Casa de Juvenal Galeno completa 100 anos renovada por intensa diversidade cultural
Celebrado na sexta-feira (27), centenário circunscreve, na história cearense, o vigor de um lar cuja importância reflete a vocação pioneira e receptiva do emblemático morador
É de comum opinião que paira uma aura diferente nos espaços em que escritores viveram e frequentaram. Misto de enigma e fascínio, o sentimento se agiganta quando se trata sobretudo da casa deles. O que aquelas paredes resguardam de memórias e segredos? O que os cadernos amarelados escondem à vista nua? Que experiências foram compartilhadas ali, em meio à mobília e aos papéis onipresentes?
Não é difícil aprofundar essas questões na morada que um dia foi de Juvenal Galeno (1838-1931). Destacado na paisagem caótica do Centro da Capital pelo belo verde-turquesa da fachada, combinado com traços arquitetônicos do século XIX, o lar de um dos mais importantes literatos cearenses está sempre de portas abertas. Lá, não há burocracia para receber pessoas e instituições. Todos são convidados a conhecer os fatos e conquistas do homem que a ocupou.
O interesse é justificado: a residência detém grandioso prestígio, consolidado com o tempo. É equipamento ativo desde 1919, mantido pela Secretaria da Cultura do Estado (Secult-CE) - tornou-se também, há três anos, patrimônio histórico cultural, tombado pelo Conselho Estadual de Preservação do Patrimônio Cultural do Ceará (Coepa). E já recebeu visitas do porte de Patativa do Assaré, Luís da Câmara Cascudo, Rachel de Queiroz e Filgueiras Lima, que transitavam pelos cômodos de modo a fomentar a produção literária e promover diferentes olhares sobre a arte.
"Essa casa é um marco na nossa história", situa Antônio Galeno, bisneto de Juvenal e diretor do espaço. "Aqui, cada móvel e peça têm um significado e valor sentimental grande, que conta nossa trajetória literária. A relevância dela, assim, é enorme, e estamos recebendo as justas homenagens que esse lar precisa para o conhecimento das novas gerações".
O tributo na fala do gestor conecta-se a um incontornável momento. Trata-se do centenário da Casa de Juvenal Galeno, completado na sexta-feira (27). A data contará com programação especial em reverência à longevidade do espaço, convocando o olhar da sociedade para quem foi seu principal morador.
Raízes
Entre as atividades - que já se iniciam na terça-feira (24) e, neste primeiro instante, seguem até o dia 28 -, estão o lançamento de antologia organizada especialmente para a ocasião, sessões solenes, missa em ação de graças, lançamento de cordéis, palestra, apresentações musicais e teatrais, entre outras.
"Até o fim do ano, outros eventos culturais expressivos ainda acontecerão para comemorar o centenário", garante Antônio, recordando que o início da celebração conecta-se diretamente a abril deste ano, quando a casa sediou a coletiva de imprensa da XIII Bienal Internacional do Livro do Ceará. O evento homenageou Juvenal com uma arena, no Centro de Eventos, em alusão a seu lar.
Falando nele, a história do emblemático lugar (com ressonâncias inclusive internacionais) remonta ao ano de 1887, quando foi erguida a morada que seria de Galeno e dos sete filhos que gerou com Maria do Carmo Cabral Galeno. À época, a família - natural da Serra da Aratanha, no município de Pacatuba - veio a Fortaleza para otimizar a criação da prole e, por aqui, morou durante meio século na residência.
Após 32 anos, sob direção das filhas Henriqueta e Júlia Galeno, a casa oficialmente se tornou um equipamento cultural, que hoje congrega oito cômodos principais e 27 entidades. No correr do tempo, passou por reformas a fim de otimizar a circulação de pessoas. A última delas aconteceu em 2016, quando foi tombada.
Além de renovação da pintura e reparos nas instalações do prédio, as mudanças estruturais - que contaram com aporte de R$ 90 mil - oportunizaram a criação de mais dois ambientes, incluindo sala para serviços sociais, com ênfase na educação.
