Veja como foi o voto de Flávio Dino para condenar Bolsonaro e aliados da tentativa de golpe
A Primeira Turma da Corte julga, também, os outros sete réus envolvidos na trama golpista de 2022
O ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), seguiu o relator, o ministro Alexandre de Moraes, e votou pela condenação dos réus, incluindo o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), por tentativa de golpe no Brasil em 2022. Segundo a votar Dino, reforçou que o ex-presidente atuou como líder da organização criminosa. O magistrado, no entanto, ponderou que três réus tiveram atuação de "menor importância".
Em uma fala introdutória, Dino reforçou que debates e pressões realizados além dos autos não afetam a decisão dos magistrados. "Quem veste esta capa tem proteção psicológica suficiente para se manter distante disso, talvez por isso vista a capa", disse. O magistrado pontuou ainda que os crimes julgados no processo são "insuscetíveis de anistia".
"Esse é um julgamento como outro qualquer. Tecnicamente esse é um processo que se processa segundo regras vigentes no país, de acordo com fatos e provas nos autos e em termos isonômicos com milhões de ações penais que o STF já julgou. Mesmos fatos, mesmas leis, mesmos órgãos legalmente competentes no que concerne aos eventos ora em exame", disse.
O ministro defendeu que os réus e seus seguidores agiram efetivamente com violência e grave ameaça, relembrando declarações contra o cumprimento de ordens judiciais, rompimento de barreiras policiais, tentativas de ataque com uso de bombas e ameaça a juízes. "A violência é inerente a toda essa narrativa", disse.
"Veja que o nome do plano era Punhal, não era Bíblia Verde e Amarela. Os acampamentos não foram em porta de igreja (...) Creio que, se você está com o intuito pacifista, tem uma irresignação, você vai à missa, ao culto, quem sabe até acampa na porta da igreja, mas não, os acampamentos foram na porta dos quartéis"
Alexandre Ramagem, Augusto Heleno e Paulo Sérgio
No voto, o ministro Flávio Dino apontou diferentes níveis de responsabilidade entre os acusados. Segundo ele, o ex-presidente Jair Bolsonaro e o ex-ministro Braga Netto tinham o domínio dos eventos e protagonizaram as ameaças mais contundentes à democracia. Anderson Torres, então ministro da Justiça e Segurança Pública, também foi citado pela reunião ministerial, pela operação da PRF para dificultar o voto e pela minuta do golpe. Já Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, teria atuado em diversas frentes da trama.
O almirante Almir Garnier foi mencionado pelo magistrado pela aquiescência às iniciativas golpistas. Em relação ao general Paulo Sérgio, Dino destacou a convocação de reuniões e o envolvimento com a minuta de decreto, mas ponderou que sua análise é “mais difícil e sofisticada”. O ministro do STF afirmou que há provas de que o general participou da conspiração até certo momento, mas depois teria desistido diante da resistência de outros militares, como o general Freire Gomes e o brigadeiro Baptista Júnior.
Sobre Alexandre Ramagem, que comandava a Abin, Dino afirmou que ele buscou descredibilizar o sistema eleitoral. O general Augusto Heleno, chefe do GSI, foi incluído por participar de encontros estratégicos. Dino, no entanto, diferenciou o grau de culpabilidade.
Para ele, Bolsonaro, Braga Netto, Anderson Torres, Mauro Cid e Almir Garnier têm maior reprovabilidade, enquanto Paulo Sérgio, Heleno e Ramagem tiveram participação de “menor importância”, com eficiência causal reduzida — no caso de Ramagem, por ter deixado o governo em março de 2022; de Heleno, por não ter atos exteriorizados no segundo semestre; e de Paulo Sérgio, por aparentemente ter desistido da trama diante de resistências internas.
Após o voto de Dino, a sessão foi encerrada. Os ministros retornam ao caso na manhã de quarta-feira (10).
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Como foi o voto de Alexandre de Moraes?
Primeiro a votar no julgamento do "núcleo 1" da trama golpista, o ministro Alexandre de Moraes, se posicionou favorável à condenação de Jair Bolsonaro e de seus aliados por tentativa de golpe de Estado, organização criminosa, deterioração de patrimônio tombado e outros dois crimes contra o País.
