Veja 3 grandes obras do Ceará que dependem do Governo Federal para serem concluídas

Pactuação técnica e financeira entre os entes federativos precisa ser implementada e avaliada para garantir cumprimento dos objetivos

Escrito por Nícolas Paulino , nicolas.paulino@svm.com.br
Legenda: Obras da Linha Leste do Metrofor enfrentam problemas desde 2013; nova previsão é 2024.
Foto: Kid Júnior

Parcerias entre o Governo Federal e Estados são alternativas importantes para viabilizar grandes obras de infraestrutura e auxiliar no desenvolvimento das cidades. No Ceará, há projetos complexos que necessitam da boa execução desse instrumento para serem concluídos.

A transferência de recursos financeiros para esses empreendimentos nos próximos anos pode requerer atenção do próximo presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, eleito no último domingo (30) com 50,9% dos votos válidos.

Segundo Helena Sampaio, doutora em Sociedade, Território e Meio Ambiente e professora do Curso de Gestão de Políticas Públicas da Universidade Federal do Ceará (UFC), a cooperação entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios é “necessária” e um dos fundamentos constitucionais da República brasileira.

Isso porque a Federação tem diversas peculiaridades e, embora alguns entes possuam uma pretensa autonomia, ainda dependem de auxílios técnicos e financeiros dos demais para concretizar políticas públicas. Logo, se a parceria não for benéfica, as falhas devem ser identificadas e corrigidas.

“Competências próprias de um ente dentro de obras que são comuns vão causando amarras impeditivas, quando deveriam ser amarras de sustentação. A cooperação não deve ser apenas para o conjunto, mas também de competências isoladas para que o conjunto aconteça. Quando isso não acontece, fica claro pra mim a pouca ou inexistente mediação de possíveis conflitos ambientais de grandes obras que envolvem a gestão pública”, detalha.

A especialista detalha fatores que podem atrasar obras:

  • a própria envergadura do empreendimento;
  • o incumprimento de contrapartidas (falta de pagamentos);
  • dificuldade no planejamento de políticas públicas a longo prazo;
  • desconhecimento ou não aplicação de planejamento para o licenciamento ambiental.

Confira três obras cearenses que necessitam de aportes federais:

Cinturão das Águas do Ceará (CAC)

Iniciadas em 2013, as obras do CAC têm como principal objetivo distribuir as águas da Transposição do Rio São Francisco para diversas regiões hidrográficas do Ceará, dentro do projeto de expandir a oferta de água nas áreas mais secas do Nordeste.

O Trecho 1 é dividido em cinco lotes e está em fase de implantação. Ao todo, são 145,3 km de percurso para levar a água da barragem Jati até o Rio Cariús, no município de Nova Olinda, na região do Alto Jaguaribe, passando por oito cidades: Jati, Brejo Santo, Porteiras, Abaiara, Missão Velha, Barbalha, Crato e Nova Olinda.

Legenda: Trecho emergencial do Cinturão das Águas foi inaugurado em fevereiro deste ano.
Foto: Antonio Rodrigues/SVM

O trecho emergencial (lotes 1, 2 e 5) foi concluído em fevereiro de 2022 e beneficia uma cadeia de condução até o Açude Castanhão, que transfere água para as 19 cidades da Região Metropolitana de Fortaleza (RMF), beneficiando 4,5 milhões de pessoas, de acordo com o Governo do Ceará.

Os lotes 3 e 4 seguem em obras e devem melhorar a segurança hídrica da Região do Cariri, beneficiando as cidades de Barbalha, Missão Velha, Crato e Nova Olinda. O lote 3 tem 46,48% de conclusão; já o lote 4 está em 25,70%, informa a Secretaria dos Recursos Hídricos do Ceará (SRH).

Segundo o Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR), desde 2013, o Governo Federal já investiu cerca de R$ 1,3 bilhão no empreendimento.

Linha Leste do Metrofor

Legenda: Atualmente, obra tem cinco frentes de serviço em bairros como Centro e Aldeota.
Foto: Kid Júnior

Viabilizado na década de 1990, o projeto Metrofor surgiu pela maior demanda por soluções de transporte público. Ele é executado pelo Governo do Ceará, com recursos oriundos do Governo Federal, tesouro estadual e financiamentos.

A Linha Leste, ainda em fase de implantação, teve contrato original iniciado em 2013. Porém, problemas com a empresa responsável adiaram a nova ordem de serviço para novembro de 2018.

O trecho terá 7,3 km de extensão e ligará o Centro de Fortaleza ao Papicu, com uma estação de superfície e mais quatro subterrâneas, num trajeto de 15 minutos.

Legenda: Projeto de estações da Linha Leste, em amarelo, se integrando às demais linhas do Metrofor.
Foto: Metrofor

A Secretaria da Infraestrutura do Ceará (Seinfra) informou que, atualmente, há cinco frentes de serviço em andamento, que incluem a construção de estações subterrâneas nos bairros Centro e Aldeota.

150 mil
passageiros poderão ser transportados por dia, quando o sistema for finalizado.

O financiamento da obra é de R$1,86 bilhão, sendo R$1,2 bilhão do Governo do Ceará e os demais R$660 milhões do Governo Federal, de acordo com a Seinfra. 

“Por conta da complexidade da obra e dos impactos causados pela pandemia do coronavírus, o prazo para conclusão do empreendimento foi estendido para 2024”, completa a Pasta. 

Usina de urânio em Santa Quitéria

Legenda: Usina de extração de urânio e fosfato deve ser implementada em fazenda no interior do Ceará.
Foto: Kid Júnior

O projeto ainda não saiu do papel, mas pode ter as obras iniciadas ainda no fim de 2022 ou início de 2023, conforme o cronograma. Serão investidos cerca de R$ 2,3 bilhões pelo consórcio responsável, formado pela INB (Indústrias Nucleares do Brasil, vinculada ao Governo Federal) e a empresa Galvani.

Em junho, o Governo do Estado se posicionou a favor da instalação da usina para extrair fosfato e urânio no município. “As obras do Projeto Santa Quitéria serão iniciadas após a liberação dos órgãos reguladores”, afirma o consórcio.

A produção estimada pelo consórcio é de 1 milhão de toneladas/ano de fertilizantes fosfatados, o que seria suficiente para garantir 25% da demanda do Norte/Nordeste; 200 mil toneladas de fosfato bicálcico (para ração animal); e 2,3 toneladas de concentrado de urânio, que garantiriam autossuficiência para o Brasil.

A instalação do complexo, porém, não é unanimidade. Durante audiências públicas para discussão de impactos econômicos e ambientais, manifestantes chegaram a entoar gritos e a se posicionar contra o empreendimento.

Políticas de Estado, não de Governo

É comum que a alternância de gestões após novas eleições lance dúvidas sobre a continuidade de algumas obras, sobretudo se forem consideradas “marcas” do Poder Executivo.

Porém, na leitura da professora Helena Sampaio, essa dicotomia entre política de Estado e política de Governo deve ser superada pelo reconhecimento da própria organização político-administrativa do País.

“Se o sistema de competências constitucionais fosse entendido e praticado a partir da cooperação dos entes federativos, levando em conta desde aspectos financeiros ao know-how de como concretizar uma política pública que vai ultrapassar o município, que vai ser importante para uma região, que vai alavancar um objetivo nacional, essa reflexão não seria necessária”, destaca. 

Segundo Helena, especialmente as políticas socioambientais são mais bem sucedidas se forem descentralizadas, portanto a organização estatal necessariamente depende da cooperação entre os entes federativos para sua implementação eficiente. 

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