada para manter a continuidade do tratamento.

Outro impasse que estava ocorrendo entre as empresas era sobre o procedimento para autorizar as terapias. “Como as pessoas que buscam a clínica geralmente fazem três ou mais terapias seguidas, as etapas de autorização geravam demoras e longas filas de espera. Muitas vezes, devido à demora pela autorização, os pacientes perdiam as terapias agendadas”, informa a Defensoria.

Em relação a esse assunto, a Unimed Fortaleza se comprometeu a realizar um único procedimento de autorização diária para as terapias do dia para não ser necessário realizar várias autorizações ao longo do mesmo dia. A operadora também se comprometeu a adaptar o sistema a esta funcionalidade. Também foi relatada a dificuldade com relação aos valores repassados pelo plano de saúde para a clínica e o prazo de pagamento pelos serviços prestados.

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“Quando passamos a ser acionados pela família, por meio da Associação Fortaleza Azul (FAZ), notificamos a Unimed para saber o porquê do descredenciamento da clínica e porque os usuários não foram informados da rescisão. Existe uma responsabilidade da Unimed, mas também da clínica para com os usuários, principalmente, em face da obrigatoriedade da prestação do serviço de saúde e da natureza das terapias, que precisam ter continuidade”, afirma a defensora pública Mariana Lobo, supervisora do Núcleo de Direitos Humanos e Ações Coletivas.

O promotor de Justiça Eneas Romero de Vasconcelos, titular da 5ª Promotoria de Justiça de Defesa do Idoso e da Pessoa com Deficiência, destacou que a pactuação do acordo foi possível porque as duas entidades cederam e porque foi interessante para ambos os lados. “Se fosse algo que prejudicasse as duas partes, não seria suficiente nem resolveria. Sem essa pactuação teríamos um problema grave, que seria a não alocação de todas essas pessoas. A Adaptro trouxe algumas propostas, elas foram discutidas, o que seria viável e o que não seria possível e todos juntos construímos a partir da situação, para que os assistidos não ficassem sem solução”, disse.

ENTENDA O CASO

De acordo com a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), o descredenciamento de prestadores da rede operadora de saúde é permitido. Os prestadores podem ser substituídos por outro equivalente, mediante comunicação prévia ao consumidor e à ANS com 30 dias de antecedência.

Em 31 de maio deste ano, a Clínica Adaptro informou à Unimed Fortaleza sobre “o desinteresse na continuidade do contrato de credenciamento”, respeitando o prazo de 30 dias para finalizar os atendimentos.

No dia 27 de junho, dois dias antes do fim desse prazo, representantes legais das empresas se reuniram para tratar de um novo modelo de atendimento, que, segundo a Adaptro, “a Unimed analisaria para possível implementação” e posterior comunicação conjunta às famílias, mas isso não ocorreu.

“Mesmo após o encerramento do prazo contratual, em 29 de junho, a Unimed Fortaleza permaneceu silente”, disse a clínica, em nota, ratificando a decisão de encerrar o credenciamento. Rafaela Páscoa, fundadora da Adaptro, conta que a operadora emitiu um informe às famílias no dia 5 de julho — quando já não havia vínculo jurídico entre as empresas —, afirmando que “devido a uma reestruturação da clínica, alguns pacientes seriam remanejados”.

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“Nós estávamos esperando um posicionamento da operadora (sobre a possível implementação de nova metodologia de atendimento), por isso não comunicamos os pacientes. Mas a Unimed emitiu o comunicado ‘conjunto’ sem nos consultar”, declarou.

A empresária explica que após mudanças contratuais entre a clínica e a Unimed, em agosto de 2023, “começaram os prejuízos financeiros”. “Sofremos a pressão de ter que ter terapeutas, colocar pacientes, fazer, fazer, fazer. Em contrapartida, tivemos uma perda financeira de 40%. A curva de crescimento de pacientes e financeiro não acompanhava.”

Em entrevista no dia 12 de julho, o diretor de Provimentos em Saúde da Unimed Fortaleza afirmou que a operadora foi “surpreendida” com a confirmação do descredenciamento da Adaptro, no dia 5 de julho, após tentativa de negociação que “estava evoluindo muito bem”. “Tentamos ajudar a clínica de todas as formas. Antecipamos o reajuste, reduzimos o prazo de pagamento, nos comprometemos a analisar novos modelos de remuneração, mas não foi possível”, disse.

Em nota, a operadora de plano de saúde informou ao Diário do Nordeste que, “após solicitação de descredenciamento pela clínica Adaptro, no fim do mês de maio, iniciou uma negociação para a manutenção do prestador em sua rede, visando ao bem-estar de seus clientes e à sustentabilidade do contrato”.

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