Livre da poliomielite há 34 anos, Ceará tem desafio de voltar a aumentar vacinação contra a doença

Imunizante é a única forma de prevenção da doença, que pode levar à paralisia de membros

Escrito por Nícolas Paulino , nicolas.paulino@svm.com.br
Legenda: Personagem Zé Gotinha vacina crianças cearenses na década de 1990
Foto: Luciano Arruda/Arquivo DN

A vacina contra a poliomielite, também chamada de paralisia infantil, é a única forma de prevenção comprovada contra a doença. Os casos graves podem levar à paralisia muscular, principalmente nos membros inferiores. O Ceará não tem novos casos confirmados desde 1988, e o último no Brasil ocorreu um ano depois.

Em 1994, o Brasil recebeu da Organização Mundial da Saúde (OMS) o certificado de eliminação da doença, mas existe um alerta das autoridades de saúde para o retorno do vírus devido à baixa cobertura vacinal em alguns países.

O balanço mais recente da Campanha Nacional de Vacinação contra Poliomielite 2022, informado pelo Ministério da Saúde (MS), indica que o Ceará tem 80,8% do público-alvo atingido. Porém, Fortaleza tem apenas 48,4% de cobertura, abaixo da média nacional de 64,5%. A meta é de 95%.

“Toda a população com menos de 5 anos precisa ser vacinada para evitar a reintrodução do vírus que causa a paralisia infantil”, alerta o Ministério. O poliovírus, que invade o sistema e pode ser transmitido muito rápido, também pode acometer adultos, de acordo com a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).

O Programa Nacional de Imunização (PNI) recomenda que a vacina inativada, em forma de injeção, deve ser aplicada aos 2, 4 e 6 meses de idade do bebê. A vacina via oral (em gotinhas), que serve como reforço, deve ser dada entre os 15 e 18 meses e novamente até os 5 anos de idade.

O Ceará está livre da poliomielite há 34 anos, de acordo com a Secretaria da Saúde do Ceará (Sesa). O poliovírus selvagem foi isolado pela última vez em maio de 1988, no município de Crateús, na região Norte do estado.

Legenda: Imunização infantil em 1988, ano do último caso de poliomielite no Estado
Foto: Ari Saraiva/Arquivo DN

Contudo, foi um longo caminho para conter a doença que deixou sequelas importantes entre as décadas de 1960 e 1980. As ações de combate no País começaram em 1961, mas só em em 1971 foi instituído o Plano Nacional de Controle da Poliomielite, devido à ocorrência de surtos da doença em vários Estados. 

Em 1978, a vacina da pólio foi incluída no Programa Nacional de Imunização (PNI) e, em 1980, por meio da Campanha Nacional de Vacinação contra a Poliomielite, passou a ser disponibilizada para todo o território nacional com o objetivo de imunizar toda a população infantil brasileira.

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“A dose milagrosa que pode evitar muitas tristezas”. Assim chamava matéria de capa do Diário do Nordeste em agosto de 1982, convocando a população para a campanha contra a poliomielite. Naquele ano, foram usados 4.658 postos de imunização em todo o Estado, sendo mais de 400 volantes para atingir localidades mais distantes.

Legenda: Campanha de vacinação no Ceará, em 1982
Foto: Sheyla Fontes/Arquivo DN

Izabella Tamira, pediatra e professora da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará (UFC) - Campus Sobral, defende a educação continuada em saúde como dos pilares mais importantes para a saúde pública, já que, “se a população não tiver acesso à informação, fica mais difícil”.

Até porque muitos de nós hoje não tivemos contato com o surto que foi a poliomielite, com as sequelas que tiveram. Então, isso pode acabar passando batido, não recebendo a devida importância, já que não fomos impactados com um surto de poliomielite.
Izabella Tamira
Pediatra e professora

A docente também ressalta que alguns responsáveis podem confundir as duas etapas da imunização contra a poliomielite, que inclui tanto a vacinação por via intramuscular como as campanhas de vacinação feitas com a gotinha, por via oral. 

“O risco de diminuir essa cobertura é aumentado pelo fato não só de não ter adesão à vacinação da pólio do calendário, mas também por muitos pais acharem que, pelo calendário estar completo, acabam não precisando ir para a campanha”, afirma.

