Coletânea reúne artigos de 18 autoras quilombolas brasileiras sobre vivências, estudos e relatos

Lançada pelo Selo Sueli Carneiro, com organização de Selma dos Santos Dealdina e coordenação de Djamila Ribeiro, obra conta com textos inéditos das urgentes vozes que a compõem

Escrito por Antônio Laudenir , laudenir.oliveira@svm.com.br
Legenda: No livro, mulheres falam de violência, educação e até mesmo do reconhecimento de territórios
Foto: Helene Santos

A chance de compreender a realidade dos quilombos no Brasil. Adentrar a luta por direitos básicos e a ancestralidade destes povos. Todo esse conhecimento é dividido pelo olhar das mulheres quilombolas no livro "Mulheres Quilombolas: territórios de existências negras femininas". Lançada no último sábado (24), a coletânea reúne artigos de 18 autoras.

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A publicação é iniciativa do Selo Sueli Carneiro, organizado por Selma dos Santos Dealdina e coordenado por Djamila Ribeiro e os mais diferentes eixos temáticos compõem a obra. Da violência doméstica à educação. Recorta também a reivindicação de ações afirmativas e o reconhecimento de seus territórios.

Em outro aspecto, o livro divulga os desafios das mulheres quilombolas no meio acadêmico. Do Amazonas ao Rio de Janeiro. De Tocantins às Minas Gerais. Vozes historicamente silenciadas entregam um documento urgente à sociedade brasileira. Mergulhar em alguns destes trabalhos ajuda a compor uma parte desse precioso universo.

Nascida em uma comunidade chamada Sítio Areia, um dos pequenos aglomerados do território quilombola de Conceição das Crioulas, localizado no II Distrito de Salgueiro, sertão central pernambucano, Maria Aparecida Mendes é uma das realizadoras convidadas. A ativista assina o artigo "Saindo do quarto escuro": violência doméstica e a luta comunitária de mulheres quilombolas em Conceição das Crioulas".

Legenda: Práticas, costumes e tradições ancestrais de mulheres quilombolas são detalhados na obra
Foto: Helene Santos

Relatos

Três pesquisadoras tocantinenses construíram coletivamente o texto "Da comunidade à universidade: trajetórias de luta e resistência de mulheres quilombolas universitárias no Tocantins". Em cena, a pertinente reflexão em torno da relação entre estes dois campos de conhecimento.

"A academia, por sua vez, é um espaço de encontro de saberes em que o acesso ao conhecimento científico agrega elementos à experiência dessas mulheres, qualificando suas aprendizagens, que elas podem devolver para suas comunidades", apontam as autoras.

Em "Quando uma mulher quilombola tomba, o quilombo se levanta com ela", texto desenvolvido pelas integrantes do coletivo de mulheres da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq), temos um registro denunciativo. Detalha o quanto as mulheres quilombolas têm assumido a tarefa de estabelecer um intenso diálogo contra a violência e preconceito que ainda persistem contra os quilombos.

"Atualmente, vemos a formação de um cenário preocupante de retrocesso dos direitos dos povos quilombolas, dentro de uma ideologia conservadora e fascista que tem encontrado ecos em nível mundial. Essa crise, que além de tudo é econômica, implica ainda maior exploração e violação da vida das mulheres quilombolas", nos alerta a publicação.

Legenda: Cada artigo explora a pluralidade de vivências das autoras, costurando reflexões em primeira pessoa
Foto: Helene Santos

Vivências múltiplas

"Mulheres quilombolas: Territórios de existências negras femininas" explora a pluralidade de vivências, costurando reflexões em primeira pessoa das escritoras. Outra pauta é o envolvimento destas mulheres na produção agrícola de suas comunidades, fruto de práticas agroecológicas seculares.

"É preciso expressar nossas narrativas múltiplas para que as pessoas saibam quem somos, o que pensamos, o que produzimos em nossos territórios, assim como nosso modo de lidar com a terra, com o meio ambiente, com as ervas medicinais, com as sementes, com a devida salvaguarda dos nossos saberes e dos nossos conhecimentos ancestrais", diz Selma dos Santos Dealdina no texto de apresentação da obra.

Mulher quilombola do Angelim III, Território do Sapê do Norte, no Espírito Santo, Selma é assistente social e historiadora. Ela descreve que os dois anos de produção do livro foram marcados por intensas pesquisas e leituras. "São várias as frentes e trincheiras de lutas que passam pela academia e por diversos outros espaços de produção do conhecimento".

"Mulheres Quilombolas: territórios de existências negras femininas" 
Várias autoras

Selo Sueli Carneiro 
2020, 168 páginas 
R$ 48,00

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