O legado de Arnaldo Jabor no cinema: ‘Fez parte de uma geração brilhante e inquieta'

Grandes nomes da arte nacional, a exemplo do cearense Rosemberg Cariry, repercutem morte do jornalista e realizador carioca nesta terça-feira (15)

Escrito por Diego Barbosa e Antonio Laudenir , verso@svm.com.br
Legenda: A exemplo de outros nomes do Cinema Novo, Jabor tinha uma imensa preocupação em desvendar o Brasil real
Foto: Divulgação

Falecido nesta terça-feira (15) aos 81 anos, Arnaldo Jabor colecionou triunfos no cinema. Duas vezes indicado à Palma de Ouro do Festival de Cannes e vencedor do Urso de Prata no Festival de Berlim, o também jornalista atuou como roteirista e diretor. Dos apelos íntimos à exposição das fraturas nacionais, tudo se via sob as lentes do carioca.

Um dos expoentes do Cinema Novo – resposta ao cinema tradicional do final da década de 1950, dando ênfase a preocupações sociais e totalmente enraizado na cultura brasileira – Jabor muito contribuiu para a sétima arte nacional e latino-americana. Nas palavras de Rosemberg Cariry, “ele fez parte de uma geração brilhante e inquieta”.

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“Uma contribuição que vai além do cinema e da estética, pois entra também no campo das ideias culturais e da própria identidade brasileira”, sublinha o cineasta, roteirista, documentarista, produtor e escritor cearense. 

Dos nove filmes dirigidos por Arnaldo, “Pindorama” –  primeiro longa-metragem de ficção de Jabor – é um dos preferidos de Rosemberg. Os aspectos barroco e antropofágico como metáfora do Brasil, segundo ele, são o ponto alto do projeto. 

“Esse tipo de discurso alegórico era uma prática corrente no Cinema Novo”, situa Cariry. “A chamada ‘Trilogia do Apartamento’, notadamente ‘Eu sei que vou te amar’, também marcaria um momento importante da carreira dele, sobretudo na conquista do público”.

Legenda: Dos nove filmes dirigidos por Arnaldo, “Pindorama” – primeiro longa-metragem de ficção de Jabor – é um dos preferidos de Rosemberg Cariry
Foto: Divulgação

De fato, a obra não apenas concorreu à Palma de Ouro em Cannes, no ano de 1986, como também rendeu à Fernanda Torres, protagonista da película, o prêmio de Melhor Atriz no festival. A exemplo de outros nomes do Cinema Novo, Jabor tinha uma imensa preocupação em desvendar o Brasil real, tocar nas feridas mais profundas, ao mesmo tempo em que se aventurava pelo imaginário. 

Um cinema que, em algumas fases, aproxima-se do teatro enquanto linguagem e mise-en-scène; e também da literatura e da filosofia, tendo em vista as inquietações existencialistas dos diálogos – notadamente na fase mais intimista, quando traduz de forma brilhante os ecos da prosa de Nelson Rodrigues (1912-1980).

Além dos já citados “Pindorama” e “Eu sei que vou te amar”, são criações de Arnaldo os filmes “O Circo”, “A Opinião Pública”, “Toda nudez será castigada”, “O Casamento”, “Tudo Bem”, “Eu te amo” e “A Suprema Felicidade”.

Estilo provocante

Referenciando por Rosemberg Cariry como dono de uma “forma de pensar e de fazer cinema bem original, com um estilo quase sempre provocante”, Arnaldo Jabor Jabor foi cineasta, escritor, jornalista, roteirista e produtor. E todas essas atividades desenvolveu com brilho – embora sempre envolto em polêmicas.

“No início, com posições mais à esquerda e crítica do status quo; depois, já quando trabalhava na Globo, mais conservadora e próxima do pensamento liberal. Como todo homem de grandeza, Arnaldo Jabor viveu as suas próprias contradições e as contradições do seu tempo”, observa o cearense.

De forma particular, Rosemberg guarda por ele uma gratidão especial. Quando o filme “Corisco e Dadá” (1996) foi apreendido e impedido de ser exibido, Jabor foi uma das vozes que se levantou em protesto contra esse fato em jornal nacional. 

“Podíamos não concordar com tudo o que ele dizia ou com todas as suas posições políticas, mas é impossível negar que era um homem corajoso. É difícil localizar a herança que ele deixou, mas diria que ela existe de forma difusa, como legado cultural e estético – sobretudo uma marcante sobrevivência estética da sua fase mais intimista e da crítica social de costumes. Acho que Jabor deixa um legado duradouro”.

Lamento pela perda

Outras importantes vozes do meio artístico lamentam a partida do realizador carioca. A atriz e humorista Dadá Coelho foi uma das primeiras a manifestar condolências. “Arnaldo Jabor partiu. Meus sentimentos à família, amigos”, publicou.

João Barone, baterista do Paralamas do Sucesso, também escreveu uma mensagem. “Arnaldo Jabor, sempre genial e incisivo, vai fazer muita falta”. A atriz Fernanda Paes Leme e o ator José de Abreu igualmente expressaram tristeza pela partida. “Descanse em paz, Arnaldo Jabor”, afirmou a primeira; “RIP Arnaldo Jabor”, publicou o segundo.

A cantora Fafá de Belém desejou que o cineasta descanse em paz. Já a atriz e apresentadora Regina Casé recordou alguns episódios com o carioca, destacando: “Serei sempre grata ao Jabor por ter chamado aquela garota que estava começando a fazer teatro no Asdrubal pra fazer cinema!”.

Arnaldo Jabor estava internado desde o dia 17 de dezembro do ano passado no Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo, após sofrer um acidente vascular cerebral. De acordo com a família, a causa da morte está ligada a complicações do AVC.

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