Empreendedores cearenses driblam crise e investem no chocolate para a Páscoa
Época de presentear com os ovos de chocolate, a Páscoa é um bom período para autônomos que querem uma renda extra
Uma das épocas mais doces do ano se iniciou nesta semana. Além de todo o simbolismo religioso que a Páscoa carrega, a época pode ser uma oportunidade para quem empreende com a confeitaria, por exemplo.
O Diário do Nordeste conversou com quatro pequenos empreendedores que fazem dessa época do ano mais doce para entender como a produção de chocolates gera renda e mudou a vida desses cearenses.
‘Tem sido uma grande terapia pra mim’
Fernanda Soares sempre teve o empreendedorismo na veia, aprendeu o ofício da venda com o pai que tem uma oficina mecânica e com os tios que comandam uma gráfica. Ainda criança, apostou na produção de doces para ter a própria mesada.
“Sempre fui muito criativa, gostava de brincar de vender coisas. Comecei com a confeitaria vendendo trufas e bolos de pote na escola para ter uma renda própria, porque queria algo e meus pais não tinham condição de me dar”, relata.
Formada no Ensino Médio e com dificuldades para encontrar o primeiro emprego, os doces foram mais uma vez a saída para ela conseguir um sustento. Surgiu então a primeira doceria delivery na região do Maracanaú. “Deu muito certo, mas ainda achava que ter um emprego fixo era mais estável que empreender”.
Acreditando ter de seguir um caminho ‘em linha reta’ para conquistar seus objetivos, Fernanda mal sabia o que a vida ainda lhe proporcionaria. Após conseguir um emprego em um call center, a empreendedora suspendeu as atividades da doceria.
Fiquei lá por quase um ano e foi o pior ano da minha vida. Eu não gostava do que fazia, lá eu adoeci. Era uma sobrecarga muito grande, saí com depressão, síndrome do pânico e ansiedade. Comecei um tratamento e voltei para confeitaria, que tem sido uma grande terapia pra mim”.
O retorno aconteceu há cerca de três meses, ainda em tempo para aproveitar a Páscoa, com a Açucarado Amor. De acordo com Fernanda, este é um período com bastante potencial para quem trabalha com doces e, desde quando iniciou os trabalhos no ramo, tem tido bons resultados.
Fernanda conta que na primeira Páscoa, enquanto doceira comprou apenas 20 caixas de ovos de colher com medo de não vender. “O estoque não durou uma semana. Na deste ano, já fiz uma mensuração de quanto devo vender e estimo que vou precisar de 10 kg de chocolate”.
“Empreender não é fácil e o maior aprendizado que ainda estou tendo é de ser resiliente e perseverar, as pessoas desacreditam muito, não consideram como uma profissão porque eu trabalho em casa e não veem o potencial da gente”.
Como queijo e goiabada: o casamento perfeito
O gastrônomo Diego Áttyla ainda guarda na memória o mexer das panelas na casa de bolos que os pais tinham no interior do Ceará, em Acopiara. O amor pelo doce nasceu ali, entre farinha, ovos e chocolates. Formado em Gastronomia, Diego ainda tentou se enveredar por outros caminhos, mas a confeitaria sempre esteve em um lugar especial.
Hoje, casado com Leonardo Petrus, estudante de Marketing Digital, os dois comandam juntos a Dourado Cakes. A empresa só surgiu com a vontade deles de empreenderem e trabalharem para si.
“É muito satisfatório e é tudo feito com muito amor, acho que é por isso que o pessoal gosta tanto. É uma paixão de criança, sempre gostei de fazer bolo, doces”, relata Diego, de forma tímida.
“Eu trabalhava numa empresa, no setor comercial, e estávamos pensando numa alternativa de ter um negócio próprio, porque o Diego tinha acabado de sair de uma empresa”, conta Leonardo.
Foi só em 2019 que o casal tomou coragem para tomar a iniciativa do negócio. No início, permeado por dificuldades e na tentativa de entrar no mercado, Leonardo fez a maior propaganda da pequena empresa e levava o cardápio das delícias toda semana para que seus colegas de trabalho fizessem as encomendas.
Tivemos uma ideia de começar com delícias pequenas que servem uma pessoa. Começamos com R$ 100 que foi o dinheiro que sobrou no mês e, com essas pequenas delícias, nós fomos começando a investir na confeitaria”.
As coisas estavam indo bem e os dois decidiram investir mais no próprio negócio com a compra de um carrinho para vendas físicas. Porém, um ano depois veio a pandemia. “Foi um baque porque eu ainda tava recebendo meu seguro-desemprego, ficamos meio desesperados, pois a nossa principal fonte de renda era o carrinho, não estávamos ainda nos aplicativos de entrega”, diz Leonardo.
Se Diego manda na cozinha, é Leonardo quem cuida da comunicação da confeitaria. Sabendo da importância das redes sociais, o estudante apostou todas as fichas no Instagram e saltou de pouco mais de 500 seguidores para mais de 16 mil em dois anos.
“Fomos nos virando, vendendo bolos, era aquilo nos sustentando, mas temos crescido muito. A gente tem se aprimorado, na área digital também, eu quero estar mais com essa questão das redes sociais porque hoje a ferramenta do Instagram é gratuita e é uma vitrine para o nosso trabalho”, aponta.
A Páscoa e outras datas comemorativas viraram sinônimo de sucesso e uma grande aposta para o casal. “Já estamos há quase três anos trabalhando com esse período e, para nós, vale muito a pena”, afirma Leonardo.
‘Vendia trufas para agregar renda’
Ainda cursando Enfermagem, a confeiteira Jéssica Holanda começou a trabalhar com chocolates para ajudar a mãe com as despesas de casa. Em 2012, a jovem fazia trufas e vendia para os vizinhos e colegas de faculdade.
Após o irmão sofrer um acidente e precisar ficar internado, Jéssica perdeu o financiamento estudantil que tinha para conseguir pagar a faculdade. “Aprendi a fazer trufas pela internet, como tive que deixar de estudar, investi mais no ramo, hoje temos um cardápio de 14 produtos”. O nome do negócio ainda remete à época em que ela começou: Jéssica Trufas.
Além das trufas, Jéssica produz cones recheados, bolos e outras sobremesas. Desde 2018, aposta na Páscoa para alavancar as vendas. “Na confeitaria, é a melhor época, é quando você pode ganhar um dinheiro a mais. Além disso, as pessoas querem economizar e os caseiros acabam sendo uma opção.
Hoje, o sustento dela e da filha de 5 anos, que tem epilepsia, é todo proveniente da produção de doces, já que ela não pode trabalhar fora de casa porque a menina precisa de cuidados específicos.
Não foi fácil, não ganhei nada de 'mão beijada'. Houve uma época que passei muito sufoco, minha filha é portadora de epilepsia, tive que parar um período porque ela vivia internada, tive muita dificuldade porque ela precisa de muita atenção, mas graças a Deus está dando certo”.
Apesar de ter aprendido muito com a internet, Jéssica orienta que aqueles que queiram começar no ramo invistam em cursos e estudar bastante com outras confeiteiras. “Dá pra ganhar dinheiro, nem que seja um pouquinho”.
Paixão e renda extra
Psicóloga por formação acadêmica, é na cozinha que Roberta Costa se encontra. Desde criança tem uma paixão pela confeitaria e, aos 9 anos, fez o primeiro bolo. “Cresci assistindo programas culinários, como a Cozinha da Ofélia, e anotava as receitas. Ainda hoje tenho esse caderno que contém receitas. Praticamente um ‘patrimônio’”, relata.
Da paixão, uma possibilidade de renda extra. Há 23 anos, Roberta começou a fazer bolos para eventos, inicialmente para os familiares, depois os amigos e, só então, a partir de 2004 decidiu fazer como um negócio e abriu a Farelo Confeitaria.
Eu presenteava as pessoas que queriam encomendar, ainda não me sentia segura para vender. Fiz até bolo de casamento para uma grande amiga. Mas aí, a partir de 2004 eu comecei a vender os bolos, doces, chocolates que eu já fazia. Fiz alguns cursos para me sentir mais segura”.
A primeira Páscoa comercializando chocolates, de acordo com ela, a marcou. “Foi uma encomenda para uma empresa grande, foi um sucesso. De lá pra cá, sempre faço. É a melhor época do ano para confeitarias, sempre tive um ótimo retorno nesse período”.
Ainda conciliando as duas profissões, Roberta diz ser possível, já que atua como profissional liberal, mas relata não ser fácil.
“Digo sempre que a confeitaria é minha terapia! É na cozinha que eu posso extravasar minha criatividade, desestressar e exercer com amor umas das minhas grandes paixões. Simplesmente amo fazer meus bolos, doces e chocolates. Primo também muito pela qualidade dos insumos”.
Com experiência no ramo, a psicóloga pontua que uma das grandes dificuldades é a temperatura, já que ela trabalha com chocolate mesmo, também conhecido como chocolate nobre. Esse insumo necessita de uma estrutura com ambiente climatizado, pois é muito sensível ao calor.
"Além disso, é preciso dominar as técnicas de derretimento, temperagem, por exemplo, para se obter um produto final gostoso e bonito", afirma.
Por isso, ela afirma que, para quem está começando, é preciso perseverar, já que por trás de um belo doce tem muitas horas de estudo, tempo na preparação, mudança de planos. “Não desista, se isso é algo que lhe aquece o coração, estude muito. Viva buscando conhecimento, porque assim como outras áreas, a confeitaria está sempre se reinventando”.
Onde aprender
Senac
Bases de Confeitaria
- Investimento: a partir de R$ 918
O curso é voltado para desenvolver conhecimentos e habilidades básicas na confeitaria, como organização e manuseio dos equipamentos, preparo básico de doces, produção de chocolate, etc. Destinado para quem tem interesse em iniciar no ramo.
Confeiteiro
- Investimento: a partir de R$ 3.555,96
O curso é voltado para formar profissionais com competências para a área, além de promover conhecimentos e habilidades em confeitaria, como bases de decoração, montagem de bolos, técnicas de mise en place, entre outros.
Senai
Confeiteiro
- Investimento: R$ 2.350,00
- Período: de 30/05 a 24/08
O curso vai ensinar a planejar e fabricar a produção de diversos tipos de bolos, tortas, sobremesas, salgados, bolachas, biscoitos, recheios, coberturas e similares em conformidade com as normas e procedimentos técnicos e de qualidade, segurança, do trabalho e dos alimentos higiene, saúde e preservação ambiental.