Roterdã quer Ceará como um dos fornecedores de hidrogênio verde para Europa
Convidado desta semana do Diálogo Econômico, o diretor da Porto de Roterdã, René Van Der Plas, fala sobre a parceria com o Porto do Pecém
Os protocolos de intenção entre o Governo do Estado e o setor privado para a produção de hidrogênio verde no Pecém têm voltado os olhares para o Ceará. Com expectativa para início de operação das usinas no fim do próximo ano, a produção local deve abastecer parte da demanda de 20 milhões de toneladas do combustível da Holanda e do interior da Europa.
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A expectativa é de René Van Der Plas, diretor do Porto de Roterdã, parceiro e acionista do Porto do Pecém, ligação pela qual o hidrogênio verde seria escoado e distribuído.
Um dos focos da parceria é exatamente a preparação de ambos os portos para a transformação energética em curso de forma a encontrar novas oportunidades de negócios no processo.
Com a promoção do Complexo Industrial do Porto do Pecém (Cipp),o executivo ainda espera que a produção industrial aumente, assim como o valor agregado, os empregos e todo o impacto socioeconômico na região.
Em visita ao Ceará para participar da Feira Internacional de Logística (Expolog), Van Der Plas ainda comentou o nível de satisfação da parceria com o porto cearense, que já possui quase três anos.
Confira a entrevista completa:
Como Roterdã vê o desenvolvimento do Hub de hidrogênio verde no Pecém?
Eu acho que é uma grande oportunidade para o Porto do Pecém e para o Estado do Ceará. O Nordeste brasileiro é bem localizado para essa produção, estando muito perto da Europa e relativamente perto dos Estados Unidos.
Há um grande interesse do mercado para vários tipos de acordos comerciais, então vejo muita oportunidade.
É uma cadeia que demanda altos investimentos aos interessados em conduzi-la.
Temos que ter certeza que somos uma organização profissional e vamos promover todo o suporte que podemos para fazer dar certo.
Qual a expectativa para o desenvolvimento dessa cadeia?
A gente tem uma perspectiva de demanda até 2050 em Roterdã de cerca de 20 milhões de toneladas de hidrogênio.
A gente espera conseguir hidrogênio verde não só do Pecém, mas de outras localidades no mundo para suprir essa demanda.
É importante destacar que não existe concorrência ainda (entre as localidades produtoras), porque a demanda é tamanha que se (o fornecedor) tiver boa qualidade e bom preço vai ter venda garantida.
Sempre falo nas nossas reuniões que vou ficar muito feliz de ver o hidrogênio verde saindo daqui como produto de exportação para onde quer que seja, mas vou ficar ainda mais feliz se eu vir valor local agregado sendo criado.
Ou seja, (gostaria) que ao redor dessa cadeia de suprimentos do hidrogênio verde seja criado um plaster industrial - cadeia para fornecer os insumos para o hidrogênio verde - que gere riquezas localmente.
A exportação pode ser mais um produto, mais uma vantagem de tudo isso.
Embora ainda não haja concorrência, como o Ceará está despontando nesse mercado?
Uma coisa importante é ter sol, vento para produzir energia elétrica barata e renovável.
O Ceará tem o espaço físico para alocação (desses projetos), tem o Porto (do Pecém) ao lado, isso tudo é importante.
Além disso, você tem as indústrias bem organizadas para isso, a universidade junto fornecendo assistência técnica, e mais importante você tem um governo comprometido com a realização desse projeto.
Tudo isso é uma grande oportunidade de sair na frente como um exportador mundial de hidrogênio verde.
Quais os gargalos que ainda precisam ser vencidos para que esse mercado deslanche?
Ainda tem muitos gargalos para serem resolvidos, como por exemplo, você tem questões de licenciamento ambiental, financiamento.
Os parceiros precisam investir uma quantidade enorme de dinheiro, lidar com uma série de riscos, se preocupar com fornecimento de energia.
Não é simplesmente uma receita de bolo que você junta os ingredientes, bate e está pronto.
É algo que se constrói a longo prazo e esses foram só alguns dos gargalos que precisam ser superados. Mas com organização é possível fazer.
Sobre a parceria entre Roterdã e Pecém, o que já mudou desde o acordo entre os dois portos?
Nós começamos a parceria em dezembro de 2018, três anos atrás. Eu acho que o que tem mudado é que nós estamos juntos desenvolvendo novas estratégias para os portos.
Eu acho que é muito importante que nós estejamos aceitando os novos desafios que estamos enfrentando hoje com organização, com transição energética, com inovação, e criando uma base para transformar esses desafios em oportunidades.
Quais os próximos passos dessa parceria?
Nós somos parceiros para a longo prazo. Nós fizemos investimentos nesse projeto e é claro que nós queremos ver o retorno, mas também o valor socioeconômico agregado para o Estado.
Nós criamos novos empregos no Porto e vamos garantir que haja desenvolvimento, especialmente nos preparando para esses novos desafios.
É uma agenda que vamos trabalhar junto com o Estado.
Nós sabemos quais os ganhos do Pecém com a parceria, mas quais as vantagens desse acordo para Roterdã?
Nós nos consideramos, além de um porto, um desenvolvedor de portos internacionais.
Nós temos uma parceria muito bem sucedida com o Porto de Omã há 20 anos e nós queremos dobrar esse sucesso no Pecém.
Para isso, queremos gerar valor socioeconômico ao redor dos portos em que atuamos.
Vocês pretendem ter esse tipo de parceria com outros portos do Brasil?
Não é que estamos no mercado procurando parcerias, mas quando identificamos oportunidades, quando acreditamos na parceria e quando os parceiros acreditam na gente, então concretizamos a parceria.
Aconteceu com Omã 20 anos atrás e no Pecém 3 anos atrás.
Não iremos dizer 'não' para novas oportunidades, mas não é algo para todo mundo.
Qual o nível de satisfação com a parceria com o Pecém?
Nós estamos muito satisfeitos com a parceria. Realizamos reuniões periódicas para acompanhar e avaliar o que está sendo feito.
Até agora, estamos muito satisfeitos e esperamos fazer ainda melhor na próxima década.
Essa parceria é boa para o porto e é boa para as pessoas.