Troca de comando no PL Ceará tenta ajustar divergências para eleições de 2026
André Fernandes seria mais sensível ao apoio de nomes que não sejam ligados historicamente ao campo conservador
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A ascensão do deputado federal André Fernandes ao posto de presidente do diretório estadual do Partido Liberal (PL) no Ceará carrega consigo a busca pela resolução de divergências internas, visando arrumações oposicionistas para as eleições do próximo ano.
Na conjuntura atual, o partido vive um momento decisivo, em que tem como responsabilidade a administração do bom resultado nas eleições para a Prefeitura de Fortaleza em 2024 e a tarefa de organizar uma chapa competitiva para o pleito de 2026.
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O anúncio oficial de Fernandes na direção do PL Ceará deve ocorrer em 15 de julho e a expectativa é que a posse aconteça em 1º de agosto. No comando do partido, o político deverá decidir as chapas proporcionais e a estratégia de participação nas disputas majoritárias — incluindo a destinação de verbas e a coordenação da campanha presidencial no Estado.
A escolha de André Fernandes para o posto de dirigente teria sido definida pelos membros locais do PL, com a chancela de líderes nacionais, inclusive do ex-presidente Jair Bolsonaro e do presidente nacional Valdemar Costa Neto.
Carmelo Neto, atual presidente do diretório cearense, não se manifestou sobre a situação e não respondeu aos questionamentos endereçados a ele pela reportagem. Nessa quarta-feira (18), o político não foi localizado em seu gabinete ou no Plenário da Assembleia Legislativa do Estado do Ceará (Alece).
'Mais capital político'
Ao PontoPoder, o vereador de Fortaleza Julierme Sena considerou a troca na presidência do PL Ceará como “um processo interno”. De acordo com ele, o movimento ocorreu por André Fernandes ter se consolidado “como a maior liderança de oposição” do estado e com um “capital político gigantesco”.
Julierme ponderou que Carmelo realizou um “grande trabalho” ao organizar o partido e, segundo ele, ampliar a base eleitoral nos municípios cearenses. “Contudo, o deputado federal André Fernandes terá uma nova missão à frente do PL estadual, sobretudo a de coordená-lo nas próximas eleições que se avizinham”, concluiu o parlamentar.
Também integrante do Legislativo municipal da capital cearense, Priscila Costa confirmou as datas e atribuiu a medida ao empenho do dirigente nacional de “respeitar o protagonismo dos parlamentares localmente”.
“A gente percebe do presidente Valdemar o quê? Vamos preparar a casa para 2026, sem ignorar o que foi posto em 2024. André quase foi eleito prefeito da 4ª maior capital do País, então é legítimo que ele, enquanto deputado federal, possa ser considerado para iniciar um novo ciclo”, argumentou a vereadora.
Segundo ela, é preciso “dar continuidade para os esforços do presidente Carmelo Neto” em função de 2026. A política disse que viu “com naturalidade” a movimentação e que não considera que possíveis discordâncias serviram de “motivação para troca”.
Indagada sobre a missão do presidente escolhido, ela tratou a situação como um “desafio ainda maior”. Entre as dificuldades, listou o fato de presidir para todo o estado, os movimentos que afetam e são afetados pelas decisões nacionais e a necessidade de terem “mais maturidade e habilidade” para estabelecer um diálogo com outros partidos.
“Houve entendimentos entre os próprios deputados do partido no estado. Eu, o deputado Matheus Noronha e o próprio André Fernandes decidimos juntos”, reforçou o deputado federal Jaziel Pereira, em Brasília.
A versão de Jaziel ratificou a dos outros liberais ouvidos pela reportagem com relação ao acúmulo do escolhido. “O André foi muito bem experimentado e provado nas urnas”, justificou.
“[André] tem capital político bem maior que o deputado Carmelo. Candidato quer ganhar e ser vitorioso, e ele, no momento, agrega mais”, continuou, afirmando ainda que a solicitação foi apresentada para a Executiva nacional e, com isso, foi acordada a nova condução.
O PontoPoder consultou os demais políticos do PL com mandato na Assembleia Legislativa do Estado do Ceará (Alece), na Câmara Municipal de Fortaleza (CMFor) e tentou localizar os parlamentares cearenses da legenda com cadeiras na Câmara dos Deputados para se manifestarem sobre o assunto. Os partidários procurados não responderam aos questionamentos enviados pela reportagem. O conteúdo será atualizado caso haja alguma devolutiva.
Divergências em jogo
Dois nomes já são ventilados como pré-candidatos ao Senado Federal pelo PL Ceará: Priscila Costa e o deputado estadual Alcides Fernandes. Enquanto a vereadora ganhou um incentivo da ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro, o pai de André Fernandes foi citado pelo próprio Jair Bolsonaro como o seu candidato para uma vaga na Casa Legislativa.
Na ocasião da fala do ex-presidente, Alcides celebrou a lembrança. “O nosso eterno presidente Jair Bolsonaro bateu o martelo que o candidato dele ao senado é Alcides Fernandes. Eis-me aqui, sou realmente a pessoa indicada pelo nosso presidente”, disse ele.
