Artesanato cearense tem muito a ver com “slow fashion”; entenda esse conceito da moda em ascensão

Produtos com versatilidade e durabilidade são as prioridades do consumidor local, conforme pesquisadores da UFC

Escrito por Roberta Souza e Mylena Gadelha , verso@verdesmares.com.br
Legenda: Catarina Mina em coleção criada por artesãs de Aracati
Foto: Foto: Jamille Queiroz

Aquela peça feita por uma rendeira cearense que você compra na praia tem uma estreita relação com o conceito de “slow fashion” e vamos te explicar o porquê. Longe de ser apenas uma “tendência”, este movimento imperativo na moda, com raízes fincadas na sustentabilidade, tem, há muito tempo, em nosso Estado, terreno fértil para se expandir.

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Essa foi uma das questões observadas pelos pesquisadores Érica Sobreira, Cláudia Buhamra e Clayton Silva, da Universidade Federal do Ceará (UFC), em estudo que identificou os perfis dos consumidores cearenses da chamada “moda lenta”, em tradução livre do termo em inglês.

“Identificamos a presença cada vez maior de marcas dessa natureza no Estado, o que sugere que este mercado está em ascensão por aqui. Por exemplo, algumas dessas marcas contam com uma cadeia produtiva responsável e justa que trabalha em parceria com artesãos cearenses sob a proposta do slow fashion”, explica Érica Sobreira em entrevista concedida à Agência UFC.

Como consumidora, a assistente comercial Bárbara da Silva Castro comprova esse dado.

“Não lembro a última vez que consumi um produto fora desse padrão. Eu tenho uma sacolinha ativa em vários brechós, à propósito. Com uma pesquisa básica nas redes sociais, você consegue encontrar facilmente muitos locais que se enquadram neste perfil e nos mais diversos estilos”, diz.
Bárbara da Silva Castro
Assistente comercial

Mas, afinal, o que é Slow Fashion?

Para melhor entender esta proposta, é comum revisitar um conceito contrário ao dela, o de “fast fashion”. De acordo com a consultora de moda do Senac Ceará, Beatriz Guedes, marcas que produzem de 38 a 42 coleções por ano acabam trabalhando com materiais mais nocivos ao meio-ambiente e de baixa qualidade, muitos deles produzidos com mão-de-obra escrava ou análoga à escravidão, e, por isso mesmo, são o oposto do “slow fashion”.

Logo, entre as características que devem ser observadas para o alinhamento com uma prática mais sustentável e socialmente respeitosa, Beatriz destaca:

  • Design atemporal;

  • Material durável;

  • Fibras naturais, recicláveis ou biodegradáveis;

  • Caráter de exclusividade;

  • Valor justo

“O ‘slow fashion’ nada mais é do que essa moda com menos pressa, feita para durar, para passar entre as gerações”, resume Beatriz. E isso está bem ligado às práticas artesanais do Ceará, não acha?

“Nós cearenses somos extremamente criativos e construímos em cima de uma pluralidade cultural muito forte uma identidade de moda tão forte quanto. Então, acredito que não seja uma tendência, mas sim uma prática natural e necessária para as marcas daqui”, afirma a consultora.
Beatriz Guedes
Consultora de Moda do Senac

Ainda no estudo recente desenvolvido pelos pesquisadores da UFC, aponta-se que os maiores compradores dessa “ideia” no Ceará são os consumidores do interior do Estado, e esse resultado pode ter uma relação direta com o consumo de peças do artesanato local.

“Considerando que o comércio na capital demanda maiores custos de estoque e distribuição de produtos para outras localidades, é possível que os preços de peças produzidas e comercializadas no Interior se tornem ainda mais acessíveis”, sugerem os autores. 

Legenda: O ‘slow fashion’ preza por produtos feitos para durar, para passar entre as gerações
Foto: Marilia Camelo

Prioridades do cearense

Por outro lado, a exclusividade, que muitas vezes encarece o produto, não é tão atrativa aos olhos do consumidor residente no Ceará. Na hora de comprar, a maior parte da população daqui não quer saber se a peça é rara, se tem edição limitada ou coisa do tipo.

“Uma proposta de consumo slow menos exclusiva poderia tornar o preço dos produtos mais acessível, atraindo um segmento de consumidores de fast fashion”, diz Clayton Silva, que também é professor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Piauí (IFPI), à Agência UFC. 

As prioridades do público local ao analisarem as peças - e aqui está o principal achado da pesquisa, na visão dos autores, são:

  • Versatilidade

  • Alta durabilidade 

A assistente comercial Bárbara da Silva Castro admite que passou a consumir mais sobre moda quando viu que ela poderia estar mais acessível.

“Eu nunca me importei com marcas famosas, mas com a qualidade do produto e o preço justo! Costumo dizer que hoje tenho mais respeito e menos apego às minhas peças, não só pelo preço, mas por toda a história que elas carregam. Da elaboração do produto à entrega dele, é uma experiência completamente diferente, você passa a se sentir parte do processo”, analisa.
Bárbara da Silva Castro
Assistente comercial

Dicas para adotar o “slow fashion” 

Para que essa proposta seja facilmente incluída no seu cotidiano, a consultora de Moda do Senac propõe algumas perguntas a serem feitas na hora da compra:

  1. Eu preciso disso?

  2. Eu vou usar isso?

  3. Eu gosto disso (tem a ver com meu corpo, a cor me favorece)?

  4. Como este produto foi feito? Será que foi de maneira ética?

  5. As pessoas que desenvolveram esta peça pensaram em matérias-primas menos nocivas ao meio ambiente e também em como elas vão se decompor?

  6. Esse produto é ergonômico? Ele ajuda a minha vida de alguma forma, é mais prático para mim ou para o coletivo? 

“Eu acho que essas práticas de parar para pensar, de parar para analisar, ajudam muito. Fora isso, quem quer começar a praticar o consumo consciente, não só na área da moda, mas na vida, precisa sim de informação”, finaliza Bárbara, num convite à leitura diária deste tipo de conteúdo.

 

 

 
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