A especialista observa ainda que, como a pólio também pode ocorrer em adultos, proteger as crianças - população mais facilmente acometida pelo vírus - significa proteger a população em geral. 

Apesar do resultado ainda abaixo do esperado, a vacina continua disponível nos 116 postos de saúde de Fortaleza, assegura a Secretaria Municipal de Saúde (SMS). Nos demais municípios cearenses, a vacina deve ser buscada nas Unidades Básicas de Saúde.

‘Ameaça continua’

De acordo com a Organização Pan-Americana da Saúde (Opas), embora o último caso confirmado de poliomielite por poliovírus nas Américas tenha ocorrido em 1991, “a ameaça continua”. 

“Apesar dos esforços para sua erradicação, no momento, em alguns países asiáticos, ainda existem crianças com paralisia permanente por este vírus. Devido ao seu risco de importação, o principal fator de risco para que crianças menores de 5 anos adquiram a doença é a baixa cobertura vacinal”, afirma.

Legenda: Vacinação é a única forma de prevenção contra a doença, que pode deixar sequelas para toda a vida
Foto: Ari Saraiva/Arquivo DN

No Brasil, o primeiro surto de poliomielite foi descrito em 1911, no Rio de Janeiro. Na década de 1930, outras capitais também foram atingidas. Porém, na década de 1950, “epidemias cresceram de proporção e se espalharam por diversas cidades brasileiras”, segundo a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). 

Entre os anos de 1968 e 1989, o Brasil contabilizou mais de 26 mil casos da infecção, conforme dados do Ministério da Saúde. O último caso de poliomielite paralítica ocorreu em 1989, no município de Souza, na Paraíba. 

Quais são os sintomas da poliomielite?

A poliomielite é uma doença contagiosa causada por um vírus que vive no intestino, chamado poliovírus, que pode infectar crianças e adultos por meio do contato direto com fezes ou com secreções eliminadas pela boca das pessoas infectadas e provocar ou não paralisia. 

Nos casos graves, em que acontecem as paralisias musculares, os membros inferiores são os mais atingidos, de acordo com o Ministério da Saúde. Os sintomas mais frequentes da doença são:

  • febre
  • mal-estar
  • dor de cabeça, de garganta e no corpo
  • vômitos
  • diarreia
  • constipação (prisão de ventre)
  • espasmos
  • rigidez na nuca
  • flacidez muscular (nas formas graves)

Legenda: Campanhas de imunização nacionais ocorrem desde a década de 1980
Foto: Natinho Rodrigues/SVM

Quais são as sequelas da poliomielite?

As sequelas da poliomielite estão relacionadas com a infecção da medula e do cérebro pelo poliovírus, normalmente são motoras e não têm cura. As principais são:

  • problemas e dores nas articulações
  • pé torto, sem que a pessoa consiga andar porque o calcanhar não encosta no chão
  • crescimento diferente das pernas, o que faz com que a pessoa manque e incline-se para um lado
  • osteoporose
  • paralisia de uma das pernas
  • paralisia dos músculos da fala e da deglutição, o que provoca acúmulo de secreções na boca e na garganta
  • dificuldade de falar
  • atrofia muscular
  • hipersensibilidade ao toque

As sequelas da poliomielite são tratadas através de fisioterapia, por meio da realização de exercícios que ajudam a desenvolver a força dos músculos afetados, além de ajudar na postura, melhorando assim a qualidade de vida e diminuindo os efeitos das sequelas. 

Além disso, pode ser indicado o uso de medicamentos para aliviar as dores musculares e das articulações.

Prevenção da poliomielite

A vacinação é a única forma de prevenção da doença. Todas as crianças menores de cinco anos de idade devem ser vacinadas conforme esquema de vacinação de rotina e na campanha nacional anual. 

Quais são as reações adversas da vacina contra a poliomielite?

A Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm) explica que as reações adversas são passageiras e desaparecem de 24 a 48 horas, podendo incluir dor ou vermelhidão no local da injeção, febre moderada, dor de cabeça ou dor pelo corpo. 

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