Bandeira vermelha deixará alimentos mais caros no Ceará ainda neste mês; veja o que pode subir
População é a mais impactada com aumento da conta de luz e dos produtos de consumo
Desde o último domingo (1º) que as contas de luz no Brasil estão sob a bandeira vermelha patamar 2. A energia elétrica está mais cara neste mês de setembro, com um aumento de R$ 7,877 a cada 100 quilowatts-hora (kWh) consumidos. Com isso, os setores da economia já projetam um aumento de preço de produtos repassados ao consumidor final.
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O economista Alex Araújo afirma que esse tipo de aumento de valores nas contas de energia, por conta da sistemática de bandeiras, afeta os consumidores domésticos e pequenos consumidores empresariais. Isso porque os grandes consumidores empresariais adquirem a energia no mercado livre. "Dessa forma, o impacto tende a ser maior no orçamento familiar".
Sobre os efeitos dessa medida na inflação, ele explica que como a maioria dos indicadores de inflação se concentram na inflação ao consumidor, o impacto será sentido diretamente. Araújo também reforça que conforme a Pesquisa de Orçamento Familiar, do IBGE, 16,3% do orçamento das famílias cearenses estão comprometidos com serviços de utilidade pública, tendo a energia elétrica o maior peso.
"Os mais afetados serão os mais pobres, que possuem o orçamento com mais limitadores e não têm alternativas para reduzir o consumo por possuírem poucos equipamentos elétricos que possam ser desligados ou recursos para ter equipamentos de autogeração de energia", comenta.
Alimentos serão afetados
A produção de alimentos também deve ser impactada com essa nova bandeira de energia. Segundo o analista de mercado das Centrais de Abastecimento do Ceará (Ceasa), Odálio Girão, o impacto maior deve ser no setor de grãos, por conta do uso contínuo de energia na produção.
Ele cita como exemplos a soja, o milho, o arroz e o feijão, que são produtos que precisam de irrigação. "Esses produtos vão sentir o impacto quase de imediato, já no final deste mês".
"Mercado absorve muito bem (a produção) no segundo semestre e vamos ter uma boa produção, mas os custos operacionais devem afetar diretamente o produtor e, consequentemente, o consumidor", considera.
Na fruticultura, o impacto deve se dar mais no processo de embalamento. Girão comenta que o setor de Packing House (do inglês, casa de empacotamento) sendo o local onde o produto recebe o beneficiamento, classificação, embalagem, tem grande influência e precisa de energia elétrica. "E quanto mais esse recurso for exigido, mais custo deverá ser repassado ao consumidor final", completa Odálio Girão.
Anna Fercher, head de customer success e insights da Neogrid, pontua que a alta na conta de luz tem impacto sobretudo na soja, base alimentar de boa parte da pecuária brasileira, como bovinos, suínos e aves. Com isso, a tendência é de encarecimento, sobretudo a partir de outubro, nas proteínas animais que compõem a alimentação dos brasileiros.
O setor pecuário como um todo sofre impacto não só por conta do custo da produção, mas também por conta do valor da soja, principal insumo alimentício dessa categoria. Uma vez o preço da soja subindo, que a gente vê que já vem subindo, a tendência é de que isso seja repassado para a pecuária.
A reação em cadeia, pelo menos inicialmente, não deve impactar no bolso do consumidor na hora de fazer as compras. Anna Fercher acredita que o abastecimento dos estoques deve passar por um processo de encarecimento gradual, quando eles passarem por reposições ao longo das semanas. Assim como a pecuária, a alta na conta de energia deve ser sentida em demais produtos em outubro.
"A princípio, esse impacto não tende a ser tão alto porque os canais já estão abastecidos. O impacto maior provavelmente virá no próximo trimestre, que é quando as redes vão estar reabastecendo as gôndolas. A tendência é de que sim, não só em alimentos, mas em produtos de limpeza e proteínas, o preço se eleve até chegar numa estabilidade", avalia.
Efeitos em toda a cadeia do leite
O presidente do Sindilaticínios, José Antunes Mota, reforça que o aumento da energia elétrica "impacta toda a cadeia dos laticínios": "como trabalhamos com produtos perecíveis, o aumento será repassado de imediato para o consumidor".
Mota enumera os processos da cadeia dos laticínios que tem a energia elétrica como base. São eles os irrigadores para o pasto do gado, refrigeração por meio do tanque de leite e câmaras de refrigeração da indústria. Além disso, ele lembra que os mercados, para vender os produtos, também serão impactados com o aumento do preço da energia.
"Ataca a cadeia toda, desde o produtor até o supermercado. Já vamos fazer as contas dos custos com a nova bandeira. E quem vai sofrer é o consumidor que ou paga mais, ou leva menos produto".
Comércio vem buscando alternativas, como energia solar
Conforme o presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL), Assis Cavalcante, todos os lojistas sentem os aumentos na conta de energia, mas os pequenos são os mais impactados. Além disso, ele lembra que os comércios que lidam com alimentos refrigerados, como os supermercados, tendem a ser mais impactados.
"O lojista ele acaba sentindo esse aumento e tendo que repassar esse novo custo para o consumidor. Quando acontece esse repasse é comum que o consumo caia um pouco, mas logo se ajusta. É natural".
Assis comenta que, atentos aos custos dos serviços essenciais, muitos comerciantes estão aderindo ao uso de placas solares para reduzir a conta de energia e não ser tão impactado pelas mudanças do governo federal, como no caso das bandeiras.
"Sempre orientamos o uso racional desses bens finitos e mostramos alternativas que estão sendo usadas por outros associados, como a energia solar".
Ele acredita que a partir do pagamento das novas faturas de energia os valores dessa nova bandeira já comecem a ser repassados em produtos e serviços. "Com certeza será a população de baixa renda, com o orçamento limitado, que sentirá mais essa dificuldade".
A reportagem do Diário do Nordeste procurou a Federação das Indústrias do Estado do Ceará (Fiec), o Sindialimentos e a Federação da Agricultura e Pecuária do Estado do Ceará (Faec), mas não obteve retorno até o fechamento desta matéria.
Entenda melhor esse aumento
A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) acionou a bandeira vermelha patamar 2 em meio à redução no nível de água dos reservatórios brasileiros. Conforme a Aneel, esta é a primeira vez em cerca de três anos que esta bandeira é acionada. A última vez tinha sido em agosto de 2021.
"Uma sequência de bandeiras verdes foi iniciada em abril de 2022 e interrompida apenas em julho de 2024 com bandeira amarela, seguida de bandeira verde em agosto", detalhou a Agência.
O aumento no valor da energia ocorre devido à seca no Brasil e a previsão de chuvas abaixo da média em setembro. A expectativa é "de afluência nos reservatórios das hidrelétricas do país (em cerca de 50% abaixo da média)", diz a Aneel.
O que são as bandeiras tarifárias?
Criadas em 2015 pela Aneel, as bandeiras tarifárias refletem os custos variáveis da geração de energia elétrica. Divididas em níveis, as bandeiras indicam quanto está custando para o Sistema Interligado Nacional (SIN) gerar a energia usada nas casas, em estabelecimentos comerciais e nas indústrias.
- Bandeira verde: condições favoráveis. Sem acréscimo no preço da conta de luz;
- Bandeira amarela: condições menos favoráveis. Acréscimo de R$ 1,88 na conta de luz a cada 100 kilowatt-hora (kWh) consumido;
- Bandeira vermelha - Patamar 1: condições menos favoráveis ainda de geração. Acréscimo de R$ 4,46 na conta de luz a cada 100 kilowatt-hora (kWh) consumido;
- Bandeira vermelha - Patamar 2: condições muito mais desfavoráveis de geração. Acréscimo de R$ 7,87 na conta de luz a cada 100 kilowatt-hora (kWh) consumido;
Quando a bandeira de escassez hídrica vigorou, de setembro de 2021 a 15 de abril de 2022, o consumidor pagava R$ 14,20 extras a cada 100 kWh.