Lojas compartilhadas reduzem custos de empreendedores e proliferam no pós-pandemia; conheça modelo

No varejo e no setor de serviços, empreendedores cearenses se unem para dividir custos e multiplicar clientes. Estar em uma loja colaborativa chega a proporcionar custos 30% menores em relação a um ponto físico tradicional

Escrito por Ingrid Coelho , ingrid.coelho@svm.com.br
Dona do Flozo, Luana Muriell (segunda da esquerda para a direita), compartilha sua casinha rosa com a designer de sobrancelhas Andressa Alves e as confeitaria Yanne e Yohana
Legenda: Dona do Flozo, Luana Muriell (segunda da esquerda para a direita) compartilha sua casinha rosa com a designer de sobrancelhas Andressa Alves e as confeiteiras Yanne e Yohana
Foto: Fabiane de Paula

Era novembro de 2020, em meio à pandemia do coronavírus, quando Ely Carvalho e Vitória Carvalho decidiram começar sua marca de homewear - roupas de ficar em casa, em tradução livre. As vendas começaram a ser realizadas pelo Instagram e pelo WhatsApp, já que o momento ainda era instável quando se tratava de retorno das atividades presenciais.

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Os meses foram passando, a empresa foi crescendo e, com a consolidação da reabertura da economia, as empreendedoras viram, no fim do ano passado, que era hora de estar em um ponto físico. “Comecei a perceber que as clientes de Fortaleza tinham dúvidas sobre tamanho e queriam conhecer o nosso produto de perto”, explica Ely.

Apesar do crescimento da empresa, os custos que envolvem a concretização de um ponto físico tradicional ainda eram um empecilho para a Nalla Homewear. “Nossa marca ainda estava começando e para montar uma estrutura era muito oneroso. Vi no Instagram uma loja colaborativa, me reuni com as donas do negócio e vi que a ideia delas se encaixava perfeitamente no nosso propósito”, afirma Ely.

Legenda: Sócias da Nalla Homewear estão presentes nos dois espaços colaborativos que a Elabore possui em Fortaleza
Foto: Kid Junior

Para elas, as vantagens são muitas. Afinal, a loja colaborativa permite que os lojistas rateiem custos. “E o cliente de uma outra marca passa pela nossa e acaba conhecendo a gente, então tem uma possibilidade muito maior de intercâmbio de clientes. É um local que impulsiona marcas locais, pequenos empreendedores”.

40%
É a melhora nas vendas percebida pela Nalla Homewear depois de irem para uma loja colaborativa. Atualmente, os consumidores compram pelo Instagram (40%), pelo site (30%) e o restante o faz na loja física.

A articuladora da Unidade de Competitividade dos Negócios do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas no Ceará (Sebrae/CE), Alice Mesquita, pontua que estar em uma loja colaborativa proporciona não apenas um intercâmbio de clientes, mas também um rico compartilhamento de vivências.

“O espaço colaborativo promove uma troca de experiência entre os expositores. O empreendedor conhece outras empresas e muitas vezes essa convivência possibilita parcerias. Esse compartilhamento de conhecimento é interessante para o crescimento de ambos”, diz Alice.

Pioneirismo no Ceará

A Ely e a Vitória expõem seus produtos na Elabore, loja colaborativa com dois espaços localizados na Aldeota e no Shopping RioMar, em Fortaleza. A Elabore foi pioneira no Ceará atuando no modelo colaborativo, após a ideia de Larissa Praxedes e de sua sócia, Raquel Praxedes, sair do papel há oito anos.

“Nós vimos esse modelo e em 2013 começamos a estudar com advogados, com contadores, para ver se era viável. Buscamos o Sebrae na época e em 2014 nós abrimos com 35 marcas”, explica Larissa. Hoje, a Elabore trabalha com 80 empreendedores.

Legenda: A Elabore foi pioneira no modelo de loja colaborativa no Ceará e atualmente conta com 80 expositores
Foto: Kid Junior

Para vender na loja colaborativa, é imprescindível estar registrado como pessoa jurídica. “É necessário ter todas as notas fiscais de produtos, estoque para deixar na loja e também é preciso que a marca faça o seu marketing”, detalha. No espaço, todos os custos são rateados e é cobrada uma taxa fixa mensal mais os custos variáveis, que são impostos, taxa de cartão e antecipação.

“É importante que a marca faça coquetéis de coleção, que promova eventos dentro de loja, aproveitando o espaço. Nós disponibilizamos estúdio de fotografia e espaço de convivência para reuniões”, detalha a sócia-proprietária da Elabore.

Para professor Christian Avesque, atrativos como esses dentro da loja colaborativa são bons pontos de observação para que o empreendedor escolha em qual espaço compartilhado ele deseja estar, já que se traduzem em comodidade para o trabalho e atração de consumidores, alavancando os negócios.

Uma loja colaborativa pode/deve ter:

  • Áreas "instagramáveis";
  • Espaço para customização de produtos;
  • Local para workshops e palestras;
  • Espaço para lançamentos de coleções, desfiles;
  • Ponto de entretenimento/convivência.

Fonte: Professor Christian Avesque

“As lojas colaborativas não devem ser vistas como apenas um ponto de venda, mas de relacionamento, de entretenimento. Deve ser um espaço onde os consumidores se sintam acolhidos. Elas podem contar, por exemplo, com áreas ‘instagramáveis’, customização de produtos, espaços para workshops e lançamentos”, detalha Avesque.

Outros pontos a serem observados é que, na avaliação dele, é importante que as lojas e empresas dentro do espaço compartilhado possuam uma proposta de valor, um posicionamento e um mercado semelhante.

Exemplo: eu não posso ter uma marca de uísque com uma de fraldas no mesmo ambiente. Elas não vão conversar. Também é interessante que as marcas da loja compartilhada tenham um orçamento conjunto para comunicação, captação e cadastramento de clientes
Christian Avesque
Professor da Faculdade CDL e da Unichristus

‘Phygital’

Se a pandemia forçou as marcas a estarem no ambiente online, a retomada das atividades presenciais instituiu no varejo a existência da palavra phygital (do inglês physical + digital). “Não existe mais isso de quem está no online fica só no online e quem é do físico fica só no físico. É um movimento que não tem mais volta”, contextualiza Avesque.

Com a explosão dos custos operacionais para estar em um espaço físico, como energia e aluguel, as lojas compartilhadas surgem como uma oportunidade ainda mais interessante. “É excelente, sobretudo para quem é micro e pequeno, porque ele não vai precisar de um orçamento muito grande para investir”, diz o professor, destacando ainda que esses pontos físicos podem funcionar como mini centros de distribuição.

“Estar em uma loja compartilhada reduz em média 30% o custo que o empreendedor teria se ele estivesse sozinho, tendo que arcar com água, energia, aluguel, fundo promocional, sem a possibilidade de fazer o rateio disso”, arremata Avesque.

Compartilhamento no setor de serviços

O varejo não é o único setor no qual o compartilhamento de espaços chegou para ficar. No setor de serviços, por exemplo, prestadores se complementam em um mesmo ambiente com o objetivo em comum de promover ao cliente a melhor experiência possível.

Andressa Alves é designer de sobrancelhas e micropigmentadora com espaço dentro do Flozô, salão de beleza da Luana Muriell. Junto delas está a confeitaria das irmãs Yanne e Yohana, que possibilitam às clientes de Luana e Andressa fazer um lanche enquanto aguardam para realizar algum procedimento estético.

“Uma das maiores vantagens é o fato de as três empresas terem o mesmo perfil de público e marca. Sendo assim, ofertamos serviços/produtos diferentes, mas complementares”, diz Yanne Mesquita. A empresa, que antes trabalhava apenas por encomenda, teve um incremento no fluxo de clientes.

Legenda: Andressa, Luana, Yohana e Yanne tem em comum a paixão pelo empreendedorismo e o endereço, onde prestam serviços que consideram complementares
Foto: Fabiane de Paula

O Flozô existe há quase cinco anos e é a primeira vez que Luana Muriell compartilha o espaço. “Juntas, nós conseguimos oferecer comodidades aos clientes que, sozinhas, não conseguiríamos. Eu confio muito no trabalho delas e a principal ‘condição’ é de que somos amigas e tudo pode e deve ser conversado”, detalha.

Para Andressa, o fluxo de clientes melhorou consideravelmente com o novo espaço. “A visibilidade é maior. Até agora não vi desvantagem”. No caso delas, apenas o aluguel é dividido e o todo o  custo restante é separado.

Dona do Flozo, Luana Muriell compartilha sua casinha rosa com a designer de sobrancelhas Andressa Alves e as confeiteiras Yanne e Yohana
Legenda: “O espaço colaborativo promove uma troca de experiência entre os expositores", destaca a articuladora da Unidade de Competitividade dos Negócios do Sebrae/CE, Alice Mesquita,
Foto: Fabiane de Paula

Tem dado tão certo que o espaço pode ficar pequeno futuramente, de acordo com Luana Muriell. Ela ainda avalia estudar novas possibilidades para dividir a casa com outras empreendedoras, oferecendo novos produtos e serviços. “Faremos uma feira com clientes empreendedoras, em breve. O empreendedorismo é, muitas vezes, solitário, então é muito bom ter marcas legais com mulheres que a gente pode contar”, arremata Luana.

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