Atropelamentos em rodovias do CE ocorrem mais no fim da tarde ou à noite, diz pesquisa
Ao todo, entre 2018 e 2024 ocorreram mais de 10,2 mil sinistros, com vítimas feridas em 72% deles.
Entre 2018 e 2024, as rodovias federais que cortam o Ceará registraram 700 atropelamentos de pedestres. Após uma queda entre 2020 e 2022, na comparação com os anos anteriores à pandemia de Covid-19, os números voltaram a subir nos últimos dois anos. Em todo o período analisado, 63% dos casos ocorreram ao anoitecer ou durante a noite.
A tendência se repete em Fortaleza, que contabilizou 262 atropelamentos no mesmo intervalo, e no Brasil como um todo. Depois de registrar o menor número da série em 2021, a capital cearense viu os casos voltarem a subir e chegarem a 45 em 2024 — o maior patamar desde antes da pandemia. A maior parte dos sinistros que ocorreram na Cidade também foram nos períodos de menor luminosidade.
Esses dados fazem parte de um estudo divulgado na última quarta-feira (10) pela Fundação Dom Cabral (FDC) e realizado a partir de registros da Polícia Rodoviária Federal (PRF) e do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT). O levantamento reúne análises diversas, com informações sobre os sinistros registrados nas rodovias, tipo de veículo, tipo de traçado viário, dia da semana, período do dia, condições climáticas, entre outras.
Aproximadamente de 84% dos atropelamentos registrados ao longo dos sete anos analisados ocorreram em duas rodovias: a BR-116 — que cruza o Ceará ligando Fortaleza a Penaforte, no Cariri, e teve 335 casos (47,9%) — e a BR-222 — que corta o Estado de leste para oeste e teve 254 atropelamentos (36,3%).
Esses 700 atropelamentos de pedestres representaram 6,8% dos mais de 10,2 mil sinistros registrados em rodovias federais no Ceará em todo o período analisado, incluindo colisões, tombamento e queda do ocupante do veículo, entre outros. Porém, são eles que têm a maior proporção de ocorrências após o anoitecer. Em segundo lugar, aparecem as colisões frontais, com 51,2% das notificações nesse período do dia.
Rodovias inseguras para pedestres e ciclistas
Dante Rosado, coordenador da Iniciativa Bloomberg de Segurança Viária Global no Brasil, aponta a iluminação e a visibilidade nesses períodos do dia como fatores que levam a essas ocorrências. Mas o maior agravante, de acordo com ele, é a ausência de infraestrutura para as pessoas que caminham nesses locais. “As rodovias costumam ser projetadas sem considerar adequadamente pedestres e ciclistas”, afirma.
O professor Paulo Resende, diretor do núcleo de Infraestrutura e Logística da Fundação Dom Cabral, também cita a falta de infraestrutura apropriada para esse público. Em estudos anteriores da instituição, ele explica que se constatou a tendência de “uma altíssima taxa de severidade” nas ocorrências — incluindo atropelamento de pedestres — em áreas próximas às cidades.
“Várias dessas rodovias não têm passarelas suficientes para evitar o cruzamento de pedestres, principalmente à noite”, pontua. “Existe um trânsito muito grande de pessoas passando nas rodovias o tempo inteiro, e o nosso estudo mostra que, nas áreas mais próximas das cidades, esse índice de atropelamento aumenta, com grande taxa de severidade”, afirma.
Nesse contexto, Dante Rosado aponta que apenas melhorar a iluminação nessas áreas não garante a segurança de pedestres e ciclistas. De acordo com ele, é essencial implementar calçadas e outras estruturas que os separem do tráfego de veículos em trechos com pessoas caminhando e pedalando.
Além disso, Rosado aponta que é fundamental controlar a velocidade, uma vez que esse é o principal fator de risco para a ocorrência de sinistros graves. “Isso pode ser alcançado por meio da redução dos limites de velocidade, instalação de lombadas e uso de fiscalização eletrônica. Todas essas medidas devem ser priorizadas nos trechos mais críticos, identificados a partir dos dados de sinistros”, defende.
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Desafios para a redução dos índices
Os painéis com os dados do estudo realizado pela Fundação Dom Cabral mostram que, considerando todo o Brasil, o número de sinistros de trânsito nas rodovias federais, em 2024, foi maior do que em todos os anos anteriores, desde 2018. A quantidade de mortes (mais de 4,9 mil) e feridos graves (quase 16 mil) também foi a mais alta em toda a série histórica analisada.
No Ceará, o número de feridos graves reduziu entre 2019 e 2022, quando atingiu 390, mas voltou a crescer em 2023 e chegou a 489 em 2024. Já o número de mortes em rodovias federais no Estado foi de 179 em 2024, mesmo patamar de 2021 e de 2018. O ano que registrou o menor volume de mortes nesse tipo de estrada foi 2023, com 131 óbitos.
Para o professor Paulo Resende, há três aspectos que explicam os desafios atuais para reduzir os sinistros nas rodovias federais. Ele exemplifica que, atualmente, já não são construídas curvas tão fechadas, mas que o País “envelheceu” com esse tipo de infraestrutura, principalmente em terrenos montanhosos. “[Também não se faz mais] cruzamento sem um tratamento. Um carro ou uma moto que entra direto na pista”, acrescenta.
Outro exemplo citado pelo professor é o tipo de pista presente nas estradas brasileiras. Em todo o País, metade dos sinistros ocorrem em pistas simples, mas, considerando os casos mais severos, quase 70% dos sinistros com mortes ocorrem nesse tipo de infraestrutura.
No Ceará, elas são palco de 53% dos sinistros em rodovias federais e de 73,5% das ocorrências com óbito. “A pista simples é um grande perigo, e a predominância, nas rodovias federais, é de pistas simples”, afirma.
Junto a isso, ele elenca questões comportamentais dos condutores, como dirigir em alta velocidade, e a presença de um “mix de veículos” trafegando juntos nas BRs. “[Existe] uma mistura perigosa, nas BRs. Veículos com altíssima capacidade, veículos longos, como caminhão trator, e moto. Isso acontece muito nas imediações das cidades”, finalizou.