Fanáticos: pessoas sem esperança e sem amor
A única e verdadeira verdade é a sua, e ai daquele que se opor!
Sempre somos surpreendidos com atitudes extremas de violência e intolerância em um mundo cada vez mais dividido, em diversas áreas da vida social, como religião, política e esportes. As atitudes extremas de agressão e intolerância são, geralmente, motivadas por um entusiasmo exagerado.
Ao ser vivido de forma acrítica, esse sentimento pode levar indivíduos e grupos sociais a seguir cegamente crenças ou ideologias suicidárias, deixando de lado qualquer tentativa de diálogo ou equívoco. Inicialmente, essas pessoas podem ser bem-intencionadas, movidas por princípios nobres e um desejo genuíno de contribuir, de fazer história. Contudo, com o decorrer do tempo, essa intenção se torna uma missão quase obsessiva e doentia de converter os outros e modificar o mundo à sua imagem e semelhança.
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A única e verdadeira verdade é a sua, e ai daquele que se opor! Essa transição é perigosa, pois a procura por um ideal absoluto, muitas vezes, resulta em preconceito, agressividade e tiranias. O fanático, então, começa a enxergar o mundo de forma maniqueísta, dividindo tudo em duas categorias simples: os “eleitos”, que compartilham suas crenças, e os “inimigos”, que devem ser enfrentados, combatidos, exterminados de qualquer maneira.
Essa mentalidade pode levar a atitudes extremas, como a difamação, a mentira, incentivando o ódio para exterminar o inimigo. A filosofia é que os fins justificam os meios, ou seja, se a finalidade é nobre, podemos usar todo meio, mesmo sendo imoral e prejudicial aos outros. O desrespeito pelo outro, o diferente, se torna uma regra, e a radicalização das ideias é frequentemente alimentada pelas redes sociais e meios de comunicação que amplificam essas vozes extremas. Casos de crimes de ódio e atentados terroristas são exemplos tristes de como essa ideologia tem se manifestado na história da humanidade.
A invasão do Capitólio nos Estados Unidos é um evento marcante que demonstra a gravidade desse fenômeno. Recentemente, ocorreu um atentado com explosão e morte na Praça dos Três Poderes, em Brasília. O fanático tem uma visão distorcida e rígida da realidade, impedindo o desenvolvimento da empatia e da compaixão, características fundamentais para a convivência pacífica entre os seres humanos.
A incapacidade de aceitar diferentes pontos de vista torna-se uma prisão mental, impedindo que possam pensar, refletir e questionar. Dessa forma, o fanático tem a certeza de ter razão e quer persuadir, impor a todos os outros o seu ponto de vista, o que resulta numa resistência intransigente a opiniões divergentes. Esse tipo de comportamento não só causa sofrimento para si, mas também para aqueles que estão ao seu redor, resultando em uma atmosfera de tensão e hostilidade.
Essa atitude tende a se tornar mais intensa quando o inimigo é representado por uma figura real, com uma fisionomia bem definida, uma cultura específica, uma instituição, um partido político ou um time de futebol. Isso resulta em uma ação bem planejada e organizada com o objetivo de eliminar aquele escolhido como responsável pelo mal-estar social. Uma multidão de adeptos funciona como uma“ bomba prestes a explodir” a qualquer momento.
Quem de nós se lembra da seita criada pelo reverendo Moon, que dizia ser o messias? Ele afirmava ter tido, aos 15 anos, uma visão em que Jesus lhe pedia continuar a sua missão no mundo, a fim de que a humanidade se livrasse do pecado. Outro acontecimento foi o suicídio coletivo sob as ordens de outro pastor em 1978, na cidade de Jonestown na Guiana, onde morreram 918 pessoas, integrantes da seita Pentecostal americana Templo do Povo. E o que dizer dos ataques de 11 de setembro de 2001 em Nova York? Essa convicção inabalável tem causado muita dor e sofrimento a todos os seres humanos. Hitler tinha plena convicção de que a raça Ariana era superior e, por isso, tentou exterminar aqueles considerados inferiores.