"O Brasil quase volta a uma ditadura que durou 20 anos porque uma organização criminosa constituída por um grupo político não sabe perder eleições", disparou o magistrado.
Moraes é o relator do processo que imputa ao ex-presidente, especificamente, o crime de liderar o grupo que atentou contra o Estado Democrático de Direito.
Ele listou ainda ações que indicam os atos executórios da tentativa de golpe e citou declarações de Bolsonaro e de seus aliados com a finalidade de promover "desinformação" sobre o sistema eleitoral, o ato de 7 de Setembro, reunião com embaixadores e interceptação de eleitores feita pela Polícia Rodoviária Federal (PRF) no dia da eleição em 2022.
Além disso, foram mencionadas pelo ministro a reunião dos Kids Pretos, a tentativa de atentado à bomba no Aeroporto de Brasília e os atos violentos no dia da diplomação da chapa eleita, liderada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Ao imputar Bolsonaro como líder da organização criminosa, Moraes também relembrou as declarações do ex-presidente, apontadas como "ameaças ao Judiciário".
"Isso não é conversa de bar, não é alguém no clube conversando com amigo, isso é um presidente da República, no 7 de Setembro, a data da Independência de Brasil, instigando milhares de pessoas contra o Supremo Tribunal Federal, contra o Judiciário e, especificamente, contra um ministro do Supremo Tribunal Federal", disparou.
O que está em julgamento?
O STF julga a ação penal 2668, que trata de denúncia oferecida pela Procuradoria Geral da República (PGR). São acusados 31 réus, divididos em quatro núcleos:
- Núcleo 1: envolve oito réus, incluindo Bolsonaro, e é considerado o núcleo "central" ou "crucial" da articulação golpista.
- Núcleo 2: conta com seis réus que são acusados de disseminar informações falsas e ataques a instituições democráticas.
- Núcleo 3: é formado por dez réus associados a ataques ao sistema eleitoral e à preparação da ruptura institucional.
- Núcleo 4: sete réus serão julgados por propagação de desinformação e incitação de ataques às instituições.
Quem faz parte do 'núcleo 1'?
- Jair Bolsonaro, ex-presidente da República;
- Alexandre Ramagem, ex-diretor da Abin e atual deputado federal;
- Almir Garnier, almirante da reserva e ex-comandante da Marinha;
- Anderson Torres, ex-ministro da Justiça e ex-secretário de Segurança do DF;
- Augusto Heleno, general da reserva e ex-ministro do GSI;
- Mauro Cid, tenente-coronel da reserva e ex-ajudante de ordens da Presidência;
- Paulo Sérgio Nogueira, general da reserva e ex-ministro da Defesa;
- Walter Braga Netto, general da reserva e ex-ministro da Casa Civil, além de candidato a vice-presidente em 2022.
Quais são os crimes julgados?
- Tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito;
- Tentativa de golpe de Estado;
- Participação em organização criminosa armada;
- Dano qualificado;
- Deterioração de patrimônio tombado.
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Relembre a primeira parte do julgamento
O julgamento teve início na semana passada, quando foram ouvidos o relator do processo no Supremo, o ministro Alexandre de Moraes, e os argumentos da acusação, representada pelo procurador-geral da República, Paulo Gonet — que é favorável à condenação do grupo.
"A história nos ensina que a impunidade, a omissão e a covardia não são opções para a pacificação. A pacificação do País, que é o desejo de todos nós, depende do respeito à Constituição, da aplicação das leis e do fortalecimento das instituições", alegou Moraes em seu discurso, adiantando que o parecer da relatoria também deve ser favorável à condenação.
"Não há como negar fatos praticados publicamente, planos apreendidos, diálogos documentados e bens públicos deteriorados", acrescentou Gonet.
Depois, em um processo que durou dois dias, foram expostos os últimos argumentos da defesa. Na oportunidade, muitos dos advogados se limitaram a negar ou a tentar diminuir a participação dos réus na trama golpista, enquanto outros escolheram atacar o ministro relator — como no caso do defensor do general Augusto Heleno, ex-ministro do GSI — ou alegar defesa culpando outros no processo — como fez o criminalista Andrew Farias, representante do general Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa.