Museus do Ceará têm ganhado interesse nacional com avanços e desafios estruturais
Ocorrido em Fortaleza, Fórum Nacional de Museus lançou bases para que novos passos sejam dados no segmento, incluindo plano nacional com metas de trabalho para os próximos 10 anos
O Ceará é destaque no segmento museal. A oitava edição do Fórum Nacional de Museus comprova isso. O evento, voltado para instituições públicas e privadas, aconteceu de 25 a 29 de novembro em diferentes equipamentos de Fortaleza, e não apenas debateu pautas importantes como lançou bases para possíveis avanços na área. A ministra da Cultura, Margareth Menezes, participou das atividades.
Secretária da Cultura do Estado, Luísa Cela diz que um dos principais produtos da iniciativa – com tema “Democracia e direito à memória” – foi a finalização e votação do Plano Nacional Setorial de Museus. O documento, construído com a sociedade civil, orientará as políticas e estabelecerá metas para os próximos 10 anos, de 2025 a 2035.
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“De reflexão, de trocas, de aprendizagem, de pactuações para o futuro da política museal nesse processo de reconstrução das políticas culturais”, enumera a titular da pasta. Coordenadora de Patrimônio Cultural e Memória da Secult, Jessica Ohara vai um pouco além. Ela afirma que os momentos de reflexão durante o Fórum renderam duas conclusões.
“A primeira é que estamos no caminho certo quanto à estrutura e diversificação de especialidades dos trabalhadores de museus. Os participantes do Fórum elogiaram muito nossos equipamentos e a valorização que fizemos – não só do aspecto estético, mas do técnico – em relação à conservação de acervos e reservas técnicas”.
Para ela, Fortaleza ainda é o grande polo dessas tecnologias – mas a gestora compreende que, a partir do modelo aprovado, ele pode ser replicado em diferentes graus por todo o Estado por meio de investimento direto ou parcerias.
“A segunda conclusão é que, ao nos depararmos com profissionais de todo o Brasil, percebemos que os nossos desafios serão quanto ao desenvolvimento de uma documentação museal mais robusta para se equiparar com outros equipamentos do mesmo porte que os nossos e o pensamento quanto a sustentabilidade financeira e ambiental dos nossos museus”.
Das realizações e entraves
Luísa Cela, não à toa, pontua que esta edição do evento teve inúmeras finalidades. Além das discussões temáticas, houve falas sobre museus específicos, acervos, museus antirracistas, repatriação de bens e obras de artes.
A decisão pela realização em Fortaleza, por outro lado, refletiu a dinâmica do Fórum, que não ocorria desde 2017. À época, havia-se optado pela capital cearense para sediar o encontro, e a escolha se manteve. O próximo Estado a receber o evento será o Amazonas.
É oportuno, por sinal, que no momento atual de Fortaleza haja uma ação dessa magnitude ocorrendo aqui. Desde a pandemia de Covid-19, a inauguração de equipamentos como a Pinacoteca do Ceará e o Museu Ferroviário Estação João Felipe, bem como a reabertura do Museu da Imagem e do Som do Ceará - Chico Albuquerque, projetaram o Estado para todo o Brasil a partir de inovações tecnológicas, estruturais e passos afins.
Ao mesmo tempo, o fato de um espaço como o Museu do Ceará continuar fechado para reforma aponta para desafios no setor. Conforme Luísa Cela, a obra de reforma e restauro do Palacete Senador Alencar – sede do museu desde 1990 – foi iniciada em 24 de setembro, após assinatura da ordem de serviço. Ela terá duração de oito meses e conta com investimento de R$ 4,7 milhões.
“Esse valor é advindo de recursos próprios e do Fundo de Defesa dos Direitos Difusos do Estado do Ceará (FDID), do Ministério Público do Ceará (MPCE). Além da reforma, o investimento também será voltado à modernização do equipamento, incluindo a atualização dos espaços de exposição e novas orientações de acessibilidade”, explica.
No total, a Secult possui oito museus geridos diretamente ou em parceria com institutos. São eles:
- Arquivo Público do Ceará
- Museu do Ceará e Museu Anexo Bode Ioiô
- Museu Sacro São José de Ribamar
- Museu da Cultura Cearense
- Museu de Arte Contemporânea do Ceará
- Museu Ferroviário
- Museu da Imagem e do Som
- Pinacoteca do Ceará
“Nosso objetivo sempre foi se tornar referência, mas com o foco principalmente no povo cearense. Queremos oferecer uma programação de qualidade, acervos preservados e pesquisas robustas para que a sociedade local consiga se reconhecer nos nossos esforços e ter orgulho do que se faz aqui dentro”, expressa Jessica Ohara.
“Como consequência desse trabalho, Fortaleza tem se destacado por essa abordagem que visa trazer o que acontece nacionalmente, mas sem esquecer o protagonismo do Ceará. No Fórum, percebemos que a cidade e os equipamentos dela se destacam como locais conhecidos por um desenvolvimento sério na discussão do campo museal”.
Encontro com Ministra
Luísa contextualiza também as ressonâncias da visita à Fortaleza da Ministra da Cultura, Margareth Menezes, como programação do Fórum. Foram duas agendas: a abertura do evento – uma ação do IBRAM (instituição vinculada ao Minc), realizada em parceria com a Secult, a UFC, entre outros parceiros; e uma envolvendo o Banco do Nordeste.
Nesta última, de acordo com Cela, foram tratados vários pontos. Entre eles, ações em parceria para o Brasil e, em especial, para projetos específicos desenvolvidos no Ceará, a exemplo do Cariri Criativo – com previsão de início em março do próximo ano. Também houve articulações em torno de créditos para a Cultura, setor cultural e setor criativo.
“Igualmente houve articulação do Prodetec – ação que o Banco do Nordeste realiza com diversas cadeias econômicas para que a gente possa desenvolver também na Cultura. Em breve, acredito que o Ministério fará um anúncio importante de um evento que o Minc realiza, e o Ceará terá a alegria de sediar no próximo ano”, estima a secretária.
A divulgação oficial será realizada “no momento oportuno, em 2025”, de acordo com Luísa, pelo próprio Ministério da Cultura e pelo Governo Estadual – algo também tratado com o Banco do Nordeste, parceiro importante nessa realização.
Ressonâncias na UFC
Pró-reitor de Cultura da Universidade Federal do Ceará, Sandro Gouveia é outro nome que confere um panorama acerca da visita da Ministra ao Ceará. Para ele, o diálogo da gestão de Margareth Menezes com a UFC tem sido feito de maneira muito próxima, e de forma contínua, tendo em vista a parceria da instituição com algumas ações do Minc.
“Nós estamos, por exemplo, fechando um segundo projeto com o Ministério da Cultura, e agora com o Instituto Brasileiro de Museus. Temos também diálogo com o IPHAN e com a Funarte. A UFC está bem próxima dessas políticas que o Ministério tem desenvolvido e tem estimulado essa parceria entre a universidade e ele”, diz Sandro.
Não à toa, quando questionado sobre os resultados concretos do Fórum para a UFC, o gestor é claro: em primeiro lugar, a integração – não apenas da instituição com a Secult, mas também com alguns entes da esfera particular, a exemplo do Museu da Fotografia, do Museu da Indústria e da Unifor. “Isso, por si só, já é um fruto do Fórum”, comemora.
Outro aspecto diz respeito ao Fórum estar junto da Universidade no desenvolvimento do Plano Nacional Museal, o que oportuniza a reflexão sobre práticas, políticas e processos de integração realizados na casa. “Vejo como muito benéfico termos sediado e organizado o evento, e estarmos deliberando junto ao Ibram as diretrizes do Plano Nacional de Museus”.
Vale lembrar que a UFC possui alguns museus cadastrados no Sistema Brasileiro de Museus. O principal deles é o Museu de Arte da Universidade Federal do Ceará (UFC), com um dos acervos mais preciosos das artes cearenses e existente desde a fundação da universidade.
Há também a Seara da Ciência e a casa de José de Alencar, responsável por abrigar o Museu Arthur Ramos, referência no campo das religiões afro-brasileiras. “Temos uma longa tradição no campo cultural e também no museológico”, ressalta Glícia Pontes, pró-reitora adjunta de Cultura da instituição.
“Durante o evento, a gente, dentro da UFC, mobilizou os equipamentos culturais da Universidade e esses espaços receberam várias programações, como oficinas e minicursos. Acolhemos a diversidade de programações do fórum, e isso foi algo animador para vermos a Universidade inserida no debate da museologia nacional”.
Em tempo, os museus da UFC cadastrados no Sistema Brasileiro de Museus são estes:
- Museu do Parto - Universidade Federal do Ceará
- Museu de Anatomia e Arte - Musanarte - Universidade Federal do Ceará – UFC
- Museu da Infância e do Brinquedo - Universidade Federal do Ceará
- Casa de José de Alencar e Museu Arthur Ramos - Universidade Federal do Ceará
- Seara da Ciência - Universidade Federal do Ceará
- Museu de Arte da Universidade Federal do Ceará – MAUC
- Memorial da Universidade Federal do Ceará
Estender os debates
Por fim, outro equipamento que sediou atividades do Fórum e agora mensura os reflexos da ação é o Museu da Imagem e do Som do Ceará. Durante o evento, a casa atuou como plataforma para debates sobre Inovação na Museologia, Acessibilidade e Democratização Cultural, Sustentabilidade e Gestão de Museus e Intercâmbio Regional e Nacional.
“A ativação do MIS no Fórum, portanto, não é apenas vitrine de suas potencialidades, mas também convite para o setor museal refletir sobre os próprios desafios e possibilidades em diálogo com a sociedade contemporânea”, explica o diretor, Silas de Paula, que também destaca o fato de o MIS sediar o II Fórum Brasileiro de Museus da Imagem e do Som, entre
21 e 23 de novembro.
Quanto às ressonâncias dos eventos, tanto no Ceará quanto no MIS, Silas lista cita fortalecimento da rede de museus, capacitação profissional e inovação tecnológica como reflexos no Estado. Por sua vez, levando-se em conta o próprio equipamento, o gestor cita aprimoramento de práticas, projetos colaborativos e engajamento comunitário como pontos importantes a serem desenvolvidos no futuro.
“Em síntese, os fóruns reafirmam o MIS-CE como um protagonista nacional no setor museológico e um catalisador de transformações positivas na cultura cearense, contribuindo para o fortalecimento da rede de museus e a valorização do patrimônio cultural em âmbito local e nacional”, conclui o diretor.