Atriz e contadora de histórias Paula Yemanjá realiza projeto sobre mulheres na história

A iniciativa reúne diferentes tipos de público e se baseia em dinâmica lúdica

Escrito por Diego Barbosa , diego.barbosa@diariodonordeste.com.br
Legenda: A idealizadora do projeto, Paula Yemanjá: nós, mulheres, acabamos sempre como nota de rodapé", critica
Foto: Thiago Gadelha

Do diálogo mais trivial até a edição de um filme ou livro, por exemplo, todo o conteúdo que um ser humano produz ao longo da vida atravessa filtros relacionados às suas próprias experiências, aos aspectos culturais da comunidade na qual se insere e aos conhecimentos que acumulou. Em uma sociedade patriarcal e ainda profundamente marcada pelo eurocentrismo e a heteronormatividade, não surpreende que grandes narrativas sejam quase sempre protagonizadas pelo modelo do homem branco heterossexual, recorte que alimenta perspectivas unilaterais.

Nesse contexto, mulheres costumam ficar distantes ou apagadas de narrativas nos mais diferentes campos - científicos, bélicos, intelectuais, políticos, empresariais. Felizmente, projetos como o "Mnemosine: Porque memória é feminina!" saem na contramão e tomam como foco o protagonismo feminino em diversos segmentos - do esporte à cultura, dos direitos humanos à academia - atestando sua presença fundamental em acontecimentos cuja abrangência repercute diretamente na maneira como enxergamos a sociedade.

A iniciativa vem realizando encontros desde março deste ano e investe no debate e na troca de experiências para resgatar trajetórias femininas, evidenciando a relevância da mulher na construção da memória nacional. "A gente se pergunta de quem é o papel de preservar a memória hoje e vemos que ficam nas mãos das pessoas mais esclarecidas, de pessoas brancas e de homens. Nós, mulheres, acabamos sempre como nota de rodapé, mostradas como musas ou mães", observa a atriz e contadora de histórias Paula Yemanjá, idealizadora da ação.

Sem tempo de duração e periodicidade definidos - alocando-se às programações de espaços culturais, escolas, ONGs e outras instituições que desejam recebê-la - a performance já passou por vários espaços na Capital, como Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura, Theatro José de Alencar, Livro Livre Curió - Biblioteca Comunitária e Livraria Lamarca, abarcando públicos de diferentes bairros.

O próximo encontro está agendado para esta quinta (25), na Biblioteca do Centro Cultural Bom Jardim. Na sequência, quem receberá a ação é o Cuca Mondubim, no dia 20 de novembro. Outras datas estão sendo combinadas mediante o esforço de Paula em garantir que as discussões ganhem contornos cada vez mais amplos.

Oralidade

Para alavancar o diálogo, a profissional recorre a um método lúdico, propondo que os participantes - de diferentes gêneros e idades - interajam por meio de um jogo da memória, composto, neste estágio inicial do projeto, por 26 cartas, representando 13 personalidades (12 cearenses e uma carioca, a vereadora Marielle Franco, assassinada em março).

Entre as representantes locais, estão nomes como Maria da Penha, Adísia Sá e Raquel de Queiroz (1910-2003); e figuras feito Violeta Arraes (1926-2008), Fideralina Augusto Lima (1832-1919) e Jovita Feitosa (1848-1867). A curadoria transita, assim, entre diferentes períodos históricos e referências.

Legenda: Na dinâmica, os participantes trabalham com personagens de diferentes períodos da história
Foto: Thiago Gadelha

Escolhidas as personagens, Paula imerge na caminhada que elas fizeram. "Na medida que coloco essas narrativas no jogo, há uma provocação natural para que as pessoas contem suas próprias histórias, mencionando outras mulheres incríveis - as próprias mães, tias e irmãs, por exemplo. Isso vai alimentando o recorte", detalha.

Não à toa, o registro oral e o diálogo fomentado são os pontos do projeto mais destacados pelo poeta, produtor cultural e contador de histórias Talles Azigon, que participou de algumas edições, entre elas a da Floresta do Curió, dentro da iniciativa capitaneada pela Biblioteca Comunitária do bairro.

"A Paula consegue contar as histórias como se fosse nossa mãe contando as realizações de uma parente distante. É algo muito afetivo e profundo. Você sai com a sensação de que assistiu a algo que diz respeito a você", conta. "Para nós, do Curió - lugar que tem um protagonismo feminino muito forte - foi emocionante ouvir as histórias contadas por mulheres que construíram o local".