O que os candidatos à Prefeitura de Fortaleza propõem para a população LGBTQIA+

O Diário do Nordeste traz propostas elencadas nos planos de governo cadastrados no DivulgaCand

Dos nove candidatos à Prefeitura de Fortaleza, quase metade não possui nenhuma proposta para a população LGBTQIA+. 

Levantamento do Diário do Nordeste demonstra que as pessoas LGBTQIA+ — que envolve lésbicas, gays, bissexuais, pessoas trans e queers, intersexuais e assexuais, além de outras identidades — são citadas no plano de governo de apenas quatro candidatos. 

Das cinco candidaturas restantes, quatro não elencam nenhuma proposição para essa população. Na última delas, o plano de governo não cita pessoas LGBTQIA+, mas traz propostas voltadas para "homossexuais" — nomenclatura que não abarca todas as identidades desta população.

Quando citada nos planos de governo, a população LGBTQIA+ costuma surgir junto a outros grupos minorizados — como mulheres, pessoas negras, indígenas, entre outros —, com propostas abarcando todas essas ditas 'minorias'. Contudo, as demandas específicas desta comunidade são pouco abordadas pelas candidaturas. 

O Diário do Nordeste elencou as propostas para a população LGBTQIA+ de todos os candidatos à Prefeitura de Fortaleza. Confira: 

André Fernandes (PL)

O documento do plano de governo do candidato não cita o termo “LGBTQIA+” e não lista propostas para a área.

O plano de governo apresenta um eixo entitulado "Respeito e Valorização da Diversidade", no qual "reconhece a importância de valorizar as diferenças culturais, étnicas e sociais que compõem a identidade da cidade" e afirma que "serão promovidas políticas que incentivem a inclusão e a igualdade, combatendo todas as formas de discriminação e preconceito".

Capitão Wagner (União Brasil)

O documento do plano de governo do candidato não cita o termo “LGBTQIA+” e não lista propostas para a área.

Chico Malta (PCO)

O candidato faz propostas voltadas à população LGBTQIA+ em áreas como saúde, trabalho e segurança pública. No documento intitulado "Programa dos Comunistas: Construir o Poder Popular no Rumo do Socialismo", esta população surge junto a outros grupos minorizados, como mulheres e pessoas negras.

Por exemplo, é proposta a articulação da "empregabilidade de setores vulneráveis no mercado de trabalho como jovens, LGBTs, mulheres, negros e negras, PCDs, através de políticas públicas intersetoriais (envolvendo secretarias e coordenadorias)".

O caso é semelhante ao que ocorre na proposta de saúde, onde o candidato pretende implementar "políticas públicas efetivas e eficazes de promoção dos direitos da saúde da mulher, das juventudes, quilombolas, indígenas, LGBTI+ e negros e negras".

O combate contra as "formas de violências" também é elencado no programa de governo do candidato do PCO. A meta dele é "criar e publicizar programas educacionais contra essas formas de violência".

"Além de promover rodas de conversa nos bairros e comunidades para elucidar as formas de violência e também a promoção de vivências coletivas e respeitosa entre pessoas heteronormativa e de pessoas com identidade de gênero e/ou orientação sexual distinta daquela", pontua.

O candidato ainda elenca propostas contra a discriminação, inclusive com a "criação de um canal de denúncias contra qualquer tipo de discriminação por vias de telefonia e aplicativos, além de campanhas educativas de combate às opressões".

Eduardo Girão (Novo)

O documento do plano de governo do candidato não cita o termo “LGBTQIA+” e não lista propostas para a área.

Evandro Leitão (PT)

A população LGBTQIA+ aparece junto a outros grupos vulneráveis nas propostas do candidato do PT à Prefeitura de Fortaleza. No tópico "Programa adequação do sistema público de saúde para atendimento das necessidades específicas", a proposta é de "implementar linha de cuidados e protocolos para atendimento das necessidades específicas de cada grupo". 

