'Homem com H' apresenta vida e obra de Ney Matogrosso sem pudores na forma e na narrativa
Estrelada por Jesuíta Barbosa, cinebiografia do cantor estreia nos cinemas brasileiros nesta quinta, 1º de maio

O gênero da cinebiografia dificilmente alcança resultados que vão além de uma apresentação didática e reverente à figura retratada/homenageada. Fatos marcantes e fundantes são apresentados, acompanha-se a formação, o sucesso, os percalços — o modelo é costumeiramente seguido à risca.
Dedicado à vida e obra do cantor Ney Matogrosso e com Jesuíta Barbosa no papel principal, “Homem com H” se vale da fórmula, apresentando o artista em um amplo escopo temporal, mas se destaca pela inspiração e ousadia nas escolhas.
Na forma, a obra, que estreia nesta quinta, 1º de maio, reflete o próprio biografado, na ambivalência entre o desbunde e a contenção.
O projeto tem roteiro e direção de Esmir Filho, nome que despontou no audiovisual brasileiro nos anos 2000 com obras tão específicas quanto o curta “Tapa na Pantera” (2006) — popularizado como meme na internet — e o cult “Os Famosos e os Duendes da Morte” (2009).
Veja também
O filme apresenta sequências iniciais centradas na infância de Ney, nos anos 1940, em especial na relação dura com o pai — um militar que diz que “não terá filho artista” — e terna com a mãe — dona de casa que leva o filho ainda pequeno para ver a vedete Elvira Pagã. Ambas são fundantes para os caminhos que ele construiria para si.
O roteiro segue para a significativa passagem dele pelas forças armadas, os primeiros contatos com arte, as expansões artísticas e pessoais, o início e a separação do grupo Secos & Molhados, os amores de Cazuza e Marco de Maria e várias outras situações identificáveis da trajetória de Ney.
Confira o trailer de "Homem com H"
Apesar de apresentá-la de forma narrativa clássica, “Homem com H” abre espaço para várias escolhas, tanto de história quanto de direção, que complexificam a obra.
Há elipses temporais e de contexto; sequências que escapam do concreto e apostam no simbólico ou na fantasia; e também abordagem frontal, no visual e na temática, em relação não somente ao sexo e à sexualidade, mas ao corpo e à corporeidade de Ney.
Não por acaso, as primeiras imagens divulgadas do longa-metragem que mostraram Jesuíta no papel do artista foram aquelas de fases icônicas do cantor, tanto na performance quanto na estética.

Dando vida ao cantor da juventude à maturidade, o ator pernambucano que viveu por anos no Ceará faz uma composição de Ney de maneira alinhada à proposta de tom do filme. Ainda que o trabalho de corpo e caracterização seja notável, Jesuíta é Ney pela alma que imprime em cada trejeito, olhar e movimento.
Com carreira construída ao longo da ditadura militar, Ney teve na ousadia e enfrentamento à censura e aos censores — oficiais, ligados ao regime, e “extraoficiais”, inclusive antes e depois dele — como base principal da obra e, também, da vida.
A voz singular, a androginia, as danças, a maquiagem, as roupas, os acessórios e a liberdade nas relações que deram o tom — ainda que, ao mesmo tempo, a explosão nos palcos tenha sido por vezes válvula de escape de desejos e sentimentos guardados em uma existência mais sóbria.

Seja nas performances ou na intimidade, “Homem com H” não se furta em retratar Ney sob um viés desejante, sem escapar de cenas de nudez, sexo e não apenas sugestivos movimentos de cintura e pélvis performados pelo protagonista.
A inserção dessa e outras ousadias do artista, bem como as ousadias de narrativa e forma empreendidas pelo próprio filme, fazem dele um relevante exemplo de produção entre cinebiografias.
O longa tem a benção do próprio Ney e faz disso uma oportunidade de abordar diferentes facetas, humanidades e ambivalências do homenageado; porque, justo por conta da ausência desses e outros pudores, “Homem com H” é acima de tudo uma devida homenagem ao artista.
Homem com H
- Quando: estreia nos cinemas na quinta, 1º de maio
- Mais informações: horários e locais das sessões no site Ingresso.com
Relembre outras cinebiografias da música brasileira
“Homem com H” se soma a uma série de produções do cinema brasileiro que apostam em contar as biografias de nomes importantes da música brasileira.
Contemporâneos do próprio Ney Matogrosso como Elis Regina, Gal Costa e Erasmo Carlos, por exemplo, ganharam filmes sobre as próprias trajetórias recentemente.
Cazuza, personagem em “Homem com H” com interpretação de Jullio Reis, por sua vez, teve a cinebiografia lançada ainda no começo dos anos 2000. Confira destaques dessa produção.
“Cazuza - O Tempo Não Para” (2004)

Dirigido por Sandra Werneck e Walter Carvalho, “Cazuza - O Tempo Não Para” se baseia no livro “Cazuza: Só as Mães São Felizes” e traz Daniel de Oliveira no papel principal. A produção teve mais de 3 milhões de espectadores nos cinemas.
- Onde assistir: nas plataformas Prime Video e Max ou para aluguel na AppleTV
“2 Filhos de Francisco” (2005)

Outra produção pioneira na popularização da cinebiografia musical, o filme de Breno Silveira é baseado história da dupla sertaneja Zezé Di Camargo e Luciano. Foram mais de 5 milhões de espectadores na passagem pelas salas de cinema.
- Onde assistir: nas plataformas Prime Video, Max e Globoplay ou para aluguel na AppleTV
“Tim Maia” (2014)

Com Babu Santana e Robson Marques no papel principal, o longa biográfico sobre o cantor Tim Maia teve direção de Mauro Lima. A obra foi adaptada em formato de minissérie na TV Globo.
- Onde assistir: nas plataformas Telecine e Prime Video ou para aluguel na AppleTV
“Elis” (2016)

Lançado em 2016, o filme traz Andreia Horta no papel da cantora Elis Regina. A direção é de Hugo Prata. Assim como “Tim Maia”, também foi reeditada e exibida na TV Globo em formato de minissérie.
- Onde assistir: nas plataformas Netflix, Globoplay e Prime Video
"Minha Fama de Mau" (2019)

A obra que conta a história de Erasmo Carlos desde a Jovem Guarda tem Chay Suede no papel principal e Lui Faria na direção.
- Onde assistir: nas plataformas Netflix, Globoplay e Prime Video
“Nosso Sonho” (2023)

O fenômeno recente da dupla Claudinho e Buchecha foi recontado no longa de Eduardo Albergaria. O filme foi a maior bilheteria do cinema nacional em 2023.
- Onde assistir: nas plataformas Netflix, Globoplay e Prime Video ou para aluguel na AppleTV
“Meu Nome É Gal” (2023)

Sophie Charlotte interpretou Gal Costa na cinebiografia da artista, que morreu antes da conclusão da produção. O fato fez a obra de Dandara Ferreira e Lô Politi precisar ser ampliada.
- Onde assistir: nas plataformas Globoplay, Telecine e Prime Video ou para aluguel na AppleTV