Nessa quarta-feira (18), Priscila afirmou que, em pesquisas, seu nome “tem aparecido de uma forma muito importante” entre os citados. O processo de escolha, afirmou ela, dependerá de uma discussão partidária sobre a melhor estratégia. “O bom é que a gente está bem servido de nomes”, concluiu.
A indicação de dois nomes do Partido Liberal pode até acontecer, mas reduziria os espaços que podem ser ocupados por partidos aliados caso acordem por um projeto político de oposição conjunto. Caberá, principalmente, a André Fernandes decidir qual será a tática.
Bastidores indicam ainda uma incompatibilidade entre alas, a dos liberais mais ideológicos que buscam uma “candidatura raiz” e a dos que são mais sensíveis ao apoio de nomes que não sejam ligados historicamente ao campo conservador.
O protagonismo da ala conservadora inibiria a adesão a uma candidatura de oposição representada pelo ex-ministro Ciro Gomes (PDT) ou pelo ex-prefeito fortalezense Roberto Cláudio (sem partido) para o Palácio da Abolição em 2026, como tem sido aventado.
Uma das figuras do PL atribuiu a destituição de Carmelo Neto a esse aspecto. De acordo com ela, o presidente do PL Ceará se recusava a apoiar um dos dois nomes e teria defendido a preferência pelo nome do senador Eduardo Girão (Novo).
A informação da rejeição de Carmelo aos nomes de Ciro e Roberto, entretanto, não foi confirmada pelos demais e não condiz com declarações do próprio parlamentar de que teria organizado o encontro de Jair Bolsonaro com o ex-prefeito, no fim do mês passado, em um hotel de Fortaleza.
Após o encontro, durante o café entre membros da oposição do dia 3 de junho, na Alece, Carmelo chegou a elogiar Roberto publicamente. Porém, reforçou que o nome que deverá representar o agrupamento na corrida eleitoral do próximo ano ainda será definido.
Em sua fala, Carmelo listou como pretensos candidatos: Eduardo Girão, o deputado federal Moses Rodrigues (União), o prefeito de Juazeiro do Norte, Glêdson Bezerra (Podemos), e o ex-deputado federal Capitão Wagner (União).
Na última visita que fez à Fortaleza, Bolsonaro direcionou os questionamentos sobre uma aproximação com Ciro Gomes para André Fernandes. “Conversa com o André [Fernandes] aí”, respondeu quando foi questionado pelo PontoPoder acerca da atração do ex-ministro do primeiro Governo Lula.
Em fevereiro, à Coluna de Wagner Mendes no Diário do Nordeste, Fernandes defendeu independência inegociável do PL para o Governo do Ceará e para o Senado Federal em 2026. “Pelo tamanho do partido, pelo resultado de 2024 e pela conjuntura atual, o PL não abrirá mão disso”, disparou.
A posição mais recente demonstra que André retrocedeu e já pensa em uma candidatura conversada com as demais agremiações. “Nós estamos dialogando e eu tenho certeza que dessa união de toda a oposição, nós teremos bons nomes para o Senado e também para o Governo do Ceará”, disse ele num café de políticos opositores na CMFor, em 19 de maio.
Cenário semelhante ao de 2023
A liderança de André Fernandes já era sinalizada após o resultado obtido nas urnas. Apesar de derrotado, ele disputou o segundo turno do pleito e obteve um quantitativo de aproximadamente 10 mil votos a menos que o eleito, Evandro Leitão (PT).
O contexto de escolha de Fernandes para a direção do PL Ceará se assemelha ao desafio que teve ao assumir a presidência do PL Fortaleza, em 2023: o de comandar a sigla num cenário de preparativos para uma eleição municipal e de dirigir um partido com divergências.
A diferença entre o grupo de André Fernandes e o então presidente estadual, Acilon Gonçalves, então prefeito de Eusébio, era um dos pontos em questão. Naquele período, Acilon vivia uma instabilidade na direção do partido, devido ao alinhamento que tinha com os Ferreira Gomes e membros da gestão estadual.
O emparedamento do ex-mandatário de Eusébio acontecia desde a entrada de Jair Bolsonaro nas fileiras liberais, em 2021, e de aliados do ex-presidente no ano seguinte. Em 2022, o PL, que antes era aliado do Partido dos Trabalhadores (PT) na administração estadual, apoiou uma candidatura de oposição ao Governo do Ceará.
Em 2023, Acilon Gonçalves renunciou a presidência do PL Ceará e expôs, numa carta, que “divergências de entendimento com outros membros da sigla” motivaram essa definição. Um dia depois da renúncia, Carmelo Neto foi empossado como o novo presidente.
A acomodação de Carmelo na direção partidária sanou uma disputa interna pela vaga de candidato ao Executivo de Fortaleza — pela qual duelou com André Fernandes. Em comum acordo, Carmelo desistiu do embate e o deputado federal levou a melhor, sendo lançado como o candidato do PL ao Palácio do Bispo em 2024.
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