Entre os grupos estão a população LGBTQIA+, além de mulheres, pessoas idosas, pessoas pretas e quilombolas, comunidades tradicionais, primeira infância e puérperas, população em situação de rua, pessoas com deficiência e pessoas vítimas de violência. 

A proposta de "Garantir Acolhimento Inclusivo e de Qualidade da População nos Serviços Municipais" é voltada a "setores mais vulnerabilizados". Novamente, a população LGBTQIA+ é citada junto à "população idosa, negra, as mulheres e crianças e outros segmentos necessitam de atendimentos especializados em muitos desses equipamentos e/ou programas municipais".

Além disso, no programa de governo do PT — intitulado "Proposta para Gestão Pública Compartilhada da Coligação Juntos, Fortaleza Pode Muito Mais" — é reforçado que o texto foi elaborado a partir da escuta em rodas de conversa e debates em 23 grupos temáticos — um deles, tendo como foco a "População LGBTQIA+".

George Lima (SD)

O documento do plano de governo do candidato não cita o termo “LGBTQIA+” e não lista propostas para a área.

José Sarto (PDT)

O prefeito José Sarto, candidato à reeleição, propõe o fortalecimento de "políticas públicas que promovam o respeito à diversidade e a igualdade de oportunidades". 

A iniciativa tem como meta reafirmar "os direitos da mulher, da população LGBTQIA+, da população negra, de pessoas com deficiência, dentre outros". 

Essa é a única citação à população LGBTQIA+ no plano de governo do candidato. 

Técio Nunes (Psol)

Intitulado "Programa de Governo pra fazer a nossa Fortaleza", o documento traz um eixo voltado a pessoas LGBTQIA+.

O candidato propõe a criação da Secretaria Municipal dos Direitos LGBTQIA+, como forma de "garantir que as políticas para as pessoas LGBTQIA+ tenham maior prioridade, consistência e espaço no orçamento, viabilizando instrumentos de governança eficazes, senso de propósito, metodologia e recursos para sua implementação", detalha o texto.

Também é proposta a implementação de projeto intersetorial de desenvolvimento artístico e cultural LGBTQIA+, chamado de "Arco-Íris Cultural". 

Três iniciativas formam esse projeto: a criação do Centro de Memória e Cultura LGBTQIA+, a criação de um programa de fomento para artistas LGBTQIA+ — inclusive com lançamento de editais de financiamento e de bolsas de criação artística — e parcerias com ONGS, instituições culturais e empresas privadas "para promover eventos e campanhas de valorização da cultura LGBTQIA+".

O programa de governo também propõe a ampliação Centros de Referência e do atendimento especializado para pessoas LGBTQIA+. Os Centros de Referências devem oferecer, por exemplo, "serviços de saúde, educação, assistência social e acolhimento".

É proposta ainda a disponibilização de atendimento psicológico especializado, com a contratação de profissionais e com a realização de parcerias com universidades para oferecer estágios supervisionados. 

Além disso, o programa propõe a realização de "diagnóstico da população LGBTQIA+", com a realização de um "censo específico com apoio de institutos de pesquisa e universidades locais, garantindo dados precisos para orientar políticas públicas".

O plano de governo também possui um eixo voltado para pessoas trans, a partir do projeto "Igualdade Já", o qual é previsto cotas para esta população em cursos e vagas de emprego. "Implantaremos cotas de 5% para pessoas trans em cursos, 3% de vagas de emprego em empresas com contratos públicos, e 3% de vagas em concursos públicos municipais", detalha o texto. 

O eixo prevê ainda mudança na Lei Orgânica do Município para garantir "o direito ao nome social e a vedação à discriminação por orientação sexual e identidade de gênero" na principal legislação municipal.

Por último, é prevista a criação de comitê com representantes do governo, da sociedade civil e das comunidades LGBTQIA+ para "monitorar a implementação das políticas e ajustar estratégias conforme necessário, garantindo transparência e eficiência".

Zé Batista (PSTU)

O documento do plano de governo do candidato não cita o termo “LGBTQIA+”. Contudo, há menção de propostas voltadas a "mulheres, jovens, negros e homossexuais". A terminologia, contudo, não abarca toda a população LGBTQIA+. 

