Escolas em favelas do CE estão em locais com menos árvores, rampas, calçadas e vias pavimentadas
A maior diferença, em comparação a unidades de ensino fora dessas localidades, foi em relação à arborização.
Entre os diversos aspectos investigados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) no Censo Demográfico 2022 estão as características do entorno de domicílios e estabelecimentos. Nesta sexta-feira (5), novas informações divulgadas abordam esses dados especificamente em favelas e comunidades urbanas.
No Ceará, esse levantamento demonstra a carência de algumas infraestruturas próximo a escolas que estão localizadas nesses territórios, em comparação com unidades de ensino fora deles.
Para esta reportagem, o Diário do Nordeste selecionou alguns dos quesitos com maiores diferenças proporcionais entre as características no entorno dessas unidades de ensino no Estado e na Capital. O levantamento do IBGE coletou informações sobre os seguintes aspectos:
- Arborização;
- Capacidade de circulação da via;
- Existência de bueiro ou boca de lobo;
- Existência de calçada ou passeio;
- Existência de iluminação pública;
- Existência de obstáculo na calçada;
- Existência de ponto de ônibus ou van;
- Existência de rampa para cadeirante;
- Pavimentação da via;
- Vias sinalizadas para bicicletas.
O IBGE classifica como favelas e comunidades urbanas os territórios populares “originados das diversas estratégias utilizadas pela população para atender, geralmente de forma autônoma e coletiva, às suas necessidades de moradia e usos associados (comércio, serviços, lazer, cultura, entre outros), diante da insuficiência e inadequação das políticas públicas e investimentos privados dirigidos à garantia do direito à cidade”.
No Brasil, esses espaços se manifestam em diferentes formas e nomenclaturas, como favelas, ocupações, comunidades, quebradas, grotas, baixadas, alagados, vilas, ressacas, mocambos, palafitas, loteamentos informais, vilas de malocas, entre outros, expressando diferenças geográficas, históricas e culturais na sua formação.
A maior das discrepâncias percebidas na análise foi na arborização. Neste caso, 46% das 355 escolas localizadas nas comunidades urbanas do Ceará não possuem árvores em seu entorno, enquanto essa proporção é de 30% entre as 1.345 unidades fora de favelas — uma distância de 16 pontos percentuais.
Esse é um aspecto essencial para a qualidade de vida nas cidades, uma vez que ela contribui para o bem-estar ao oferecer benefícios ambientais, sociais e econômicos, ajudando a reduzir temperatura, melhorar a qualidade do ar e controlar de enchentes. Em um cenário de mudanças climáticas e frequentes ondas de calor, crianças de até 10 anos estão ainda mais vulneráveis a sintomas como cansaço, dor de cabeça e mal-estar causados pelo calor.
“As áreas verdes proporcionam espaços de lazer e recreação, promovendo a saúde mental e física dos moradores. Ao integrar os resultados da pesquisa urbanística com práticas de arborização, os municípios podem criar ambientes urbanos mais sustentáveis e agradáveis, melhorando a qualidade de vida de seus habitantes”, aponta o IBGE.
Acessibilidade e outros aspectos importantes
A falta de rampa para acessibilidade de pessoas em cadeiras de rodas foi o segundo aspecto com maior diferença entre as escolas dentro e fora de comunidades. Em favelas e comunidades, o entorno de 275 escolas (77% do total) não tem o rebaixamento de calçada ou meio-fio/guia voltado para a acessibilidade. Em instituições fora desses territórios, apesar de a proporção também ser alta (68%), a diferença é de 9 pontos percentuais.
O IBGE destaca que essas rampas desempenham um papel essencial na acessibilidade urbana, uma vez que permitem que cadeirantes e outras pessoas com mobilidade reduzida — como idosos, gestantes e crianças — transitem de forma segura entre a calçada e a rua.
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Além de reduzirem o risco de quedas, elas contribuem para a inclusão social ao permitir que esses públicos participem mais ativamente na vida urbana. “Rampas adequadas nas calçadas são necessárias para garantir que todas as pessoas possam desfrutar plenamente dos espaços públicos urbanos de maneira segura e independente”, afirma o Instituto.
Calçadas ou passeios
Já as calçadas ou os passeios estão ausentes no entorno de 15% das escolas em favelas e comunidades cearenses (53), contra 8% das unidades de ensino fora desses territórios (350). Nesse quesito, o IBGE considerou a existência ou não de um espaço disponível para circulação de pelo menos um pedestre — cerca de 80 cm — separada daquela destinada à circulação de veículos.
Aspecto fundamental para a infraestrutura urbana, as calçadas ou os passeios fornecem segurança e reduzem o risco de acidentes. Se forem bem planejadas e não tiverem obstáculos, eles também garantem acessibilidade para todos os públicos que a utilizem.
“Calçadas bem cuidadas valorizam os imóveis e o espaço urbano como um todo, elas podem ser usadas para paisagismo, áreas de descanso, arte urbana e mobiliário público, tornando a cidade mais atraente, além de promoverem modos de transporte mais sustentáveis, como a caminhada, ajudando a reduzir a poluição e o congestionamento urbano”, complementa o Instituto.
Pontos de ônibus ou van e pavimentação
Um aspecto que atinge a maioria das escolas, dentro e fora de comunidades urbanas, é a falta de sinalização ou abrigo para a parada de ônibus ou vans. Ainda assim, proporcionalmente, esse problema atinge mais aqueles estabelecimentos nas favelas, uma vez que foi observado no entorno de 321 delas (90%). Entre as que estão fora desses territórios, 3.704 escolas (84%) também não possuíam sinalização visível de parada de transporte público.
“O ônibus é a forma de transporte público e coletivo mais comum nas cidades e a indústria de ônibus no Brasil é uma das maiores do mundo. A existência deste transporte cumpre a necessidade de circulação de pessoas para a realização das atividades sociais, culturais, políticas e econômicas consideradas necessárias na sociedade”, defende o IBGE.
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Já a falta de pavimentação do entorno das escolas atinge 10% das unidades nas comunidades urbanas (34), frente a 4% das escolas fora delas (169). Para esse aspecto, o IBGE considerou a via pavimentada quando, na pista de rolamento, mais de 50% do trecho analisado tiver alguma cobertura, como asfalto, cimento, paralelepípedos ou calçamento poliédrico, entre outros.
A presença da cobertura protege o solo pelo tráfego; facilita o transporte de mercadorias e serviços, impulsionando a economia local e regional; reduz poeira, lama e barulho; e melhora o acesso a serviços essenciais. “A pavimentação das vias públicas é fundamental para o desenvolvimento urbano e a qualidade de vida dos cidadãos. Esses fatores juntos contribuem para cidades mais eficientes, seguras e agradáveis para se viver”, destaca o Instituto.
Cenário em Fortaleza
Em Fortaleza, o IBGE elencou 261 escolas em favelas e comunidades urbanas e 2.075 fora delas. Os resultados da Capital são próximos do que foi encontrado para o Estado, mas as diferenças são ainda mais acentuadas quando se fala da falta de pontos de ônibus/van e de calçada/passeio.
Desse total das escolas nessas localidades, 89% não tem ponto de ônibus ou sinalização no entorno e 14% não possui calçadas ou passeios na sua proximidade. Enquanto isso, nas escolas fora das comunidades, 77% não possui pontos de ônibus/van na proximidade e 3% não conta com calçadas ou passeios.
Assim, as diferenças são de:
- A falta de parada de ônibus ou sinalização é 12 p.p. maior perto de escolas em favelas e comunidades urbanas;
- A falta de calçadas ou passeios é 11 p.p. maior no entorno desses estabelecimentos.
Mas a maior diferença, de 18 p.p., também ocorre em relação à arborização. Quase metade das escolas em favelas e comunidades urbanas (49%) não tem árvores no entorno, enquanto esse problema atinge 31% dos estabelecimentos fora desses territórios.
Pesquisa Urbanística do Entorno dos Domicílios
A Pesquisa de Entorno foi aplicada em cerca de 340 mil setores censitários — a menor unidade territorial de coleta dos dados — selecionados em todos os municípios brasileiros, além do Distrito Estadual de Fernando de Noronha e do Distrito Federal.
O levantamento considerou áreas urbanizadas mapeadas pelo IBGE e setores censitários — identificados por meio de imagens de satélite — que apresentam concentração de estruturas, edificações e domicílios, independentemente de serem classificados como urbanos ou rurais.
Dessa forma, o Instituto ressalta que a população total do universo da pesquisa não corresponde à população total do Brasil, uma vez que parte da população brasileira habita em domicílios que não foram contemplados na pesquisa.
O questionário foi preenchido a partir da observação dos agentes censitários, sem contato ou interlocução com informantes. A coleta das informações sobre essas características urbanísticas foi realizada entre 20 de junho a 31 de julho de 2022, antes da coleta domiciliar.
Em algumas situações, quando faces foram incluídas pelo recenseador durante a coleta domiciliar ou em áreas de Povos e Comunidades Tradicionais em contexto urbano, essas informações também foram registradas. Com isso, o período durou até 28 de maio de 2023.