As medidas, em sintonia com o trabalho das entidades integrantes do equipamento, promovem frequência regular de eventos, movimentando o espaço. A programação fixa é diária, sendo a visita guiada um dos destaques, oportunidade de oxigenar os cômodos a partir da presença de públicos diversos.
Abrangência
Essa abertura para distintos setores da sociedade herda o espírito do dono da residência. Segundo o bisneto, "Juvenal Galeno era uma pessoa bastante expansiva. Participava de muitos grupos culturais, inclusive foi sócio-fundador do Instituto Histórico, Geográfico e Antropológico do Ceará; integrou o Centro Literário e também o movimento abolicionista", enumera.
Igualmente, foi pioneiro em muitos aspectos na seara literária do Estado. Ainda jovem, fez circular aquele que é considerado o primeiro jornal especializado em literatura do Ceará, "Sempre viva". Fundou também o jornal pioneiro da imprensa estudantil local, "Mocidade Cearense"; e, ao aportar no Rio de Janeiro, intensificou enlace com as letras mediante o contato com personalidades feito Machado de Assis, Quintino Bocaiúva e Joaquim Manoel de Macêdo.
Em solo carioca, escreveu "Prelúdios poéticos", livro considerado marco oficial da Escola Romântica do Ceará; e, com "Lendas e canções populares", passou a ser reconhecido nacionalmente como Criador da Poesia Popular Brasileira, título atribuído por nomes como Antônio Sales e Mário Linhares.
"A felicidade é grande por saber que o escritor deixou um legado tão bonito em nossa história, que só cresce com o apoio de quem por aqui passa e fica", vibra Antônio Galeno, ao percorrer, com o olhar, cada parede da morada do bisavô, também nossa, decorada com balões para a festa que se aproxima.
"A Casa de Juvenal Galeno chega aos 100 anos, assim, com vigor de uma criança, tal qual a disposição de seu morador. A atuação dela perante a comunidade tornou-a um centro influente de cultura. Merece ser valorizada e informada para quem ainda vem. Estamos dispostos a continuar esse legado", reitera o bisneto.
Vida longa ao múltiplo e intenso verde lar!
>> VEJA PROGRAMAÇÃO PREPARADA PARA O CENTENÁRIO:
Terça-feira (24/09)
16h - Lançamento da Antologia "Efeméride da Vida (Cultive Art Litterature Et Solidairté)" e Outorga de títulos
Local: Casa de Juvenal Galeno (Rua General Sampaio, 1128 - Centro)
Quinta-feira (26/09)
15h - Sessão solene em homenagem ao centenário da Casa de Juvenal Galeno
Local: Assembleia Legislativa do Estado do Ceará (Av. Des. Moreira, 2807)
Sexta-feira (27/09)
9h - Missa em Ação de Graças
Local: Igreja do Patrocínio (R. Guilherme Rocha, 536 - Centro)
9h45 - Bênçãos das instalações
Local: Casa de Juvenal Galeno
9h50 - Café da manhã/confraternização
10h - Lançamento do Cordel em comemoração ao centenário da Casa. Autor: Gerardo Frota (Pardal)
11h - Palestra Professor César Menezes Porto. Tema: Juvenal Galeno
19h - Sessão solene, no Auditório Henriqueta Galeno, com entrada festiva de Juvenal, com pronunciamento de Antônio Galeno , apresentação musical de Ósia Carvalho e cantores líricos: Alvarus e Auzeneide Cândido
Entrega de medalhas e diplomas
Encenação da peça teatral "Quem com ferro fere, com ferro será ferido", com o ator Oscar Roney
Sábado (28/09)
16h - Sessão solene de posse dos acadêmicos Cesar Menezes Porto, Célia Barreira Queiroz, Ivan Fernandes, e lançamento da Antologia da Academia de Letras Juvenal Galeno, "Lira Das Letras"
Local: Casa de Juvenal Galeno