A proposta apresentada por Zé Batista é voltada para o mercado de trabalho. "Exigências de programas de igualdade salarial e de oportunidades de contratação e ascensão profissional para mulheres, negros e homossexuais", propõe o texto.

O que o prefeito pode fazer pela comunidade LGBTQIA+?

Ativistas dos direitos LGBTQIA+ ouvidas pelo Diário do Nordeste destacaram o "apagamento" desta população nos planos de governo dos candidatos à Prefeitura de Fortaleza, como define a presidente do Grupo de Resistência Asa Branca (GRAB), Dary Bezerra.

"É muito preocupante o apagamento da necessidade de políticas públicas voltadas para populações LGBTQIA+, uma invisibilidade das pautas políticas, invisibilidade das populações excluídas e marginalizadas e que ainda hoje não conquistaram cidadania", ressalta.

Jornalista e doutoranda em Antropologia, Dediane Souza pontua as "ausências" nos planos de governos. 

"A gente percebe que existe uma ausência de nomeação, do ato de nomear a população LGBTQIA+ como uma população pertencente a cidade. Então, existe a negação da existência dessas pessoas", critica ela. 

Colunista do Diário do Nordeste, Dediane também comentou sobre o teor "genérico" das proposições, com um destaque apenas a "dimensão da vulnerabilidade" que atinge essa população. 

"É interessante perceber que eles vão nichar a população LGBTQIA+ em duas dimensões. A primeira dimensão é ligada ao campo da saúde, que vai construir um plano que vai ligar diretamente a LGBTQIA+ apenas na dimensão da vulnerabilidade, não na perspectiva do criar, na perspectiva de disputa de outras dimensões da cidade. E a outra vai citar de forma muito genérica, dentro da dimensão da assistência, dos direitos humanos. Mas que não afirma compromisso com nenhuma das pautas centrais da população LGBTQIA+".
Dediane Souza
Travesti, jornalista e doutoranda em Antropologia

Uma dessas pautas é a perspectiva de orçamento para iniciativas voltadas a esta população. "Muito se fala de fazer propostas, mas a gente precisa, primeiro, garantir verba", reforça a coordenadora da Região Nordeste da Articulação Brasileira de Lésbicas (ABL) e vice-presidente do Conselho Estadual de Combate a Discriminação LGBT do Ceará, Manu Rocha. Esse orçamento se faz necessário, inclusive, para estruturas que já existem em Fortaleza, como a Coordenadoria Especial da Diversidade Sexual e o Centro De Referência Janaína Dutra. 

Dary Bezerra ressalta ainda a necessidade da "efetivação de legislações (municipais) que foram aprovadas, mas que não entram em vigor". Uma delas, cita, é a criação de um Comitê de Enfrentamento à LGBTfobia em Fortaleza. "Outras leis não são respeitadas. Existe uma série de questões que poderiam ser apontadas em cada um desses planos de governo", disse. "O compromisso maior com a pauta é que parece não haver".

Dediane Souza reforça que a gestão municipal precisa ter um "olhar específico" para a população LGBTQIA+, "porque carrega consigo uma marca, que é a marca da violência, de negar a existência dessas pessoas ou, minimamente, não trazer para o debate". 

E as possibilidades de iniciativas são muitas: "de  facilitar o acesso às políticas públicas, reconhecer que as violências contra essas populações e essas comunidades coloca esses sujeitos ausentes do cotidiano das políticas públicas, sejam elas mais básicas do campo da saúde, da assistência social, mas também das dimensões de criatividade, de investimento de recurso para construir e consolidar e reparar esses contextos de vulnerabilidade", pontua Souza. 

Manu Rocha destaca que a implementação de propostas voltadas a população LGBTQIA+ precisa ser fruto de diálogo com a sociedade civil e com os movimentos sociais. "É dos movimentos sociais que sai a construção das políticas públicas, é nesse diálogo, se não tiver diálogo não tem política pública com o movimento, porque é o movimento que vai levar o que precisa", afirma.