Desigualdade no Ceará: rendimento mensal do 1% mais rico é 34 vezes maior que dos 50% mais pobres

Rendimento domiciliar per capita médio do 1% mais rico no Estado é de pelo menos R$ 13.780 por mês, enquanto o dos 50% mais pobres é de R$ 400, segundo a Pnad

Escrito por Paloma Vargas , paloma.vargas@svm.com.br
Desigualdades renda Pnad IBGE
Legenda: Em 2023, 1% com maiores rendimentos no Ceará recebeu 34,4 vezes mais do que os de menor renda
Foto: João Luis/Arquivo DN

No Ceará, o rendimento médio de 1% da população que ganha mais era 34,4 vezes maior que 50% dos mais pobres no Estado em 2023. Em números reais, o rendimento domiciliar per capita mensal dos mais ricos é em média R$ 13.780, contra os R$ 400 dos que recebem menos. 

Os dados são da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua 2023 - Rendimento de Todas as Fontes, que traz o retrato da desigualdade de renda no Brasil e nos estados. Os resultados foram divulgados nesta sexta-feira (19) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). 

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A massa de rendimento médio mensal real domiciliar per capita no Ceará totalizou R$ 10,6 bilhões em 2023. O valor representa um aumento de 5,9% se comparado com 2022, que teve o valor de R$ 10,0 bilhões. Porém, em relação a 2019 (R$ 10,8 bilhões), observa-se declínio de 1,1%. 

O comportamento das rendas

A pesquisa só leva em conta o rendimento de trabalho para pessoas de 14 anos ou mais de idade. Além disso, na série histórica, em 2012 o Ceará apresentava a menor renda, de R$ 159. Durante os anos subsequentes sempre havia um pequeno aumento, até 2020, quando o valor era de R$ 314. Já em 2021 a renda caiu para R$ 275. Em 2022, subiu para R$ 361, chegando aos R$ 400 em 2023.

O mesmo movimento foi apresentado no grupo de maior rendimento. Em 2012 o valor era de R$ 6.124. O valor se manteve crescente até 2020 quando chegou em R$ 12.714. Em 2021 houve a queda, chegando em R$ 10.634, voltando a subir em 2022 (R$ 13.314) e chegando aos R$ 13.780 de 2023.

Melhoria no mercado do trabalho insuficiente

Professor do Programa de Pós-Graduação em Economia da Universidade Federal do Ceará (Caen/UFC), João Mário de França afirma que apesar da melhoria no mercado de trabalho cearense e brasileiro e a ampliação dos programas sociais principalmente no âmbito federal, como o Bolsa Família, mas também estadual como o Cartão Mais Infância Ceará e Ceará Sem Fome, em 2023 o nível de desigualdade no Estado permanece alto, assim como no Brasil.

Ele aponta que o principal fator que explica esse nível de desigualdade no Estado é a baixa escolaridade, já que um percentual muito grande de pessoas no mercado de trabalho possuem ensino básico ou médio incompleto e ainda atuam na informalidade.

Isso leva essas pessoas a obterem baixas remunerações, mantendo assim elevado o gap de rendimento médio entre os 50% que ganham menos e o do 1% da população que ganha mais"
João Mário de França
Professor do Programa de Pós-Graduação em Economia da UFC

Ainda reflexos da década de 1980

A realidade enfrentada agora pelo Estado e pelo País, segundo o economista, tem relação direta com a pouca atenção dada no passado, mais precisamente até o final dos anos 80, aos investimentos sociais, principalmente na área da educação, quando havia muitas crianças fora da escola.

“Isso resultou em uma parcela significativa da população adulta que está no mercado de trabalho com baixa escolaridade, produtividade e menores salários, contrastando com os que tiveram mais oportunidades e tiveram mais anos de estudo”, diz França.

Para o especialista, a única maneira de reverter esse quadro estrutural de desigualdade elevada no médio e longo prazo é o Estado continuar priorizando reduzir a desigualdade de oportunidades com focalização nas famílias mais vulneráveis.

“É preciso ser garantida para os filhos destas famílias o acesso a uma boa educação em todas as fases, mas principalmente na primeira infância (0 até 6 anos) desde a pré-escola permitindo assim um adequado desenvolvimento físico, cognitivo e socioemocional para que ao longo das fases seguintes essas crianças tenham mais capacidade de aprendizagem e possam atingir todo o seu potencial”.

Outros pontos de influência 

França também aponta que acesso à saúde de qualidade descentralizada, onde se pensa também no saneamento ambiental (água potável e esgoto) e melhoria da infraestrutura domiciliar, sendo que algumas sequer possuem banheiro, também são pontos-chave para a construção dessa diminuição de disparidade de renda.

Além disso, para o economista, essas políticas sociais só são fortalecidas quando, além dos programas estaduais de transferência de renda, o Estado preserva o seu equilíbrio fiscal.

“Com isso é possível realizar investimentos sociais, sem falar que contas públicas sustentáveis garantem também maior credibilidade ao Estado no processo de atração de novos negócios e empresas que geram dinamismo e aumento de emprego e renda na economia”, completa.

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Monitoramento das políticas públicas

Por fim, o professor da UFC ressalta que é preciso criar ferramentas ágeis e eficientes para monitoramento e avaliação das políticas públicas para que os recursos aplicados nesse público, que deve ter prioridade, possam gerar melhores entregas e serviços. 

“Esse sistema garantiria correção de políticas e até em alguns casos sua descontinuidade por não atingirem os resultados esperados, para que a despesa pública tenha uma melhor qualidade”.

No Brasil, valor chega a ser 39,2 vezes mais

Na mesma pesquisa são apontados dados do Brasil. Assim, em 2023, o rendimento médio das pessoas do grupo de 1% mais ricos do País foi de R$ 20.664 por mês, em média, o correspondente a 39,2 vezes o rendimento daqueles no grupo dos 40% mais pobres (R$ 527).

“Quando comparados os rendimentos médios das diferentes classes de renda, observa-se que a desigualdade no país permanecia bastante acentuada”, escreveu o IBGE na publicação da Pnad.

Na comparação com 2022 essa distância entre a média das rendas teve pequena alta, já que no ano anterior o valor era 38,9 vezes maior. Já na série histórica, a discrepância entre o rendimento médio dos mais ricos e dos mais pobres vem apresentando reduções. Para se ter uma ideia, em 2012 a diferença era de 46,2 vezes.

O ano de 2019 foi o que apresentou o maior pico, com 48,9 vezes. Na pandemia, em 2020, essa razão diminuiu para 41,8 vezes, porém em 2021 voltou a subir, chegando nas 47 vezes de diferença.

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