O holocausto dos judeus é um exemplo dessa loucura que o tempo revelou. Mas, para exterminá-los legalmente, era necessário modificar as leis, o que foi feito pelo parlamento alemão da época. Assim, a prisão de judeus em campos de concentração e a eliminação deles se tornaram uma prática legal, conforme a legislação vigente. A história tende a se repetir, caso não estejamos atentos. Nosso país vive uma grande tensão social, com grupos sectários, fanáticos querendo mudar o nosso destino, sem considerar a vontade da maioria, o que culminou com a tentativa de destruição dos símbolos da democracia em Brasília, em 8 de janeiro de 2023.
A tentativa de desmoralizar o Supremo Tribunal Federal e seus ministros não seria uma forma de substituí-los por outros que modificassem e criassem leis que legalizem o desmatamento depredador, a exploração irresponsável de nossas riquezas, o extermínio de nossos povos originários e muitos outros crimes? Stalin também tinha a convicção de que, ao eliminar a elite econômica e política, substituindo-a pelos trabalhadores, a Rússia e o mundo seriam melhores.
Milhares e milhares de pessoas foram mortas e as estruturas permaneceram as mesmas e as mudanças foram aparentes. Um novo poder surgiu, tão tirano quanto o anterior. Os homens, com suas convicções inabaláveis, fanáticas, fizeram mais mal à humanidade do que aqueles que tiveram dúvidas. O fanatismo que nos leva a querer ser o senhor da vida e do destino dos outros merece nossa atenção e reflexão. Precisamos estar atentos para não repetir o que outros países sofreram no passado.
As relações entre fanáticos e pessoas que pensam de forma diferente tendem a piorar. Os fanáticos se cercam de pessoas que validam suas crenças e se afastam daqueles que têm visões diferentes. Essa bolha social de alienação intoxica mentes e reforça suas convicções, enquanto a recusa em reconhecer o valor e as virtudes dos outros os priva de experiências enriquecedoras e de relacionamentos significativos.
Com o decorrer do tempo, esses indivíduos se afastam dos princípios universais que nos definem como seres humanos, tais como a afetividade e a habilidade de estabelecer conexões de coração para coração. O fanatismo que vem de fora e nos atinge só pode prosperar em nossos corações machucados, cheios de mágoas, ressentimentos e frustrações. Não se trata apenas de se livrar do mal que vem de fora, mas também do mal que está dentro de nós mesmos. Somos seres habitados por anjos e demônios.
A consciência de nosso livre arbítrio é uma faca de dois gumes à qual devemos estar atentos para evitar que o ódio tome conta de mim e de minha família e de meu país. O fanatismo é um tema recorrente na história da humanidade, pois nos lembra que todos somos humanos e sujeitos a erros. Essa consciência é vital para podermos construir uma sociedade mais tolerante e respeitosa, onde o diálogo e a diversidade de opiniões sejam valorizados.
Ao incentivar a reflexão e a empatia, podemos contribuir para superar as diferenças e construir um futuro mais harmônico. É fundamental ter um senso crítico para combater o fanatismo. Precisamos nos informar, pensar, participar de debates e não permitir que outras pessoas pensem por nós, decidam pelo nosso nome. A união é fundamental nesse processo. Não se trata de nos unirmos contra ninguém, mas sim concentrar esforços para construir uma sociedade plural que respeita a diversidade.
Da mesma forma que convivemos com a diversidade de opiniões entre nossos familiares e nossos pais, podemos conviver como uma nação composta por culturas diferentes. Esse deve ser o grande desafio: aprender a conviver com as diferenças, sem excluir ou estigmatizar as pessoas e grupos sociais que professam outra religião, de partidos que empunham bandeiras de cores diferentes e de times de futebol desse imenso território brasileiro.
*Esse texto reflete, exclusivamente, a opinião do autor.